Carta IEDI
Emprego industrial em alta moderada
Apesar de o PIB brasileiro ter surpreendido positivamente neste iniciou 2023, graças ao desempenho da agropecuária, o mercado interno deu indicativos de enfraquecimento, como discutido na Carta IEDI n. 1206 “Contrastes no desempenho econômico do 1º trim/23”. O consumo das famílias e o investimento, bem como parte importante da oferta, como a indústria de transformação e a construção civil, ou registraram redução ou ficaram estagnadas.
Neste contexto, o mercado de trabalho não saiu totalmente ileso. A taxa de desemprego recuou e a ampliação do número de ocupados seguiu no positivo, mas a um ritmo menor. Como as Análises IEDI vêm destacando, a evolução do emprego em 2023 deve ser menos quantitativa e mais qualitativa, em função de um processo gradual de formalização.
Esta Carta IEDI analisa em detalhes o desempenho do emprego e da renda do setor privado no 1º trim/23, com ênfase na indústria de transformação. O estudo tem como base os microdados da PNAD Contínua, divulgada periodicamente pelo IBGE.
Em comparação com o início do ano passado, o número total de ocupados no setor privado, cresceu +2,4% no 1º trim/23, impulsionado principalmente pelos serviços (+4,5%) e pelo comércio (+3,1%). Embora positivo, este resultado foi inferior ao registrado no 4º trim/22: +3,4%, também na comparação interanual.
Na indústria de transformação, o aumento da ocupação ficou bem próximo à média do setor privado, mas inda assim um pouco inferior: +2,1%, o que equivale a um adicional de 234 mil pessoas empregadas no setor entre o 1º trim/22 e o 1º trim/23. Este ritmo de crescimento implicou uma desaceleração em comparação com desempenho do final de 2022 (+3,2%).
Já o emprego com carteira assinada se saiu melhor, com crescimento de +5,2% no total do setor privado no 1º trim/23 frente ao mesmo período do ano anterior, ou seja, mais do que o dobro do ritmo de expansão da ocupação privada total. Esta diferença de velocidade contribui para a formalização no mercado de trabalho.
Na indústria de transformação, ocorreu o mesmo: a ocupação com carteira assinada ao registrar +4,6% no 1º trim/23 avançou à frente da sua ocupação total. O setor respondeu por 18% do aumento das vagas com carteira assinada do total do setor privado em relação ao 1º trim/22.
Ainda que o emprego com carteira tenha avançado menos na indústria de transformação do que no agregado do setor privado, o setor seguiu sendo mais formalizado. Sua proporção do emprego com carteira assinada no total da ocupação atingiu 66,8% no 1º trim/23 (+1,6 p.p. ante o 1º trim/22) ante 42,6% na média do setor privado (+1,1% p.p. ante o 1º trim/22).
Quanto aos ramos industriais, 16 ramos da indústria de transformação ficaram no azul no 1º trim/23, isto é, 67% do total, ante 17 setores no último trimestre de 2022 (71% do total), mantendo certo espalhamento do crescimento da ocupação com carteira assinada. As maiores altas ficaram a cargo de outros equipamentos de transporte (+28,4%), máquinas, aparelhos e materiais elétricos (+22,3%) e metalurgia (+20,6%).
Por intensidade tecnológica, verificou-se crescimento do emprego com carteira nos grupos de média-alta tecnologia, média e média-baixa tecnologia. No grupo de alta tecnologia, a ocupação ficou praticamente estável, na comparação interanual.
Com um crescimento mais intenso do emprego formal, que tende a ter remunerações mais elevadas, e com a desaceleração da inflação, o rendimento médio real dos ocupados tem apresentado uma evolução positiva. Ainda assim, o 1º trim/23 trouxe alguma perda de ritmo.
O rendimento médio no total do setor privado passou de uma alta de +9,5% no 4º trim/22 frente ao mesmo período do ano anterior para +7,5% no 1º trim/23 na mesma comparação. Na indústria de transformação houve o mesmo comportamento, com crescimento de +5,5% no final de 2022 e de +3,2% no início de 2023.
A massa de rendimento real habitual evoluiu na mesma direção tanto no total do setor privado (+10,8% no 1º trim/23) como na indústria de transformação (+5,4%), em decorrência das menores taxas de crescimento da ocupação e do rendimento médio real.
Desempenho da ocupação na indústria de transformação
Esta Carta IEDI acompanha o desempenho do emprego e da renda do setor privado com ênfase na indústria de transformação, tendo como base os microdados da PNAD Contínua. Nesta edição, foram analisados os dados do 1º trim/23, divulgados recentemente pelo IBGE.
O mercado de trabalho quanto à expansão da ocupação tem intensificado os sinais de desaceleração neste início de 2023. O número do emprego no setor privado, que havia crescido 3,4% no último trimestre de 2022, na comparação interanual, passou a crescer 2,4% no 1º trim/23, equivalente a um acréscimo de 2 milhões de pessoas no mercado de trabalho privado.
