Carta IEDI
Emprego e rendimento no setor privado
No 3º trim/23, a economia brasileira perdeu dinamismo, ficando virtualmente estagnada na passagem do 2º trim/23 para o 3º trim/23 (+0,1%, com ajuste sazonal). Apesar disso, pisou no freio menos fortemente do que muitos analistas esperavam e isso, em boa medida, devido à resiliência do consumo das famílias, como vimos na Análise IEDI de 05/12/23 .
Ao lado da desaceleração da inflação e dos programas governamentais de transferência de renda, a melhora progressiva do quadro do emprego do país foi importante para evitar desaceleração do consumo. Ainda assim, a geração de novas vagas não passou ilesa e o que temos testemunhado é mais um avanço qualitativo, com ocupações formais crescendo mais que o total do emprego.
A Carta IEDI de hoje, a partir dos microdados da Pnad/IBGE, analisa a evolução do emprego privado no 3º trim/23, dando destaque ao emprego industrial, seus diferentes ramos e grupos por intensidade tecnológica.
A perda de fôlego da economia no 3º trim/23 veio acompanhada da desaceleração na criação de vagas no mercado de trabalho, mas alguns setores econômicos mantiveram a expansão de postos de trabalho, como serviços, indústria extrativa e as atividades de eletricidade e gás. Vale notar que, nos dados do PIB, estas são atividades com resultados mais favoráveis.
Para o total do setor privado, o número de ocupados aumentou +0,6% no 3º trim/23, na comparação interanual, equivalente a +508 mil pessoas trabalhando. Embora esse resultado seja um pouco superior aos +0,3% observados no 2º trim/23, é bem inferior aos 2,4% do 1º trim/23.
A indústria de transformação, por sua vez, obteve no 3º trim/23 seu primeiro resultado negativo desde a entrada de 2021, mas apresentou a menor redução da ocupação: -1,5% frente ao mesmo período do ano anterior. Além da indústria, a ocupação também caiu na agropecuária (-3,8%), na construção civil (-2,3%) e no comércio (-1,5%).
Em direção oposta, o destaque coube ao setor de serviços, que registrou um aumento da ocupação suficiente para compensar as perdas dos demais setores, pelo fato de reunir as atividades mais intensivas em mão de obra da economia: +3,4% ante o 3º trim/22, o equivalente a +1,3 milhão de ocupados.
Como o IEDI vem enfatizando em suas análises mensais, o que caracteriza o mercado de trabalho em 2023 não é tanto a intensidade do aumento da ocupação, mas sim seu progresso qualitativo, com o desempenho superior do emprego formal.
O emprego com carteira assinada no setor privado teve aumento relevante no 3º trim/23, de +3,0%, isto é, um ritmo cinco vezes maior do que o da ocupação total no período. E este ritmo poderia ter sido superior se a indústria estivesse crescendo e empregando, dado que é um dos setores que mais privilegia relações formais de trabalho (66,7% de sua força de trabalho ante 42,6% na média do setor privado).
Na indústria de transformação, houve recuo do emprego com carteira de -0,5% na comparação interanual, assim como na agropecuária (-1,7%) e na construção civil (-2,1%). No caso industrial, importante ressaltar a maior resiliência deste tipo de ocupação, já que seu ritmo de queda é de 1/3 do ritmo da ocupação total do setor. Dentre aqueles com expansão, destacam-se serviços (+5,2%) e comércio (+2,9%).
O número de pessoas ocupadas aumentou em cerca de metade dos ramos industriais: 11 ficaram no positivo em relação ao 3º trim/22, praticamente a mesma proporção dos trimestres anteriores, e em outros 12 ramos houve recuo da ocupação. Os destaques positivos ficaram a cargo de: coque; produtos derivados de petróleo e biocombustíveis (+16,4%) e fabricação de bebidas (+15,9%).
Na agregação dos ramos industriais por intensidade tecnológica, apenas nos segmentos de média tecnologia houve crescimento da ocupação: +5,3% também na comparação com o 3º trim/22. Os grupos de alta tecnologia (-9,2%) e de média-alta (-4,9%) registraram declínio no número de ocupados, enquanto a média-baixa tecnologia apresentou estabilidade.
