Carta IEDI
Economia Verde: Energias Renováveis
A Carta IEDI de hoje inicia uma série de três estudos sobre as tendências e oportunidades da economia verde. Em verdade, serão apresentados aqui resumos de três trabalhos bastante extensos que a Fundação Getulio Vargas desenvolveu em parceria com o IEDI. O primeiro estudo, matéria da presente Carta, aborda as energias renováveis, entendidas como componentes essenciais para a transição para uma economia mais inclusiva do ponto de vista social e eficiente na sua relação com o meio ambiente, bem como enquanto soluções a questões globais fundamentais como segurança energética, pobreza e mudança climática. O segundo e o terceiro estudos tratam, respectivamente, da eficiência energética e das políticas para promoção da economia verde. O IEDI espera que, com essa iniciativa, colabore para a elaboração de uma Agenda do Desenvolvimento para o Brasil, a qual pressupõe, necessariamente, levar em conta as questões imperativas dadas pelo meio ambiente.
Deve-se considerar, inicialmente, que a transição para uma matriz energética global mais renovável não se dará de forma abrupta, uma vez que a dinâmica que sustenta o modelo energético não-renovável atual é difícil de ser revertida por razões como: (i) o elevado nível de consumo material e energético em países desenvolvidos, que se reflete também em maior ou menor escala em países emergentes, (ii) a infraestrutura energética não-renovável já estabelecida, planejada com vistas ao longo prazo e de forma capital-intensiva, (iii) a crescente demanda por serviços relacionados à energia em todo o mundo, e (iv) o crescimento populacional.
O Brasil desempenha um papel de destaque no cenário energético internacional, fruto de decisões passadas que privilegiaram o aproveitamento do potencial hidrelétrico e a produção de combustíveis a partir de cana-de-açúcar. A razão do imenso prestígio é clara: com base em dados de 2008, o país oferta cerca de 85% de energia elétrica a partir de alternativas renováveis e apresenta a mais eficiente e amplamente adotada solução para produção de energia a partir de biomassa do planeta: somando-se o etanol e cogeração de eletricidade, os produtos de cana-de-açúcar responderam por 28% da oferta interna total de energia do país.
Por ser uma referência em razão da sua matriz com considerável componente de energias renováveis, a questão energética oferece ao país oportunidades que extrapolam as fronteiras nacionais e dizem respeito à inserção do país na economia global. Para muitos, é impossível não privilegiar nesse debate as oportunidades advindas do petróleo do pré-sal e seus potenciais impactos positivos na sociedade brasileira, que extrapolam em muito a cadeia petroleira. Mas devem ser consideradas as incertezas em relação à viabilidade técnica, e conseqüentemente econômica, que ainda rondam o modelo, e o temor que assola parte da comunidade internacional, relacionado a problemas ambientais que possam resultar da exploração de petróleo em águas profundas, catalisado pelo recente acidente envolvendo a British Petroil (BP) no Golfo do México, cujos impactos em biodiversidade ainda se encontram em etapa inicial de inventário.
Outros apontam que deve ser dada prioridade ao comércio internacional de etanol, voltado predominantemente neste momento a países desenvolvidos, considerando também que à medida que esse biocombustível se torne uma commodity, serão inúmeras as oportunidades de exportar equipamentos e tecnologias para que a cadeia álcool-energética seja instalada e/ou ampliada em regiões como a América Central, e áreas tropicais na África e Ásia.
Por certo, o aproveitamento de ambas as oportunidades não é excludente e há que se examinar em maior detalhe que caminhos trilhar, incluindo nesse debate não apenas petróleo e etanol, mas também outras alternativas tais quais energia eólica e solar, que de forma crescente vêm sendo objeto de metas e investimentos em países desenvolvidos, como Estados Unidos e os protagonistas da União Européia, e emergentes, como China e Índia. Vale ressaltar que o privilégio ou o descaso com alguma dessas alternativas é mais que uma opção por uma matriz energética mais ou menos renovável: significa também priorizar ou abdicar do desenvolvimento tecnológico do país em relação a alternativas de energias renováveis. Nesse contexto, vale perguntar se, embora inegavelmente decisivos, o aproveitamento do potencial hidrelétrico e a expansão da produção e do comércio internacional de etanol seriam as únicas oportunidades relacionadas ao setor energético para o Brasil, no século XXI.