Em termos absolutos, nos últimos três meses de 2022, o número adicional de pessoas que encontraram uma posição no mercado de trabalho havia sido de 2,9 milhões de pessoas, ainda na base de comparação interanual. Ou seja, 840 mil pessoas a mais do que agora no 1º trim/23.
Esta trajetória de desaceleração do emprego ocorreu num momento em que, embora os indicadores econômicos agregados tenham surpreendido positivamente, o mercado doméstico perdeu força.
O crescimento do PIB no 1º trim/23, de 1,9% na margem, livre da sazonalidade, e de 4,0% na comparação interanual, não repercutiu totalmente no mercado de trabalho devido a sua composição setorial, tanto do lado da oferta, como no da demanda.
Do lado da demanda, nota-se retrações entre o 4º trim/22 e o 1º trim/23, excluída a sazonalidade, na construção civil (-0,8%), na indústria de transformação (-0,6%) e em outras atividades de serviços (-0,5%) e baixo crescimento do comércio (+0,3%) e nos serviços ligados à atividade imobiliária (+0,3%). Em relação à demanda, o consumo das famílias ficou praticamente estagnado (+0,2%) e o investimento (formação bruta de capital fixo - FBKF) caiu 3,4%.
Frente ao mesmo período do ano anterior, apenas a agropecuária melhorou seu resultado, os demais setores agregados cresceram menos do que no último trimestre de 2022. A indústria de transformação foi a única atividade a registrar retração no 1º trim/23 nesta comparação: -0,9%. O consumo das famílias também cresceu menos (+3,5%) e o investimento ficou muito próximo de zero (+0,8%).
Neste ambiente econômico, influenciado por uma política monetária restritiva, a prejudicar as decisões de investir e, em parte, também as de consumir, a ocupação teve os seguintes resultados no 1º trim/23:
• na comparação com o 1º trim/22, todos os setores registraram desaceleração vis-à-vis as variações observadas no 4º trim/22, sendo que somente os setores de serviços (+4,5%) e o comércio (+3,1%) apresentaram crescimento acima da média do setor privado. Na indústria de transformação a ocupação cresceu 2,1% e na construção civil (-0,8%) e na agropecuária (-5,25) houve queda.
• em números absolutos, o setor de serviços acrescentou 1,6 milhões de trabalhadores no mercado de trabalho também na comparação com 1º trim/22, (465 mil a menos do havia sido adicionado no 4º trim/22); na indústria este incremento foi de 234 mil (ou seja, uma redução de 122 mil postos de trabalho adicionados ante o resultado do 4º trim/22) e no comércio, de 559 mil (186 mil postos a menos de incremento).
Se compararmos o agregado do total emprego privado (excluída a indústria) com a indústria de transformação, percebemos que as curvas das variações trimestrais do emprego na comparação interanual convergiram no começo de 2013.
No 1º trim/22, as variações destes dois conjuntos apresentaram a maior diferença dos últimos cinco trimestres: + 11,4% no total do emprego privado contra +8,3% da indústria de transformação. No 1º trim/23, as variações se aproximaram, +2,1% na indústria de transformação e +2,4% no total do emprego privado exceto indústria.
Evolução do emprego com carteira assinada
Quanto ao emprego com carteira assinada, nota-se que a evolução também foi de desaceleração no início de 2023, embora o desempenho tenha seguido superior ao do total da ocupação, sinalizando um gradual processo de formalização do emprego no país.
No 1º trim/23 houve crescimento de 5,2% no total do emprego com carteira assinada no setor privado, equivalente a um adicional de 1,8 milhão de pessoas, ante aumento de 6,9% no último trimestre de 2022, sempre na comparação interanual.
A expansão do emprego formal na indústria de transformação foi de 4,6% no 1º trim/23, o dobro do resultado da variação obtida no total do emprego do setor e acima do segmento de serviços, que cresceu 4,0%, na comparação interanual. Estes dois setores adicionaram no mercado de trabalho 334 mil e 601 mil trabalhadores, respectivamente.
Ainda se destacaram positivamente neste período, do 1º trim/22 ao 1º trim/23, os setores da construção civil (+10,0%) e do comércio (6,6%), com incremento de 162 mil e 571 mil empregados formais.
Estes resultados mantiveram o agregado do setor privado exceto a indústria de transformação com variação do emprego formal acima deste setor no 1º trim/23: 5,4% contra 4,6%. Entretanto, a diferença em pontos percentuais, que havia sido de 1,7 p.p. no 1º trim/22 se reduziu para 0,8 p.p. no início de 2023, indicando convergência das trajetórias.
