IEDI na Imprensa - Investimentos no PIB dão sinais de fortalecimento no 1º trimestre
Valor Econômico
Formação Bruta de Capital Fixo deve fechar ano em alta com juro menor e atividade aquecida
Anaïs Fernandes
A trajetória de queda dos juros desde meados de 2023 e as perspectivas melhores para a indústria, a construção civil e o crédito às empresas têm ajudado os investimentos a reagir desde o fim do ano passado, movimento que se intensificou no início de 2024 e deve levar a Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF) a fechar este ano em alta.
A FBCF é a medida no Produto Interno Bruto (PIB) do que se investe em máquinas e equipamentos, construção civil e inovação. Em 2023, ela caiu 3%, após ter subido 1,1% em 2022.
Uma medida da consultoria A.C. Pastore que oferece uma estimativa indireta (uma “proxy”) para a FBCF aponta alta de 7% dos investimentos no primeiro trimestre, em relação aos três meses imediatamente anteriores. No mesmo período de 2023, a FBCF caiu 3%.
“Na construção da ‘proxy’, pegamos fatores relevantes que têm dados mensais e, através de um modelo de regressão, colocamos pesos neles e calculamos qual seria a FBCF”, explica Paula Magalhães, economista-chefe da A.C. Pastore. “A aderência ao longo da série é boa e isso nos ajuda a ver a direção da FBCF. Mas, para a projeção, usamos também nossos modelos, que são mais robustos e incluem, por exemplo, as taxas de juros.”
Por isso, Magalhães diz que uma alta de 7% na FBCF neste início de ano ainda parece exagero. Ela projeta um crescimento menor, mas também forte, ao redor de 4%. Com isso, a projeção para o crescimento da FBCF em 2024 da A.C. Pastore, que já foi de 2%, está em 3,5%.
É um horizonte bastante favorável aos investimentos na construção”
— Ana Maria Castelo
Alguns dos elementos relevantes para estimar a FBCF são o comportamento da indústria, principalmente da produção de bens de capital (como máquinas), e da construção civil.
A produção de bens de capital avança 3,6% no primeiro bimestre de 2024, ante igual período de 2023, enquanto a produção de insumos típicos da construção civil sobe 4,9%, na mesma base de comparação. Os dados são da Pesquisa Industrial Mensal (PIM), do IBGE.
Além disso, a importação de bens de capital, outro sinalizador para os investimentos, cresce a um ritmo bom neste início de ano. O volume dessas importações acumula alta de 14,3% em 2024 até março, de acordo com o Indicador de Comércio Exterior (Icomex) da Fundação Getulio Vargas (FGV).
“O ano passado foi bem ruim. O que puxou para baixo a FBCF foi a produção doméstica. A de bens de capital caiu 11% no acumulado do ano, embora a indústria total tenha ficado praticamente estagnada”, diz Rafael Cagnin, economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI).
No seu último encontro, em março, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central notou, conforme a ata, que “o maior apetite na oferta de crédito assim como a redução das taxas de juros e o relaxamento das condições financeiras sugerem um cenário mais auspicioso para o investimento ao longo de 2024, tal como já observado no último trimestre de 2023”. Diante disso, o BC também elevou sua projeção da FBCF em 2024 de 1% para 1,5%.
“A demanda tem possibilidade de crescer à frente do que chamamos de renda corrente. E o crédito ajuda a antecipar decisões de investimento. Ou seja, o crédito tem esse poder de trazer para o presente e é capaz de gerar um gasto, hoje, superior à renda circular”, explica Cagnin.
O mercado de crédito às empresas foi bastante impactado no ano passado não só pelas taxas de juros elevadas, lembra Cagnin, mas também pelo caso da fraude contábil na Americanas, que deixou os bancos mais cautelosos e restritivos nas concessões.
Neste ano, dados do BC mostram que, no acumulado em 12 meses até fevereiro, as concessões totais nominais aumentaram 5,3%, com incrementos de 1,3% nas operações com pessoas jurídicas e de 8,6% nas com pessoas físicas. As concessões médias diárias em fevereiro avançaram 9,5%, em relação ao observado em janeiro, mas com aumentos de 12,6% no segmento de empresas e de 7,3% no de famílias.