Devido ao aumento da formalização do emprego e da desaceleração da inflação, o rendimento médio real da população ocupada no setor privado vem se ampliando desde meados de 2022 e assim continuou no 3º trim/23, a despeito de certa acomodação: +4,8% ante +6,5% no 2º trim/23 e +7,5% no 1º trim/23, sempre em relação ao mesmo período do ano anterior.
Na indústria de transformação, por sua vez, o rendimento real não apenas cresceu mais do que o do agregado do setor privado, como apresentou aceleração no 3º trim/23: +5,9% ante +3,2% no 2º trim/23. Entre os ramos industriais, altas mais intensas vieram de: derivados de petróleo e biocombustíveis; madeira; veículos; outros equipamentos de transporte; máquinas e equipamentos.
Como o aumento do rendimento prevaleceu sobre a evolução da ocupação, a massa de rendimentos reais dos ocupados no setor privado aumentou +5,6% no 3º trim/23 ante o 3º trim/22, o que não é pouco, embora signifique quase metade do ritmo de crescimento do 1º trim/23 (+10,8%). Para a indústria de transformação, o desempenho do rendimento foi ainda mais importante para manter em alta sua massa de rendimentos reais: +4,4% no 3º trim/23.
Desempenho setorial da ocupação
Esta Carta IEDI acompanha o desempenho do emprego e do rendimento dos ocupados do setor privado com foco na indústria de transformação, em comparação com os demais setores da economia, tendo como base os microdados da PNAD Contínua. Nesta edição foram analisados os dados do 3º trim/23, divulgados recentemente pelo IBGE.
A economia brasileira desacelerou o ritmo de crescimento na passagem do primeiro para o segundo semestre. Após altas nos dois primeiros trimestres do ano de, respectivamente, 1,4% e 1,0%, excluída a sazonalidade, em relação ao período imediatamente anterior, o PIB permaneceu praticamente estagnado no 3º trim/23: +0,1%.
Em que pese esse cenário menos positivo da economia brasileira no 3º trim/23, o mercado de trabalho continuou melhorando no período de julho a setembro, apoiado no dinamismo ainda superior do setor de serviços.
O número de ocupados no setor privado cresceu 0,6% no 3º trim/23, na comparação com o mesmo período de 2022, equivalente a um aumento de 508 mil trabalhadores. Esse resultado foi um pouco superior ao 0,3% observado no 2º trim/23, mas inferior ao registrado no 1º trim/23 (+2,4%).
O setor de serviços foi o único que apresentou aumento de ocupação no 3º trim/23 na comparação interanual. Nos meses de julho a setembro foram adicionados no mercado de trabalho 1,3 milhão de ocupações nos serviços, o que significou variação de +1,5% frente ao 3º trim/22.
Já a ocupação da indústria de transformação registrou crescimento interanual de 2,1%, no 1º trim/23, com desaceleração para 0,5% no 2º trim/23. A não expansão da atividade nesta parcela da indústria nos meses de julho a setembro e a percepção dos empresários de que os estoques efetivos estavam acima do planejado, impactou oferta de vagas do setor.
No 3º trim/23, o emprego da indústria de transformação caiu -1,5% com subtração de 176 mil postos de trabalho, em relação ao mesmo período do ano anterior. Foi o primeiro resultado negativo desse segmento na comparação interanual desde o 1º trim/21, quando caiu -5,3%.
Cabe destacar, ainda, os resultados negativos da ocupação na construção civil e o no comércio com quedas interanuais no 3º trim/23 de, respectivamente, -2,3% e -1,5%. Isto significou, em termos absolutos, reduções de 170 mil e de 289 mil postos de trabalho. Na agropecuária estas variações foram de, respectivamente, -3,8% e -333 mil ocupações no campo.
Evolução do emprego com carteira assinada
O emprego com carteira de trabalho assinada registrou desempenho melhor entre o segundo e terceiros trimestres, de +2,8% para +3,0%, em relação ao mesmo período de 2022. Nos meses de julho a setembro ocorreu incremento de 1,1 milhão de “celetistas” no mercado de trabalho.
Este crescimento do emprego com carteira assinada, da mesma forma que o total da ocupação, também apresentou desaceleração frente ao crescimento interanual observado no 1º trim/23 (+5,2%).
Setorialmente, os serviços e o comércio tiveram resultados positivos no 3º trim/23 com expansão interanual de +5,2% e +2,9%, respectivamente. Nos demais segmentos, a ocupação com carteira assinada recuou nesta base de comparação.
