Carta IEDI
Indústria: a exceção do 1º trim/22
Houve progresso do nível de atividade econômica na passagem de fevereiro para março de 2022, quando todos os três grandes setores conseguiram registrar desempenhos positivos. A liderança coube aos serviços, com +1,7%, já descontados os efeitos sazonais, seguidos pelo varejo (+0,7% em seu conceito ampliado) e então pela indústria, com +0,3%, ficando mais próxima de um quadro de estabilidade do que de crescimento.
Outra semelhança neste final de trimestre: o sinal positivo prevaleceu entre os diferentes ramos destes três setores, mas novamente a indústria ficou em último lugar. Neste quesito, os serviços também saíram na frente, com 100% de seus segmentos registrando ampliação de faturamento, à frente do varejo, com 70% de seus ramos no azul e, então, da indústria, em que 54% dos ramos acompanhados pelo IBGE conseguiram avançar frente a fev/22.
Ou seja, manteve-se a regra recente, com a indústria apresentando uma performance inferior a de outras atividades, mesmo quando sua produção logra crescer. Neste caso, além das fragilidades de demanda, derivadas da inflação e do desemprego, que restringem a evolução de todos os setores, a indústria ainda enfrenta graves problemas de oferta, em função dos gargalos em suas cadeias de fornecedores.
Os resultados no acumulado do 1º trim/22 não deixam dúvida sobre a divergência das trajetórias. Enquanto o setor de serviços registrou expansão de +9,5% e o comércio varejista ampliado de +1,1% ante o 1º trim/21, a produção industrial encolheu -4,5%.
Foi o seu terceiro trimestre seguido de declínio para a indústria e a grande diferença do 1º trim/22 em relação aos períodos anteriores é que não houve mais exceção e todos os macrossetores ficaram no vermelho: -2,6% em bens de capital; -3,4% em bens intermediários; -4,4% em bens de consumo semi e não duráveis e -18,3% em bens de consumo duráveis.
O quadro regional do setor também indica uma grande difusão de sinais negativos, sendo que apenas 1/3 das quinze localidades acompanhadas pelo IBGE ficaram no azul, com destaque para o Rio de Janeiro. Já nos 2/3 dos parques regionais no vermelho, o declínio mais intenso foi registrado por Ceará e Pará, enquanto São Paulo (-3,7% ante 1º trim/21) amenizou o declínio do total Brasil.
Assim, mesmo que o nível geral de atividade econômica possa ter ficado no positivo neste primeiro quarto de 2022, graças aos serviços e ao varejo, sua consistência não deixa de ser comprometida com a evolução adversa da indústria, que é quem estabelece o maior número de interações intra e intersetoriais.
Quanto ao comércio varejista, o 1º trim/contou com a ajuda de bases baixas de comparação, dadas as medidas restritivas em algumas regiões no início do ano passado, a exemplo de São Paulo, que passou boa parte de março na chamada “fase vermelha”. Mas também é importante lembrar que, embora lentamente, o quadro do emprego tem evoluído favoravelmente, o que estimula as vendas.
Dos dez ramos acompanhados pelo IBGE, seis apresentaram expansão das vendas no 1º trim/22 e quatro continuaram encolhendo. Entre aqueles no negativo, destaca-se o ramo de supermercados, alimentos, bebidas e fumo (-0,9%), que representa 1/3 do varejo ampliado como um todo e sofre diretamente os efeitos da inflação em alta.
Entre os que ampliaram vendas, os melhores resultados vieram dos ramos de livros, jornais, revistas e papelaria (+24,7%), favorecido pela volta às aulas, e de tecidos, vestuário e calçados (+24,1%), que segue muito longe do pré-pandemia. Nos segmentos de bens de consumo duráveis, com exceção de veículos (+3,5%), o desempenho foi bastante restringido neste começo de ano.