O fato é que diversas evidências apontam que o Brasil não deve se contentar com o resultado de decisões de três a quatro décadas atrás, que o colocaram em condição de principal protagonista no cenário energético internacional. São conquistas expressivas, inegavelmente, que conferem ao país uma condição confortável, mas que não devem fazê-lo acomodar-se frente aos desafios e oportunidades que a questão energética coloca à humanidade no século XXI.
O Brasil apresenta grande potencial para o desenvolvimento das energias renováveis e não pode se satisfazer apenas com a exploração do seu potencial hidrelétrico e com a liderança em no cenário internacional de biocombustíveis. Dado o seu potencial para a geração de energia a partir das matrizes eólica e solar, ignorar tais vocações é um contra-senso em termos de segurança energética, que acaba por afetar também a competitividade do país e de suas empresas, uma vez que os mais importantes países do cenário internacional estão investido cada vez mais em P&D e geração a partir de energias renováveis e suas empresas têm ampliado sua participação nesses segmentos. Considerando-se a transição para uma economia verde em escala global, é essencial que o Brasil crie também condições para o desenvolvimento de ecoinovações em energias renováveis.
Energias Renováveis no Contexto Internacional. Não há como negar o recente ganho de representatividade das energias renováveis (ER) no cenário energético internacional. No período 2007/08, a produção de biocombustíveis apresentou expansão tanto em etanol (34%) quanto em biodiesel (33%), e a capacidade global de geração de energia elétrica a partir de fontes renováveis, excluindo-se grandes hidrelétricas (GHE), cresceu em 16%. Ainda no mesmo período, crescimentos significativos são verificados também na capacidade de geração de energias de fonte eólica (29%), solar fotovoltaica conectada (73%) e isolada da rede de transmissão (86%).
Em 2008, reduzindo-se o escopo da análise à capacidade de geração de energia elétrica, a participação de fontes renováveis (1.140 GW) passou a representar 24% da capacidade global instalada. Descontando-se a capacidade das grandes hidrelétricas, dos 280 GW de capacidade instalada de energia elétrica de fontes renováveis, 43% encontram-se em países em desenvolvimento (119 GW), e 34% na União Européia (96 GW). China (27%), Estados Unidos (14%) e Alemanha (12%) respondem por 55% da capacidade global; o Brasil participa com aproximadamente 2% da capacidade instalada global de eletricidade renovável (5 GW), valor que atinge 8% quando a participação das grandes hidrelétricas (81 GW) é considerada.
As fontes renováveis corresponderam a 25% (40 GW) do total adicionado em capacidade instalada de energia elétrica em 2008 (160 GW), levando-as a 6,2% da capacidade global. No mesmo período, as fontes renováveis corresponderam a 23% do acréscimo na geração de energia elétrica global e a 4,4% do total de energia efetivamente gerada no ano.
Mas, se considerada a capacidade acrescida por grandes hidrelétricas (25 GW) em conjunto com as demais fontes renováveis, a participação no adicionado à capacidade instalada global representa 41%.
Dentre os poucos dados disponíveis em relação ao ano de 2009, merece destaque o acréscimo de 62% de energia de fontes renováveis na nova capacidade de geração de eletricidade instalada na União Européia, com especial destaque para energia eólica (37%) e solar fotovoltaica (21%). Tal acréscimo elevou para 20% a participação de energias renováveis no atendimento da demanda de energia elétrica total da região.
Todos esses dados apontam a robustez do processo de expansão da geração de energia a partir de fontes renováveis na oferta global de energia, incluindo não apenas países desenvolvidos como Estados Unidos, Alemanha, Espanha e Japão, mas também países em desenvolvimento como China e Índia, protagonistas em energia eólica.



Investimentos em Energias Renováveis. Em 2008, os investimentos globais em energias renováveis foram da ordem de US$ 160 bilhões, dos quais U$ 40 bilhões (25%) em grandes hidrelétricas. O investimento em renováveis superou o de tecnologias baseadas em combustíveis fósseis (cerca de US$ 110 bilhões) pela primeira vez na história. Foi também o primeiro ano em que mais energia de fonte renovável do que convencional foi adicionada à capacidade de geração de energia elétrica tanto nos Estados Unidos quanto na União Européia.