No quarto trimestre de 2023, o PIB ficou estagnado, em relação aos três meses imediatamente anteriores, mas a FBCF já tinha subido 0,9%. O avanço foi puxado, segundo o BC, pela construção, que cresceu 4,2%. Isso, automaticamente, deixou uma “herança estatística” melhor para o desempenho da construção em 2024, indica o BC, que revisou sua estimativa de alta do setor este ano de 1% para 2,5%. Mas há outros elementos.
O mercado de trabalho apertado, a continuidade dos programas habitacionais de baixa renda em todas as esferas governamentais, novas concessões de projetos de infraestrutura e a política monetária menos restritiva tornam o cenário prospectivo positivo para construção civil, “apontando um momento de virada do setor”, afirma o Bradesco em um relatório recente.
O banco espera crescimento de 2,3% do PIB da construção civil em 2024. Em 2023, o setor caiu 0,5%.
Além do Minha Casa Minha Vida (MCMV), que foi relançado pelo governo, o FGTS Futuro, por exemplo, permite aos trabalhadores com carteira usar contribuições futuras do empregador ao fundo para comprovar renda na compra de imóveis ou reduzir o valor da prestação do financiamento no âmbito do MCMV. “Quer dizer, há diversas medidas alavancando a habitação social”, diz Ana Maria Castelo, coordenadora de Projetos da Construção no Instituto Brasileiro de Economia (FGV Ibre).
“A infraestrutura é vital, mas também neste caso há anúncios de investimentos que, se confirmados, devem contribuir para o incremento da FBCF da construção”, afirma Castelo.
Neste início de ano, não apenas os insumos típicos da construção civil registram crescimento, como a produção de aços longos e o emprego formal no setor estão no campo positivo, nota o Bradesco. Além disso, a Pesquisa Empresarial do banco corrobora, segundo os economistas, o cenário de retomada da construção.
“Os empresários do setor têm apontado avanço da procura por empreendimentos imobiliários nos últimos meses. Diferentemente de outros ciclos, os custos seguem abaixo da média e preços seguem em alta, mantendo boas margens para o setor. Esses movimentos são espraiados entre os segmentos da construção permitindo um aumento da confiança dos empresários também de forma generalizada”, dizem Priscila Trigo, Thiago Angelis e Mayara Santiago no relatório.
Resultados da Sondagem da FGV vão em sentido parecido, segundo Castelo. “No fim de 2023, perguntamos as expectativas dos empresários da construção para o setor em 2024. A maioria estava otimista”, diz.
Para Castelo, os desafios para a construção incluem as taxas de juros ainda elevadas e algumas incertezas não resolvidas com a reforma tributária. “Mas, a princípio, é um horizonte bastante favorável aos investimentos na construção.”
Os economistas do Bradesco estimam que cerca de 1,8 milhão de domicílios passam a ter acesso ao crédito imobiliário quando a taxa de juros do financiamento cai de 11% para 9%. Até fevereiro, taxas de mercado direcionadas ao financiamento imobiliário da pessoa física estavam em 11,2%, segundo o BC.
A perspectiva de queda nos juros ao longo de 2024, ainda que essa trajetória tenha se tornado mais incerta nos últimos dias, deve contribuir para o crescimento da FBCF como um todo no ano, segundo Magalhães, da A.C. Pastore. Ela mudou sua estimativa de Selic ao fim dos cortes em 2024 de 9,25% para 10%, mas isso, diz, deve afetar os investimentos mais em 2025.
“A perspectiva para este ano é favorável. As taxas de juros vêm caindo desde meados do ano passado, mas leva pelo menos seis meses para isso chegar às taxas de financiamento. O BC tem sinalizado que vai desacelerar os cortes, mas [o movimento de reduções anteriores] ainda vai bater nas taxas de financiamento”, diz Cagnin, do IEDI.
Ainda que a FBCF cresça em 2024, a taxa de investimento em relação ao PIB deve ficar estável em 16,5%, pondera Magalhães.
“Não sabemos se as novas medidas do governo para incentivar a produção serão bem sucedidas”, afirma. E a própria reforma tributária, lembra, está pendente de regulamentação. “Isso vai ser positivo, mas não tanto no curto prazo. Qualquer coisa que a gente possa fazer para diminuir o ambiente de incertezas, seja na parte fiscal, seja em relação às empresas de capital misto, vai na direção de aumentar o investimento no país”, afirma.