Nos serviços, apenas um dos cinco segmentos identificados pelo IBGE não cresceu em jan-mar/22 e, em comparação com o resultado do 4º trim/21, três dos cinco segmentos até ganharam velocidade, notadamente, os serviços prestados às famílias, com a persistente redução de casos de Covid-19 em fev/22 e mar/22, depois do repique provocado pela variante ômicron.
Os outros dois segmentos com taxas mais robustas de crescimento foram: serviços de transportes, com +15,5% ante o 1º trim/21, com importante contribuição do transporte aéreo e também do terrestre; e dos serviços profissionais, administrativos e complementares, que registraram +8%.
Indústria
Em mar/22, ainda que com muita timidez, a indústria logrou expandir sua produção na comparação com o mês anterior: em +0,3% já descontados os efeitos sazonais. Houve avanços em 54% dos ramos pesquisados pelo IBGE e em 60% dos parques regionais do setor, com destaque para o Sudeste, nesta comparação.
A indústria de São Paulo, em grande medida graças ao ramo automobilístico, foi quem melhor se saiu ao registrar +8,4% frente a fev/22. Outras indústrias regionais também tiveram bons resultados, como Minas Gerais (+2,4%) e Rio de Janeiro (+2,1%). Os casos com queda ou em virtual estagnação marcaram as regiões Sul, Norte e parte do Nordeste (Pernambuco e Bahia).
A despeito desta evolução mais de curto prazo, a indústria segue produzindo menos do que um ano atrás. Para o agregado nacional, a queda foi de -4,5% no 1º trim/22 ante o 1º trim/21. Foi a terceira variação seguida nesta comparação.
A grande diferença do 1º trim/22 em relação aos demais trimestres negativos é que não houve mais exceções: todos os macrossetores ficaram no vermelho: -2,6% em bens de capital; -3,4% em bens intermediários; -4,4% em bens de consumo semi e não duráveis e -18,3% em bens de consumo duráveis.
E mais, a fração dos ramos em queda não parou de aumentar, indicando uma disseminação do sinal negativo. No 3º trim/21, 54% dos ramos perderam produção, no 4º trim/21 foram 69% e agora no 1º trim/22, 80% deles.
O quadro regional do setor também indica uma grande difusão de sinais negativos, sendo que apenas 1/3 das quinze localidades acompanhadas pelo IBGE ficaram no azul. Entre as cinco indústrias regionais com ampliação da produção no 1º trim/22, a maior alta coube ao Rio de Janeiro, com +3,3% ante jan-mar/21, devido a avanços em quase 80% de seus ramos.
Em seguida, ficou a Bahia, com alta de +2,3%, mas com um desempenho bastante concentrado em seus ramos: somente 1/3 conseguiu crescer no 1º trim/22. Foi a indústria baiana que possibilitou que o total Nordeste não recuasse ainda mais (-4,3%).
Os demais resultados positivos, mas bem mais modestos, ficaram a cargo do Amazonas, com +0,5%, de Mato Grosso, também com variação de +0,5%, e da indústria do Espírito Santo, que cresceu +1,6%, ainda que tenha recuado -2,3% em mar/22, em uma trajetória de nítida perda de dinamismo.
Já nos 2/3 dos parques regionais em que prevaleceu o sinal negativo, o declínio mais intenso foi registrado por Ceará (-12,8%), seguido de perto pelo Pará (-12,2%). Em ambos os casos, a grande maioria de seus ramos ficou no vermelho: 90% e 86%, respectivamente. Completam o grupo dos que se saíram pior do que o total Brasil as indústrias de Santa Catarina (-8,9%) e Pernambuco (-6,1%).
São Paulo, que possui o maior e mais diversificado parque industrial do país, amenizou portanto o declínio do total Brasil ao registrar -3,7% no 1º trim/22. Este resultado também significou uma desaceleração importante do ritmo de queda que tinha apresentado no 4º trim/21 (-9,5%). Apesar disso, 78% de seus ramos ficaram no negativo, com destaque para farmacêuticos e farmoquímicos, borracha e plástico, máquinas e aparelhos elétricos, bebidas, têxteis e produtos de metal.