Dos US$ 120 bilhões investidos, 87% estão concentrados em energia eólica, solar fotovoltaica, e refinarias de biocombustíveis. Todavia, a recente crise econômica teve desdobramentos também sobre o setor de renováveis e, em 2009, houve uma queda de 8,6% frente a 2008, desconsiderando os investimentos em grandes hidrelétricas.
Os Estados Unidos lideraram o ranking de investimentos em 2008, com cerca de US$ 24 bilhões, com os principais destinos sendo a energia eólica e os biocombustíveis. Espanha, China e Alemanha tiveram investimentos na faixa de US$ 15 a 19 bilhões, com o Brasil aparecendo como quinto maior player global no setor com US$ 5 bilhões, graças principalmente aos biocombustíveis.
Além dos valores mencionados previamente, as indústrias eólica e solar fotovoltaica receberam grandes aportes de capital em novas instalações e equipamentos para elevar a capacidade produtiva, e os investimentos em pesquisa e desenvolvimento atingiram a casa dos US$ 20 bilhões em 2009.
Alternativas como energia eólica onshore e etanol de cana-de-açúcar encontram em avançado estágio de maturidade para investidores, seguidas por tecnologias como eólica offshore e solar fotovoltaica.
Os investimentos via venture capital e private equity, essenciais para a difusão de inovações no mercado, responderam, em 2008, por US$ 13,5 bilhões em investimentos, dos quais US$ 350 milhões em etanol de segunda geração (celulósico). Os países em desenvolvimento também observaram considerável crescimento nos mecanismos de auxílio ao financiamento em energias renováveis, que atingiram US$ 2 bilhões.
O setor de energias renováveis também sofreu com os impactos da crise financeira no final de 2008, embora de forma menos aguda que outros setores, dado que os investimentos totais no primeiro semestre de 2009 caíram 15,6% frente ao mesmo período de 2008.
Apesar da fuga de capital dos setores de risco ou em crescimento, muitos projetos continuaram em desenvolvimento, notadamente aqueles com o suporte de políticas públicas favoráveis, dentre as quais merecem destaque as tarifas feed-in, um mecanismo que garante que a energia renovável tenha garantindo seu acesso à rede de transmissão por meio de contratos de longo prazo e de preços que permitam competição com as demais alternativas que acrescentam energia à rede. Busca-se em última instância, por meio desse tipo de política, tornar o fornecimento de energia renovável economicamente viável e competitivo com as alternativas menos limpas, em geral, mais baratas.
As primeiras políticas de incentivo a energias renováveis surgiram na década de 1980, nos países escandinavos, mas foi principalmente a partir de 1998 que a adoção de políticas públicas para promover energias renováveis ganhou maior relevância.
Há, atualmente, metas oficiais para energias renováveis em ao menos 73 países, dentre os quais cerca de 20 países em desenvolvimento. São metas que predominantemente determinam uma proporção da produção de energia que deve obrigatoriamente vir de fontes renováveis, para o período de 2012 a 2020.




Energias Renováveis no Contexto Brasileiro. O Brasil apresenta aproximadamente 45% da oferta total de energia – que inclui eletricidade e combustíveis, proveniente de fontes renováveis. É um valor expressivo no contexto internacional, mas que apresenta tendência de baixa se comparado com 2007.
Restringindo á análise apenas para oferta de energia elétrica, o modelo adotado pelo país no século XX, lastreado na geração a partir de hidrelétricas, faz com o que país apresente um componente renovável elevado: 85,4% da oferta de eletricidade em 2008 foram provenientes de fonte limpa.
Na oferta de energia elétrica, fica claro o foco nas grandes hidrelétricas, responsáveis por 80% da geração, e na biomassa, sobretudo a partir do bagaço de cana-de-açúcar em projetos de co-geração, em detrimento das demais formas de energia renovável, como eólica e solar.
De acordo com o Plano Decenal de Expansão de Energia Elétrica 2010-2019, prevê-se a redução das fontes renováveis para 82,7% da oferta de energia elétrica e a manutenção das grandes hidrelétricas como fonte principal, ainda que com menor relevância – respondendo por cerca de 70% da oferta de eletricidade no país até 2019.
