Carta IEDI
Rentabilidade industrial sob a pressão de juros e câmbio
A Carta IEDI de hoje analisa a evolução da rentabilidade de grandes empresas não financeiras de capital aberto depois da pandemia de Covid-19, com ênfase no setor industrial e destacando os resultados do ano passado, cujo contexto macroeconômico foi marcado por crescimento do PIB total e da indústria, mas também por pressões inflacionárias, desvalorização cambial e pelo início de mais uma fase de elevação das taxas de juros no país.
Como discutido em outras análises do Instituto, o PIB do Brasil vem crescendo ao menos +3% ao ano desde 2022 e no ano passado registrou +3,4%, desta vez, impulsionado pela retomada dos investimentos e aceleração do consumo das famílias. O PIB da indústria de transformação se destacou positivamente, avançando +3,8% após dois anos seguidos de queda. Sua produção física também progrediu (+3,7%), puxando a indústria geral (+3,1%), que também inclui as atividades extrativas.
No último trimestre do ano, entretanto, sinais de desaceleração já começavam a aparecer sobretudo na indústria, resultado do aumento dos juros e de incertezas na condução da política econômica, refletindo inclusive em volatilidade e desvalorização acentuada da nossa taxa de câmbio.
Neste quadro, a rentabilidade operacional das quase 300 empresas analisadas nesta Carta apresentou aumento frente a 2023 no acumulado dos três primeiros trimestres de 2024 (16,8% ante 15,8%). O mesmo ocorreu para as empresas industriais: 10,4% ante 8,4%, desconsiderando Petrobras e Vale da amostra, que devido a seus tamanhos impactam muito os resultados.
Ao se incluir o 4º trimestre, que concentra a fase mais aguda de desvalorização cambial, intensificando o aumento do custo de matérias-primas, a margem operacional torna-se mais modesta em 2024: 14,9% para o total das empresas e 9,8% para a indústria exceto Petrobras e Vale.
É neste período também que a taxa Selic volta a ser elevada pelo Banco Central para combater a inflação, pressionada por fatores climáticos a elevar os preços de alimentos e por incertezas quanto ao equilíbrio fiscal. Buscava-se igualmente evitar que a desvalorização cambial contaminasse um conjunto mais amplo de preços. Cabe observar ainda que os juros de mercado já estavam em elevação desde a entrada do segundo semestre em antecipação à decisão do Banco Central.
Assim, as despesas financeiras das empresas passaram a pesar cada vez mais. A cobertura de tais despesas pelo lucro operacional (EBTIDA) no total da amostra de empresas recuou de 1,9 em 2023 para 1,6 em jan-set/24 e então para 1,3 em 2024 como um todo, só não ficando abaixo do patamar de 2020.
Para as empresas industriais exceto Petrobras e a Vale, o indicador, que se manteve acima de 1 em 2019-2023, caiu para apenas 0,9 no agregado de 2024, abaixo do valor de 2020, pior momento da pandemia de Covid-19. Até o 3º trim/24, o desempenho do ano passado era mais favorável: 1,1 ante 1,2 em 2023.
Com isso, subiu de 39,8% para 45,1% a parcela de empresas industriais que não obtiveram recursos suficientes em operações produtivas para fazer frente a suas despesas financeiras.
Com os juros em alta, a margem líquida de lucro do total das empresas da amostra recuou de 8,4% em 2023 para 5,3% em 2024. No caso da indústria exceto Petrobras e Vale o retrocesso foi ainda mais acentuado, passando de 4,7% em 2023 para 2,1% em 2024, abaixo portanto do patamar de 2020 (2,2%).
Setorialmente, o comportamento das margens líquidas de lucro na indústria piorou sobretudo nas empresas de insumos básicos e de bens de consumo não duráveis, cujo desempenho operacional também foi inferior em 2024.
O aumento do endividamento corporativo, depois das dificuldades de financiamento enfrentadas em 2023, devido à aversão a riscos provocada pela crise das Americanas, contribuiu para que as despesas financeiras pesassem mais no ano passado. A demanda aquecida e a melhora das condições de captação de recursos, ao menos até o segundo semestre, contribuíram para isso.
Para o total da amostra, a relação entre endividamento líquido e capital próprio subiu de 77% em 2023 para 82,3% em 2024, o maior patamar do período em tela (2019-2024). Para a indústria exceto Petrobras e Vale o avanço foi mais expressivo, passando de 82,6% para 99,3%, respectivamente. Considerando o acumulado jan-set/24, a evolução havia sido mais bem comportada, chegando a 79% no total da amostra e a 88,5% para a indústria.