Outros parques industriais de relevo que não cresceram neste primeiro quarto do ano foram: Rio Grande do Sul (-2,3%), devido a 64% de seus ramos, em especial, couro e calçados, móveis e borracha e plástico; Paraná (-2,7%), com 69% de seus ramos no vermelho, principalmente, móveis, máquinas e aparelhos elétricos e borracha e produtos de metal; e Minas Gerais (-2,7%), também com perdas em 69% de seus ramos, lideradas por têxteis, produtos de metal e veículos e autopeças.
Comércio
A despeito da inflação em alta, o comércio varejista parece deixar para trás a fase de oscilação e baixo dinamismo que apresentou na segunda metade do ano passado. As vendas reais do setor, já descontados os efeitos sazonais, cresceram seguidamente nos três primeiros meses de 2022, mesmo tendo perdido um pouco de força ao longo desde período.
Na passagem de fev/22 para mar/22, o resultado foi de +1,0%, com ajuste sazonal, e de +0,7% no conceito ampliado do varejo, que inclui as vendas de veículos, autopeças e material de construção. Diferentemente da indústria, o setor encontra-se em um nível de vendas superior ao de fev/20, isto é, antes do choque inicial da pandemia de Covid-19: 2,6% e 1,7% acima deste patamar, no conceito restrito e no ampliado, respectivamente.
Em decorrência desta evolução recente, o varejo voltou a sinalizar expansão em comparação com o quadro de um ano atrás. Depois de seis meses consecutivos de variações negativas, tanto fev/22 como mar/22 registraram alta em comparação com o mesmo período de 2021.
Em parte, isso foi ajudado por bases baixas de comparação, dadas as medidas restritivas em algumas regiões no início do ano passado, a exemplo de São Paulo, que passou boa parte de março na chamada “fase vermelha”. Mas também é importante lembrar que, embora a inflação não venha dando trégua, o quadro do emprego tem evoluído favoravelmente, o que estimula as vendas.
Assim, o 1º trim/22 foi positivo para o comércio varejista: +1,3% em seu conceito restrito e +1,1% em seu conceito ampliado. A dúvida é se haverá continuidade, dada a pressão da inflação sobre o orçamento das famílias e os efeitos do aumento da taxa básica de juros pelo Banco Central sobre o crédito e o consumo.
Dos dez ramos acompanhados pelo IBGE, seis apresentaram expansão das vendas no 1º trim/22 e quatro continuaram encolhendo, embora estes últimos tenham registrado declínios menos acentuados do que nos trimestres anteriores. Não deixa de ser uma boa notícia e há uma chance desta tendência ter continuidade nos próximos meses, com base no saque extraordinário de recursos do FGTS a partir de abril.
Entre aqueles no negativo, destaca-se o ramo de supermercados, alimentos, bebidas e fumo, que representa nada menos do que 1/3 do varejo ampliado como um todo. Mais atingido pela alta da inflação, cujo um dos principais vetores têm sido os preços dos alimentos, este ramo perde vendas já há cinco trimestres seguidos. Agora em jan-mar/22 ante jan-mar/21 caiu -0,9%, ou seja, de modo menos intenso do que antes.
Outro ramo muito impactado pela alta de preços, o de combustíveis e lubrificantes, também ficou no vermelho no 1º trim/22: -0,4%, depois de ter recuado -6,9% no 4º trim/21. Material de construção, que até meados de 2021 vinha apresentando crescimento expressivo, teve em jan-mar/22 seu terceiro trimestre consecutivo de recuo: -4,8%, sempre em comparação com o mesmo período do ano anterior.
Entre os que ampliaram vendas, o melhor resultado veio de livros, jornais, revistas e papelaria (+24,7%), cujas bases de comparação ainda são muito baixas, já que segue 32,1% aquém do pré-pandemia. O resultado recente deve muito à volta às aulas. Tecidos, vestuário e calçados, que também estão muito longe do pré-pandemia (-13,9%), não ficaram muito atrás e cresceram +24,1% no 1º trim/22 ante o 1º trim/21.