Vale mencionar o crescimento previsto da capacidade instalada no país para pequenas centrais hidrelétricas (PCH) (4,2%), biomassa (5,1%) e eólica (3,6%), que passarão a responder por 12,9% em 2019, ante 9,7% em 2010. Essas três fontes foram as contempladas pelo Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica (PROINFA), iniciativa do Ministério de Minas e Energia para fomento de tecnologias alternativas, instituída em 2002, que apresentou inicialmente 144 projetos contratados (dos quais 7 foram cancelados), totalizando 3.155 MW de capacidade adicionada até o final de 2010.
Mas além da expansão planejada da geração de energia por fontes renováveis, prevê-se uma contribuição maior de termelétricas a óleo combustível – cuja capacidade de geração deve ser incrementada em 162% até o final da década de 2010, chegando a 8,9 MW. Vale ressaltar que produtos de cana-de-açúcar responderam por 18,3% do consumo energético nacional em 2008: sendo 13,5% a partir do bagaço de cana-de-açúcar e 4,8% pela oferta de etanol.
Os setores industrial (39,6%) e de transportes (29,1%) são os principais responsáveis pelo consumo energético do país. Como comparação, o consumo domiciliar responde por 10,8%. Do consumo em transportes, cerca de 16% é atendido por etanol – 11% na forma de álcool hidratado, para o abastecimento de carros à álcool ou flex fuel, e 5,5% como álcool anidro, adicionado à gasolina na proporção de 25%. Ressalta-se a tendência de incremento dessa participação em razão da crescente representatividade de veículos com tecnologia flex fuel na frota brasileira.
Embora as perspectivas oficiais acerca da matriz energética brasileira na próxima década revelem a manutenção de uma matriz predominantemente renovável em eletricidade e o incremento do consumo de biocombustíveis em transportes, pouca relevância é dada a um tópico essencial, a eficiência energética, que visa a redução do consumo energético necessário para a obtenção de uma mesma quantidade de produto nos setores industrial, de transportes e residencial, dentre outros.
O Plano Decenal apresenta cenários extremamente modestos para a conservação de energia, embora a meta de redução no consumo de eletricidade (3,2% em 2019) seja suficiente para retardar a construção de uma hidrelétrica de aproximadamente 4.800 MW de capacidade nominal. Como comparação, o projeto da hidrelétrica de Belo Monte prevê capacidade instalada de 11.233 MW e pode ter geração média de 4.500 MW, em razão da perda de vazão do rio Xingu no verão, época de seca na região.
Em relação à opção brasileira por privilegiar projetos de grandes hidrelétricas, devem ser considerados os crescentes questionamentos em relação aos impactos de hidrelétricas no meio ambiente – em biodiversidade e emissão de gases de efeito-estufa associados à inundação de áreas nativas por grandes reservatórios d’água – e nas comunidades que vivem em áreas afetadas pelos projetos, que acabam por ser involuntariamente reassentadas.
Para além das críticas a impactos sociais e ambientais diretos, a própria eficiência de um modelo de geração de eletricidade baseada em grandes hidrelétricas, cada vez mais distantes dos principais centros consumidores, também é questionada em razão das maiores perdas na transmissão da energia e da maior vulnerabilidade que caracteriza os sistemas centralizados em comparação aos descentralizados.
Além disso, os processos de licenciamento ambiental para grandes hidrelétricas, assim como os de pequenas hidrelétricas (PHE), têm se mostrado demasiado morosos por razões que vão desde a qualidade dos projetos apresentados até a capacidade inadequada dos órgãos governamentais responsáveis para fazer frente à demanda por licenças ambientais, passando pela maior complexidade inerente a análise de impactos de GHE em áreas como a Amazônia. Tal lentidão afasta potenciais investidores das hidrelétricas e, por vezes, aproxima-os de outras alternativas cujos processos de licenciamento mostram-se menos complexos, como por exemplo, termelétricas a óleo combustível, colocando em risco o planejamento energético do país.
Nesse cenário, muitos crêem que é impossível atender à crescente demanda de energia elétrica brasileira prevista até 2019, substituindo os acréscimos apontados de GHE (33,5 GW) e pequenas centrais hidrelétricas (2,9 GW) por meio de outras energias renováveis, em razão de custos não competitivos e do nível de maturidade dessas tecnologias. Por essa análise, não há como o país manter na casa dos 80% o componente de energia limpa na oferta de eletricidade no Brasil se não por meio de hidrelétricas.