É importante notar, contudo, que o alongamento do passivo das empresas industriais teve continuidade em 2024, inclusive no último quarto do ano. No agregado da amostra a participação dos empréstimos de curto prazo no total de empréstimos declinou de 17,9% para 15,5% entre 2023 e 2024 e na indústria exceto Petrobras e Vale, de 13,4% para 12,9%.
Vale mencionar também que a participação de títulos privados na composição das dívidas, especialmente debêntures, manteve sua rota ascendente em 2024, após importante desaceleração em 2023. Na indústria, passou de 8,3% em 2021 para 11% em 2023 e então para 12,3% em 2024, com alongamento de prazos.
Em resumo, os dados levantados nesta Carta IEDI mostram o crescente ônus do aumento de juros para as empresas não financeiras, corroendo sua rentabilidade mesmo num ano de expansão econômica e reação dos resultados operacionais.
As empresas industriais apresentam deterioração mais acentuada do que o total da amostra, o que prejudica as condições de um novo ciclo de investimentos vigoroso o suficiente para fazer frente às necessidades de modernização do setor, de modo a lhe assegurar uma performance superior de produtividade e maior capacidade competitiva.
Como resposta a esse quadro, multiplicaram notícias de venda de ativos na imprensa, acompanhada de revisão de planos de capex e do esforço de alongamento de passivos. A busca por ganhos operacionais adicionais também se torna fundamental, ainda que o menor ritmo de crescimento econômico do país em 2025 e a desorganização do comércio mundial devido a guerras tarifárias e conflitos armados em algumas localidades dificulte a tarefa.
Introdução
Esta Carta IEDI analisa os resultados econômicos e financeiros de 279 grandes empresas não financeiras de capital aberto que apresentaram balanços patrimoniais e demonstrativos de resultados em todos os anos do período de 2019 a 2024.
As empresas foram agregadas em três macrossetores: indústria, comércio e serviços, para as quais analisamos indicadores de rentabilidade, despesas financeiras e do grau e endividamento.
A ênfase maior será dada às empresas industriais, especialmente no agregado da indústria exceto Petrobras e Vale, que por seu tamanho impactam muito os indicadores quando incluídas na amostra.
Os demais agregados setoriais são pontuados quando sua evolução contrasta com o desempenho da indústria, mas os dados completos podem ser consultados no Anexo Estatístico.
Reação industrial e rentabilidade operacional em 2024
Em 2024, a indústria brasileira registrou importante reação frente à trajetória que vinha apresentando no pós-pandemia. Sua produção física cresceu +3,1%, sendo a primeira vez na última década que conseguiu registrar uma alta mais robusta sem ter contado com um base muito deprimida no ano anterior. Na indústria de transformação, a alta chegou a +3,7%.
O PIB industrial também progrediu, registrando +3,3%, isto é quase o dobro do resultado de 2023 (+1,7%). Já o PIB da indústria de transformação, depois de ter caído em 2022 e 2023, cresceu +3,8% no ano passado, superando o desempenho de nossa economia como um todo (+3,4%).
No último trimestre do ano passado, entretanto, sinais de desaceleração já começavam a aparecer, resultado da nova fase de elevação das taxas de juros no país e de incertezas na condução da política econômica, refletindo inclusive em volatilidade e desvalorização acentuada da nossa taxa de câmbio.
Esta performance foi analisa em detalhes pelo IEDI e pode ser verificada nas Cartas IEDI n. 1304 “Ano de crescimento, mas com inflexão à vista”, n. 1306 “A Indústria por Intensidade Tecnológica: especificidades de 2024” e n. 1312 “Indústria em 2024: mais produção, mais emprego” e em diferentes Análises IEDI, como na de 07/03/25 “Enfraquecimento do PIB no final de 2024”.
Neste quadro, a rentabilidade operacional das empresas industriais analisadas nesta Carta apresentou aumento na comparação com 2023, mas não deixou de refletir os sinais adversos do final do ano passado. É o que mostra a comparação entre o acumulado de 2024 como um todo e o acumulado de 2024 até o 3º trimestre do ano.
A rentabilidade operacional das companhias industriais exceto Petrobras e Vale progrediu de 8,4% em 2023 para 9,8% em 2024, ajudada pelo aquecimento da demanda e aceleração da produção industrial como mencionado anteriormente. Superou ainda o patamar de 2019 (9,3%), isto é, antes do choque da Covid-19.
Vale notar que no acumulado dos três primeiros trimestres de 2024, isto é, antes do início da alta da taxa de juros (Selic) pelo Banco Central e do aprofundamento da desvalorização da nossa taxa de câmbio, o retorno operacional do setor havia chegado a 10,4%.