Nos segmentos de bens de consumo duráveis, com exceção de veículos, cujas vendas cresceram +3,5%, o desempenho foi bastante restringido neste começo de ano. Em parte porque a inflação de bens essenciais como energia, combustíveis e alimentos drena recursos que poderiam ser canalizados para bens duráveis, cujo consumo pode mais facilmente ser adiado. Nestes setores também tem havido aumento de preços e restrição de oferta, em função de uma taxa de câmbio mais desvalorizada e dificuldades na obtenção de partes e componentes.
No 1º trim/21, as vendas reais de móveis e eletrodomésticos caíram -6,5%, depois de fortes perdas tanto no 3º trim/21 (-18,2%) como no 4º trim/21 (-20,5%). Equipamentos de escritório, informática e comunicação, a seu turno, ficaram virtualmente estagnado (+0,1% ante jan-mar/21), também após duas quedas sucessivas (-9,6% e -7,6%, respectivamente).
Serviços
Após meses fracos, o resultado de mar/22 sugere um ganho de tração do setor de serviços, cujo faturamento real cresceu +1,7% frente ao mês anterior, já descontados os efeitos sazonais, apoiado por avanços em todos os seus segmentos.
Com isso, o setor ficou 7,2% acima do patamar pré-pandemia, isto é, de fev/20, e na comparação com um ano atrás voltou a registrar taxa de expansão de dois dígitos: +11,4% ante mar/21.
Esta evolução está associada à recomposição da demanda das famílias por serviços, depois de tanto tempo reprimida pela pandemia, pela reativação do transporte aéreo e pelo retorno, mesmo que parcial, das atividades presenciais nos escritórios das empresas, ajudando a recuperar a demanda por serviços geralmente terceirizados, tais como limpeza, segurança etc.
Estes fatores, ao menos por enquanto, parecem estar se sobrepondo à perda do poder de compra da população, devido à aceleração da inflação. Vale também observar que alguns destes componentes do setor acima mencionados continuam contando com bases baixas de comparação e ainda têm muito o que avançar para compensar as perdas durante a pandemia.
De todo modo, no acumulado do 1º trim/22, o desempenho foi favorável para a grande maioria do setor. Apenas um dos cinco segmentos identificados pelo IBGE não conseguiu crescer e o ritmo de expansão dos serviços como um todo não deu sinais de enfraquecimento com a virada do ano (+9,5% no 4º trim/21 e +9,4% no 1º trim/22).
Em comparação com o resultado do 4º trim/21, três dos cinco segmentos até ganharam velocidade, notadamente, os serviços prestados às famílias, com a persistente redução de casos de Covid-19 em fev/22 e mar/22 depois do repique provocado pela variante ômicron. Seus dois componentes avançaram fortemente no 1º trim/22: +31,8% em alojamento e alimentação e +24,5% em outros serviços prestados às famílias.
Mesmo assim, os serviços às famílias permanece 12% abaixo do pré-pandemia e é um dos mais vulneráveis aos efeitos negativos sobre a demanda da população decorrentes do aumento da inflação que temos visto nos últimos meses.
Os outros dois segmentos com taxas mais robustas de crescimento foram: serviços de transportes, com +15,5%, com importante contribuição do transporte aéreo (+67,7%), além do terrestre (+16,1%), e dos serviços profissionais, administrativos e complementares, que registraram +8% no 1º trim/22 ante o 1º trim/21.
Houve apenas um ramo que perdeu fôlego, que foi o de serviços de informação e comunicação (+3,8% ante 1º trim/21), mas que também não se viu muito impactado pela pandemia, dada a necessidade de isolamento. E apenas um segmento ficou no vermelho: outros serviços, que reúne um conjunto diversificado de atividades. Neste caso, porém, caiu menos em jan-mar/22 (-2,3%) do que no final de 2021, o que é uma boa sinalização.