Mas o Brasil deveria ao menos estabelecer metas mais ambiciosas para incremento da participação dessas alternativas renováveis na oferta de energia elétrica brasileira, estimulando a ciência, tecnologia e inovação nesses segmentos, de forma semelhante ao que vem ocorrendo no país em transportes, por meio da retomada do consumo do etanol alavancada pela tecnologia flex fuel.


Energias Renováveis: Reflexões e Oportunidades para o Brasil. Diversas evidências apontam que o país não deve se contentar com o resultado de decisões de três a quatro décadas atrás, que o colocaram em condição de principal protagonista no cenário energético internacional. São conquistas expressivas, inegavelmente, que conferem ao país uma condição confortável, mas que não devem fazê-lo acomodar-se frente aos desafios e oportunidades que a questão energética coloca à humanidade no século XXI.
Por razões associadas, sobretudo, à segurança energética e adicionalmente a temas socioambientais, como o combate à mudança climática ou à geração de oportunidades de trabalho, diversos países desenvolvidos e em desenvolvimento vêm estimulando a expansão do componente renovável em suas matrizes energéticas por meio de políticas de incentivo à instalação de projetos baseados em alternativas tais quais energia eólica e solar fotovoltaica, e de destinação de recursos para pesquisa e desenvolvimento em alternativas que se encontram em fase de maturação, como o etanol lignocelulósico. Nesse contexto, merecem destaque países como:
- Estados Unidos: Segundo país que mais investiu em energias renováveis em 2009 (US$ 18,6 bilhões), possui a maior capacidade instalada total com 53,4 GW provenientes de fontes renováveis, dos quais 31,9 GW de energia eólica. É líder no consumo e produção de etanol (47 bilhões de litros) e apresenta meta de elevar tal número para 136 bilhões de litros até 2022.
- China: Liderou o ranking de investimentos em energias renováveis em 2009 com US$ 32,6 bilhões, atingindo 52,5 GW de capacidade instalada, dos quais 26 GW provenientes da fonte eólica, devendo alcançar entre 100 e 150 GW instalados até 2020. Principal produtor de painéis fotovoltaicos do planeta, com mais de 50 empresas atuando no setor.
- Alemanha: É líder mundial em capacidade instalada em energia solar (7,7 GW) e terceiro maior em energia eólica (25,7 GW). Possui 29% de sua matriz de energia elétrica baseada em fontes renováveis, com 36,2 GW instalados até 2009.
- França: Embora não seja um dos maiores players em energias renováveis, apresenta 4,5 GW de energia eólica instalados e apresenta metas relevantes para a participação das fontes renováveis em sua matriz de energia elétrica, 10% até 2020, e de biocombustíveis no consumo total de combustíveis, também 10% até 2020.
- Espanha: Destaque com relação à geração em energia solar, com 3,6 GW instalados, e em energia eólica, com 19 GW instalados. Possui 30% da matriz de energia elétrica baseada em fontes renováveis e é o país que, em 2009, mais investiu nessa área relativamente ao tamanho de seu PIB: US$ 10,4 bilhões.
- Índia: Grande player em energia eólica (10,9 GW) e também em PCHs (2,5 GW). Com relação à energia solar fotovoltaica, o país apresenta metas ambiciosas de instalar 20 GW até 2022.
- Japão: País pioneiro e dos mais voltados à promoção de eficiência energética, também apresentava, em 2009, 12,9 GW provenientes de fontes renováveis, com destaque para Biomassa (3,1 GW) e Solar FV (1,7 GW).
- Coréia do Sul: Até 2009 não apresentava grande destaque na utilização de fontes renováveis em sua matriz energética, mas foi um dos países a dedicar maior parcela de seu pacote de recuperação à crise econômica para investimentos verdes. Possui metas para energia eólica (2,25 GW) e solar (1,3 GW) até 2011.
Ao fazer tais opções, esses países não apenas buscam alcançar maior segurança energética, mas também, ao estimular o desenvolvimento de inovações associadas às energias renováveis em centros de pesquisa e empresas, consolidam competências no setor industrial e tornam-se mais capazes de explorar outras oportunidades que as energias renováveis potencialmente oferecem num cenário de transição global para uma economia verde, como a geração de empregos, a exportação de tecnologias, máquinas e equipamentos, o acesso à energia elétrica em áreas isoladas, dentre outros benefícios.
É neste ponto que vale retornar ao questionamento inicialmente supracitado: seriam a exploração do potencial hidrelétrico e a produção de etanol as únicas oportunidades relacionadas ao setor energético para o Brasil, no século XXI?