Incluídas Petrobras e Vale, contudo, a rentabilidade operacional da indústria registrou marca mais elevada, de 15,1% no agregado de 2024, mas abaixo dos 17,2% de 2023. Até o 3º trim/24 a evolução indicava certa resiliência ao se encontrar em 17,5%.
O dinamismo industrial em 2024, possibilitou que a receita operacional das empresas crescesse 10,4% na amostra sem Petrobras e Vale em termos nominais (4,7% descontado o IPCA), o que foi importante para assegurar a trajetória da rentabilidade exposta acima, mitigando a alta dos custos de produção, pelo menos até a forte pressão exercida pelo câmbio mais no final do ano, que passou de R$ 5,4/US$ em set/24 para R$ 6,2/US$ em dez/24.
Como resultado, a relação Custos dos Produtos Vendidos sobre a Receita Operacional Líquida declinou pela primeira vez desde 2021, retornando a patamares de 2019. Em 2024 foi de 77,7% ante 79,6% em 2023 na amostra sem Petrobras e Vale, como mostra o gráfico a seguir.
Se entre 2023 e 2024 houve importante recuperação do volume produzido na indústria, nota-se uma dificuldade crescente de as empresas repassarem integralmente ao mercado o aumento de custos influenciado pela desvalorização cambial.
Esta dificuldade, inclusive, é objetivo mesmo da política de juros implementada pelo Banco Central a partir de set/24, que busca evitar o chamado pass-through da taxa de câmbio aos preços de bens e serviços aos consumidores.
Em 2024, nota-se forte alta do IPA matérias primas brutas (11,8%), enquanto o IPA-DI Indústria avançou 5,8%. Segundo os índices de preços de atacado da FGV, a elevação dos preços dos insumos se concentrou no 4º trim/24, conforme indica a tabela a seguir. Vale mencionar ainda o ritmo de aumento dos preços agrícolas, também impactados por fatores climáticos.
As empresas dos demais setores, assim como a indústria exceto Petrobras e Vale, também progrediram em sua rentabilidade operacional entre 2023 e 2024, em função do crescimento superior do PIB do país. Suas margens passaram de 21,2% para 21,8% no caso de serviços e de 3,6% para 5,2% no comércio.
O último trimestre de 2024 também foi mais difícil nestes setores, sobretudo para serviços, cuja rentabilidade operacional era de 23,4% no acumulado dos três primeiros trimestres, enquanto no comércio era de 5,8%.
Assim, se para o total da amostra de empresas de capital aberto a margem operação do agregado de 2024 não foi superior a 2023 (14,9% e 15,8%, respectivamente), foi porque o 4º trim/24 trouxe importante deterioração que atingiu todos os setores identificados. No conjunto das empresas, a rentabilidade operação de jan-set/24 era de 16,8%.
Rentabilidade líquida, juros e câmbio
A fase de redução da taxa básica de juros (Selic) pelo Banco Central, iniciada em set/23, e que permitiu redinamização da indústria em 2024, foi interrompida em jun/24 em um patamar ainda elevado, com uma taxa anual de dois dígitos (10,5% a.a.). A partir de set/24 voltou a subir, encerrando o ano em 12,25% a.a.
A pressão da inflação de alimentos, que chegou a 7,7% em 2024, elevando o IPCA total para 4,83%, mas também de incertezas na condição da política fiscal e o risco de repasse da desvalorização cambial aos preços finais condicionaram o aumento de juros.
Até o final do primeiro trimestre de 2024, a taxa de câmbio vinha se mantendo pouco abaixo de R$ 5,00/US$ e a expectativa de mercado aferida pela pesquisa Focus apontava para uma certa estabilidade até o final do ano. Desde então começou a desvalorizar atingindo R$ 6,2/US$ no final do ano, como mencionado anteriormente.
Desvalorização cambial e elevação dos juros impactaram o valor das dívidas e as despesas financeiras das empresas, restringindo sua rentabilidade líquida, sobretudo na indústria.
Considerada a indústria exceto Petrobras e a Vale, a margem líquida de lucro recuou de 4,7% em 2023 para 2,1% em 2024, ficando abaixo do pior momento da pandemia de Covid-19: 2,2% em 2020. No acumulado jan-set/24, a performance não havia sido muito melhor (2,8%) mas ao menos manteve-se acima de 2020.
Para o agregado da indústria, isto é, inclusive Petrobras e Vale, a margem líquida chegou a 4,4% em 2024, menos da metade do que era em 2023. Se considerarmos apenas até o 3º trim/24, vinha se reduzindo, mas se mantinha em um patamar menos desconfortável, de 7,2%.