A menor queda foi na indústria de transformação com -0,5% e redução de 37 mil postos de trabalho. Já, na construção civil e na agropecuária, as reduções foram de, respectivamente, -2,1% e -1,7% com perdas absolutas da ordem de 37 mil e 28 mil ocupações.
Vale notar que esse desempenho da ocupação com carteira assinada fez com que a sua participação no total dos ocupados se elevasse. No caso específico da indústria, a elevação da proporção derivou de uma redução mais intensa do total dos ocupados do que da queda do emprego “celetista”.
O emprego com carteira assinada representou 66,7% do total de postos de trabalho na indústria de transformação no 3º trim/23, permanecendo com o maior percentual dentre os principais setores analisados.
A proporção no comércio teve aumento relevante, passando de 46,9%, no 3º trim/22, para 49,0%, no 3º trim/23. No total da ocupação no setor privado, 42,6% dos trabalhadores tinham carteira assinada no 3º trim/23, pequena elevação em relação aos 41,6% observados no ano anterior.
Evolução do emprego industrial por setores e por intensidade tecnológica
Dos 23 setores da indústria analisados, em onze deles houve aumento da ocupação no 3º trim/23, e redução em outros doze, praticamente o mesmo desempenho do trimestre anterior, quando foram doze setores com elevação e diminuição em onze.
As maiores altas foram em: Fabricação de coque; produtos derivados de petróleo e de biocombustíveis (+16,4%) e Fabricação de bebidas (+15,9%). Já, as maiores reduções foram na Manutenção, reparação e instalação de máquinas e equipamentos (-12,8%) e na Preparação de couros e fabricação de artefatos de couro, artigos de viagem e calçados (-12,1%).
Agrupando-se os setores industriais por intensidade tecnológica, apenas os segmentos de média tecnologia tiveram aumento da ocupação com carteira assinada: +5,3%, equivalente +75 mil empregos na comparação interanual.
Houve recuo nos segmentos de alta tecnologia (-9,2% ou -35 mil empregos) e média-alta (-4,9% ou -75 mil), enquanto praticamente não houve variação na média-baixa intensidade tecnológica (0%, ou menos -2 mil).
Enquanto a ocupação com carteira assinada nos segmentos de alta tecnologia da indústria tem se mantido em patamar cerca de 10% abaixo do observado no pré-pandemia, nos demais ramos a ocupação continua em nível superior na seguinte proporção no 3º trim/23: (i) nas indústrias de média tecnologia o nível de emprego se situou 20% acima do registrado no 1º trim/20; (ii) no caso da média-alta e média-baixa tecnologia esses patamares foram de, respectivamente, 8,0% e 5,0%, acima do emprego observado no 1º trim/23.
Desempenho do rendimento médio real e da massa de rendimento
Para o total dos ocupados no setor privado, o rendimento médio cresceu 4,8% no 3º trim/23 ante uma alta de 6,5% no trimestre anterior, sempre na comparação interanual. Na indústria, a despeito do recuo da ocupação, o rendimento médio habitual dos ocupados aumentou mais: +5,9% no 3º trim/23 frente a +3,2% no 2º trim/23 nesta mesma base de comparação.
Já o rendimento médio dos trabalhadores com carteira assinada também cresceu, mas em intensidade menor em relação ao total dos ocupados, tanto na indústria (+5,3%) como no conjunto do setor privado (+2,4%).
Vale destacar que em 16 ramos industriais houve aumento do rendimento real habitual entre ocupados com carteira assinada, principalmente na Fabricação de outros equipamentos de transporte, exceto veículos automotores (+40,6%) e na Fabricação de coque; produtos derivados de petróleo e de biocombustíveis (+25,9%). Em outros 7 segmentos da indústria houve recuo do rendimento: Fabricação de máquinas, aparelhos e materiais elétricos (-7,4%) e Metalurgia (-6,8%).
A massa de rendimento habitual no total do setor privado cresceu 5,6% na comparação interanual. Contudo, esse aumento foi menor que o observado no 2º trim/23 (+7,2%), sendo o quarto trimestre seguido de desaceleração do crescimento.
Já na indústria de transformação, o crescimento da massa, de 4,4% no 3º trim/23, embora inferior ao agregado do setor privado, registrou aceleração em relação aos 3,9% do trimestre anterior. Isso indica que a redução da ocupação foi menos intensa que o aumento do rendimento, elevando a massa de rendimentos deste setor.