Analisando-se inicialmente o contexto interno da geração de eletricidade, a manutenção em níveis elevados do componente renovável na matriz de energia elétrica mostra-se ameaçada com o crescimento previsto da demanda. Ainda em 2007, a oferta interna de energia elétrica a partir de fontes renováveis correspondeu a 89% do total. Tal contribuição deve cair, segundo o PDE 2010-19 para 83%, em 2019, com ponto de mínimo em 79%, em 2013, a partir de quando não se prevê mais a expansão da geração de eletricidade à base de carvão, gás natural e óleo combustível, e retoma-se a participação de fontes renováveis.
Entre 2010 e 2019, planeja-se a expansão em 49% da oferta de energia elétrica, uma adição de 54 GW à rede, para atingir 167 MW de oferta total ao final do período, com incremento de 57% do componente não-renovável e de 47% do renovável. Dos 44,2 GW previstos para serem adicionados no componente renovável até 2019, 83% dizem respeito a hidrelétricas – 33,5 GW em grandes hidrelétricas e 2,9 GW em pequenas hidrelétricas, 10% a energia eólica (4,6 GW) e 7% em biomassa (3,1 GW).
Caso esse planejamento obtenha pleno êxito em sua implementação, ao final da segunda década deste século, as 5 principais contribuições na oferta total de eletricidade serão grandes hidrelétricas (69%), gás natural (7%), óleo combustível (6%), biomassa de cana-de-açúcar (5%) e pequenas hidrelétricas (4%). A alternativa eólica (3,6%) seria apenas a 6ª mais relevante em geração energia elétrica e não há metas para energia solar em escala comercial no país.
Mas o cumprimento da meta de expansão de hidrelétricas esbarra cada vez mais em questionamentos sobre os impactos socioambientais desses projetos, sobretudo naqueles localizados na região amazônica, o que coloca em dúvida também o alinhamento dessa alternativa ao desenvolvimento sustentável do país. Esse processo contribui para o aumento da complexidade do licenciamento ambiental de projetos de hidrelétricas, que passam a demandar mais tempo para serem aprovados.
Uma maneira de se gerenciar esse risco é reduzir o componente de energias renováveis na matriz energética do país: uma ação na contramão do que diversos países vêm fazendo, que o Brasil até poderia justificar em razão de sua matriz energética “limpa”, mas que certamente não cairiam bem ao um país que desempenha papel cada vez mais decisivo na comunidade internacional em temas sociais, econômicos e ambientais.
Outro caminho seria incrementar a participação de alternativas renováveis como energia eólica e solar na matriz energética nacional. Mas tal solução, contudo, é tida ainda por muitos uma proposta ingênua, quando não inviável. Além disso, é comum que críticas à preferência nacional pela construção de novas hidrelétricas sejam simplesmente classificadas como meros libelos anti-barragistas. Vale ressaltar que o potencial eólico brasileiro, estimado em aproximadamente 140 GW no ano de 2001, é provavelmente superior a 300 GW tomando-se por base a tecnologia disponível em 2010. Em termos de energia solar, o país beneficia-se de 2.200 horas de insolação por ano, dado que a maior parte do território nacional encontra-se em regiões de clima tropical e com altos níveis de radiação, mas apresenta capacidade instalada de apenas cerca de 20 MW.
Uma vez que é bastante clara a tendência de expansão em escala global do uso de energia eólica – onshore e offshore – e solar fotovoltaica, e que o Brasil apresenta amplo potencial de exploração dessas alternativas, o que poderia justificar a pouca prioridade dada a elas pelo país?
Se o argumento central é segurança energética, a energia eólica, em razão da complementaridade com o nível dos reservatórios do sistema hidrelétrico, encontra-se em posição privilegiada, o que justificaria metas mais ambiciosas para sua participação na oferta nacional de energia elétrica. Além disso, ao se incrementar a participação das alternativas eólica e solar fotovoltaica, reduz-se a vulnerabilidade do sistema elétrico de forma semelhante ao que ocorre com a maior utilização de termelétricas, quando o nível dos reservatórios encontra-se baixo, com a vantagem de se contribuir à manutenção – ou até mesmo à expansão – do componente renovável na matriz de geração de energia elétrica brasileira.