Quando observados setorialmente, os dados sobre o comportamento das margens líquidas de lucro demonstram que a piora se encontra localizada principalmente entre as empresas de insumos básicos e de bens de consumo não duráveis.
A margem líquida das empresas de insumos básicos recuou de 11,9% em 2023 para 8,4% em 2024, depois de ter ficado acima de 20% em 2021-2022, quando houve forte desorganização das cadeias produtivas e aumento de preços, em função de momentos distintos de normalização pós pandemia de Covid-19. No caso, da indústria de bens de consumo não duráveis a queda foi de 2,3% para 1,8% entre 2023 e 2024, após ter atingido 6,3% em 2021.
Em 2024, as margens líquidas de lucro nos setores de Papel e Celulose, Química e Minerais não Metálicos registraram prejuízo de, respectivamente, -7,2%, -4,2% e -1,8%. Os segmentos de Alimentos (0,8%), Vestuário (2,1%) e Siderurgia (1,4%), apresentaram baixa rentabilidade.
Esta parcela da indústria também apresentou, em geral, desempenhos operacionais ruins, corroídos ainda mais pelas despesas financeiras. Ainda que alguns setores concentrem estes desempenhos, o aumento da fragilização financeira atingiu empresas de diversos setores, como será discutido mais adiante.
No caso da margem líquida também chama atenção como o resultado foi significativamente pior para as empresas industriais em relação às empresas de serviço e comércio, embora as empresas de transporte também tenham concentrado reduções significativas na rentabilidade, como mostra a tabela 1 do anexo estatístico.
No caso dos serviços, a margem líquida subiu de 8,5% em 2023 para 9,2% em 2024 e no comércio, de 0,4% para 3,1%. Para ambos os setores, o acumulado até o 3º trim/24 também sinalizada resultados mais robustos: 10% nos serviços e 4,0% no comércio.
Assim, a deterioração da margem líquida para o total da amostra considerada nesta Carta IEDI, de 8,4% em 2023 para 5,3% em 2024, deveu-se basicamente ao setor industrial, consideradas ou não as gigantes Petrobras e Vale.
Cobertura das despesas financeiras
A cobertura das despesas financeiras pelo lucro operacional (EBTIDA) também expressa a deterioração financeira recente das empresas. Para as empresas industriais exceto Petrobras e a Vale, o indicador se manteve acima de 1 na maior parte do período 2019-2023, mas caiu para apenas 0,9 no agregado de 2024. Este é um valor menor do que o de 2020, ano do choque da pandemia de Covid-19.
Ou seja, em 2024 um número expressivo de empresas industriais não gerou recursos suficientes nas suas operações produtivas para pagar suas despesas financeiras. Também neste indicador, o último trimestre do ano foi decisivo para este quadro, já que no acumulado do ano até set/24 a deterioração se mostrava marginal: 1,1 ante 1,2 em 2023.
Esta evolução foi influenciada pelo maior patamar de dívidas das empresas, impactado inclusive pela desvalorização adicional do câmbio nos últimos meses do ano, bem como pelo aumento das taxas de juros.
Entre os demais setores, só no comércio o indicador regrediu ainda mais do que na indústria. Ficou em 0,3 em 2024 ante 1,0 em 2023. Nos serviços, por sua vez, subiu de 1,3 para 1,4.
No agregado total das empresas da amostra, a relação EBTIDA/Despesas Financeiras recuou de 1,9 em 2023 para 1,3 em 2024, mas manteve-se acima do patamar de 2020 (1,2).
Em 2024, de cada 10 empresas da amostra, 4 delas obtiveram lucros operacionais (EBTIDA) insuficientes para cobrirem as despesas financeiras. Mais precisamente 42,1% da amostra de 279 empresas de capital aberto ficaram nessa situação, superando o patamar registrado em 2020, durante o pior momento da pandemia, quando 41,9% das empresas apresentaram esta situação financeira.
Entre 2023 e 2024, o percentual de empresas industriais com o indicador menor do que 1 no total do setor subiu de 39,8% para 45,1%. No setor de serviços também houve elevação (de 27,1% para 28,6%), mas as participações ficaram em patamares bem abaixo do da indústria. No caso das empresas do comércio o indicador ficou estável em 13,5%.
Endividamento
Depois do período de aversão a riscos em 2023, influenciado pela falência das Americanas, que dificultou a captação de recursos pelas empresas (Carta IEDI n. 1280), 2024 trouxe melhores condições para a contratação de financiamento, ao menos até meados do ano. A dinamização da economia também estimulou a alavancagem corporativa.