Em termos da proporção entre os empregos formais no total da ocupação, a indústria de transformação continua sendo o setor que apresenta o maior índice, de 66,8% no 1º trim/23, 1,6 p.p. acima do patamar do mesmo período de 2022. A média do setor privado ficou em 42,6%, com uma progressão menor do que a da indústria em relação ao 1º trim/22, de +1,1 p.p..
Os setores da construção e do comércio também apresentaram elevações em pontos percentuais no período de, respectivamente, 2,4 p.p. e 1,6 p.p., mas com proporções bastante inferiores à da indústria de transformação. No setor de serviços, a relação entre os empregos formais e o total das ocupações recuou 0,2 p.p. e atingiu 39,7% no 1ºtrim. /23.
Por dentro do emprego industrial
Do ponto de vista da distribuição setorial da ocupação no 1º trim/23, dos 24 ramos acompanhados pela PNADc na indústria de transformação, 16 setores apresentaram crescimento na comparação interanual (67% do total), em seis deles o emprego se retraiu e um setor permaneceu com a ocupação estagnada.
A ocupação cresceu principalmente na Fabricação de outros equipamentos de transporte, exceto veículos automotores (28,4%), Fabricação de máquinas, aparelhos e materiais elétricos (22,3%) e na Metalurgia (20,6%).
Já as maiores reduções foram na Fabricação de coque, produtos derivados de petróleo e de biocombustíveis (-23,6%), Fabricação de equipamentos de informática, produtos eletrônicos e ópticos (-12,7%) e Fabricação de móveis (-12,2%).
Considerando os setores industriais agrupados por intensidade tecnológica, após uma alta interanual expressiva no final de 2022, de 28,1% na comparação interanual, a ocupação das empresas de alta tecnologia caiu 0,2% no 1º trim/23 com perda de 1 mil postos de trabalho.
Nos demais agrupamentos por intensidade tecnológica houve crescimento, neste período, de 10,6% na média tecnologia (+142 mil empregos), de 7,2% na média-alta (+101 mil ocupações) e de 2,2% na média-baixa intensidade tecnológica (+92 mil postos de trabalho).
Em suma, este resultado da ocupação na alta tecnologia significou um retrocesso da recuperação que vinha se desenhando ao longo de 2022. A ocupação com carteira no 1º trim/23 neste segmento ficou 10% abaixo do observado no 1º trim/20.
Por outro lado, destaca-se que a ocupação com carteira no segmento de média-tecnologia continuou avançando nos primeiros três meses de 2023, se situando em nível quase 19% acima do período pré-pandemia.
Neste período, as demais categorias por intensidade tecnológica também mantiveram o patamar de emprego acima daquele do 1º trim/20, com melhora na média-alta, cujo índice alcançou 111,8 (1º trim/20 = 100), seguida da média-baixa com 105,0.
Desempenho do rendimento médio real e da massa de rendimento
O quadro econômico de desaceleração da inflação, que caiu de 5,8% em dez/22 para 4,2% em mar/23, no acumulado em 12 meses de acordo com o IPCA, impactou positivamente o rendimento recebido pelos trabalhadores.
Além disso, a atividade econômica sem apresentar deterioração mais aprofundada no 1º trim/23, proporcionou melhores negociações salariais. Segundo o Dieese, 74% dos acordos registraram aumentos reais nos salários nos primeiros três meses do ano.
Neste contexto, o rendimento médio real habitual dos ocupados no setor privado cresceu 7,5% no 1º trim/23, isto é, em um ritmo menor do que o verificado no último trimestre de 2022 (+9,5%), na comparação interanual.
Na indústria de transformação, onde o desempenho da produção tem deixado a desejar, como analisado na Carta IEDI n. 1203 “Indústria: mais um trimestre sem crescer”, o aumento do rendimento real de seus ocupados (+3,2%) no início de 2023 não só foi menor do que na média do setor privado, como também ficou aquém daquele do último trimestre de 2022 (+5,5%).
Dentre os empregados com carteira assinada na indústria de transformação, nota-se alta do rendimento médio em 15 setores (62,5% do total), ante os 14 (58,3% do total) observados no último trimestre de 2022 e redução em oito ramos.
Destacam-se os aumentos de rendimento real da Fabricação de produtos diversos (26,7%) e da Fabricação de produtos de borracha e de material plástico (18,6%), enquanto as principais reduções foram na Fabricação de celulose, papel e produtos de papel (-29,9%) e na Metalurgia (-14,6%).
A combinação da desaceleração da criação de empregos e da menor expansão real dos rendimentos médios habituais, impactou a evolução da massa de rendimento real do setor privado, cujo crescimento perdeu intensidade no 1º trim/23 vis-à-vis o resultado do 4º trim/22, passou de +13,8% para +10,8% na comparação interanual. A massa de rendimento real na indústria de transformação, por sua vez, foi de +8,9% para +5,4% entre o 4º trim/22 e o 1º trim/23.