Outro importante aspecto a ser considerado na análise dessa questão diz respeito aos reflexos da opção por privilegiar as hidrelétricas na competitividade do país, pouco preparado para explorar oportunidades em energias renováveis que não aquelas associadas à biomassa, no país ou em mercados internacionais.
A recente expansão da capacidade instalada em energia eólica esconde a falta de competitividade da indústria brasileira nessa alternativa. O país já se encontra muito atrás dos principais competidores, que começaram a pesquisar na década de 1970, no mesmo período em que, em razão da crise do petróleo, o Brasil apostou no etanol de cana-de-açúcar. Vale lembrar a dificuldade de se cumprir as metas iniciais do PROINFA em relação a projetos de energia eólica, em razão da dificuldade de atendimento da exigência de nacionalização de equipamentos e serviços de, no mínimo, 60% em valor, dentre os projetos a serem instalados.
Em energia solar fotovoltaica, a disputa pelo mercado internacional de energia solar fotovoltaica vê países como Japão, China e Tailândia adentrando de forma robusta à competição, como fornecedores de placas solares, apesar de ainda não produzirem células fotovoltaicas comparáveis às oferecidas por Alemanha e Estados Unidos. Enquanto isso, no Brasil, as políticas para essa alternativa mostram-se ainda tímidas.
Em relação aos biocombustíveis, considerando-se todos os aspectos socioambientais, de segurança alimentar e de competitividade de nações, parece não haver alternativa à expansão da oferta de etanol ao longo do século XXI, que não por meio de tecnologias de segunda geração (etanol lignocelulósico).
Nesse contexto, o Brasil desempenha papel de destaque pelo fato de o país ser o único a apresentar uma alternativa de biocombustível avançado já implementada em larga escala, e pode ampliar a sua vantagem em relação à concorrência em razão de possuir uma matéria prima estabelecida, que pode ser explorada de forma complementar por tecnologias de segunda geração. Com possibilidade de produzir etanol também a partir do bagaço e da palha da cana-de-açúcar, a produtividade de etanol por hectare plantado de cana-de-açúcar, pode ser acrescida em até 40%. Mas a confirmação de tal protagonismo passa necessariamente pelo êxito do país em suas pesquisas em etanol lignocelulósico – de variedades de cana a produção de enzimas e equipamentos, numa corrida na qual já enfrenta forte competição de países como Canadá e Suécia, além dos Estados Unidos, sendo que os investimentos desse último já suplantam os brasileiros.
Mas para além da necessidade de investimentos em pesquisa e desenvolvimento (P&D) em tecnologia para etanol lignocelulósico, há uma ampla gama de oportunidades não exploradas que dizem respeito ao etanol de cana-de-açúcar de primeira geração. As metas internacionais de expansão do uso de biocombustíveis em transporte oferecem ao Brasil não apenas oportunidades de exportar etanol de cana-de-açúcar, já reconhecido como biocombustível avançado, mas também de tecnologia, máquinas e equipamentos. Contudo, apenas o aumento recente do consumo interno, por meio da expansão da frota de carros flex fuel, já saturou a cadeia de suprimento que atende a demanda interna por novas usinas, que atualmente levam cerca de 4 anos para serem instaladas. E há que se considerar ainda que tal processo deve se tornar ainda mais intenso com a consolidação da cadeia alcoolquímica no país e com o amadurecimento da tecnologia de segunda geração.
O Brasil apresenta grande potencial para o desenvolvimento das energias renováveis e não pode se satisfazer apenas com a exploração do seu potencial hidrelétrico e com a liderança em no cenário internacional de biocombustíveis. Dado o seu potencial para a geração de energia a partir das matrizes eólica e solar, ignorar tais vocações é um contra-senso em termos de segurança energética, que acaba por afetar também a competitividade do país e de suas empresas, uma vez que os mais importantes países do cenário internacional estão investido cada vez mais em P&D e geração a partir de energias renováveis e suas empresas têm ampliado sua participação nesses segmentos.
Há que se reconhecer que embora tenha se tornado uma referência em biocombustíveis com o desenvolvimento do etanol de cana-de-açúcar, o Brasil ainda tem seu processo de inovação industrial e agrícola distante do século XXI. Por esse aspecto, considerando-se a transição para uma economia verde em escala global, é essencial que o país crie condições para o desenvolvimento de ecoinovações em energias renováveis.