Para o total da amostra, a relação entre endividamento líquido e capital próprio subiu de 77% em 2023 para 82,3% em 2024, o maior patamar do período em tela (2019-2024). Para a indústria exceto Petrobras e Vale o avanço foi mais expressivo, passando de 82,6% para 99,3%, respectivamente.
Considerando o acumulado dos três primeiros trimestres de 2024, a evolução deste indicador havia sido mais bem comportada, chegando a 79% no total da amostra e a 88,5% para a indústria exceto as duas gigantes mencionadas acima. Para este agregado da indústria, o patamar era o mesmo de 2020.
Estes valores indicam que a deterioração dos indicadores de endividamento se concentrou muito no último quarto do ano, sob o ônus da desvalorização cambial e aumento dos juros, o que também marcou outros indicadores, como a relação entre capital de terceiros e capital próprio.
Para o total da amostra de empresas desta Carta IEDI, o capital de terceiros chegou a 2,2 vezes o capital próprio em 2024 ante 2,1 em 2023. A piora se deu no 4º trim/24, já que o acumulado até o 3º trim/24 (2 vezes) apontava para uma redução desta relação. Para a indústria exceto Petrobras e Vale, foi de 2,3 em 2023 para 2,4 em jan-set/24 e então para 2,8 no acumulado jan-dez/24.
É importante notar, contudo, que o alongamento do passivo das empresas industriais teve continuidade em 2024, inclusive no último quarto do ano. No agregado do setor exceto Petrobras e Vale, a participação dos empréstimos de curto prazo no total de empréstimos declinou de 14,2% em 2022 para 13,4% em 2023 e então para 12,9% em 2024.
Para o total da amostra, sob influência das empresas do comércio, esta participação dos empréstimos de curto prazo subiu de 17% em 2022 para 17,9% em 2023, influenciada pela crise das Americanas, mas voltou a recuar em 2024, quando ficou em 15,5%, próximo ao patamar de 2019-2021.
Vale mencionar também que a participação de títulos privados na composição das dívidas, especialmente debêntures, manteve sua rota ascendente em 2024, após importante desaceleração em 2023. Passou de 8,3% em 2021 para 11% em 2023 e então para 12,3% em 2024.
A partir da segunda metade do ano passado, contudo, isso ajudou a elevar os custos financeiros das empresas, notadamente das menos líquidas e com menor rating, devido à elevação de indexadores como o Certificado de Depósito Interbancário (CDI) e o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) subiram. Em 2024, nota-se elevação do percentual de debêntures de longo prazo para o patamar de 11,5% e diminuição das de curto-prazo para 0,8% do total do endividamento.
Em relação ao total de endividamento bancário, também puxado pelas dívidas de longo prazo, seu valor para o total da amostra considerada nesta Carta cresceu de R$ 1,94 trilhões em 2023 R$ 2,31 trilhões ao final de 2024, isto é, alta de 19,1% em valores correntes. Metade disso deveu-se ao 4º trim/24, já que o aumento no acumulado do ano até o 3º trim/24 foi de +9,4%.
No caso da indústria exceto Petrobras e Vale, o valor das dívidas bancárias aumentou, em termos correntes, de R$ 683 bilhões para R$ 841,5 bilhões, ou seja, +23,2% - à frente portanto do total da amostra de empresas não financeiras. Até o 3º trim/24, a alta havia sido de +12%.
Entre 2023 e 2024, o endividamento bancário de longo prazo das grandes empresas cresceu R$ 361 bilhões. Mais da metade desse acréscimo (52% ou R$ 190 bilhões) concentrou-se no quarto trimestre de 2024, elevando o saldo total para R$ 1,95 trilhão ao fim do ano. Um movimento que reflete a antecipação das empresas antes que as taxas de juros subissem ainda mais.
No segmento industrial exceto Petrobras e Vale, a dívida bancária de longo prazo alcançou R$ 732 bilhões em 2024, equivalente a 37 % do endividamento total de longo prazo das grandes companhias. Esse valor supera em R$ 141 bilhões o registrado em 2023, e quase metade desse avanço (49,0%) também ocorreu apenas no último trimestre.
Ainda que o cenário não seja de crise, há uma fragilização financeira das empresas provocada pelo aumento das taxas de juros e desvalorização cambial a encarecer alguns de seus custos. É uma situação que representa um risco para o ritmo de investimento das empresas, que precisam se modernizar diante das inovações tecnológicas em curso, como a digitalização, e a necessidade de melhor performar quanto à emissão de gases de efeito estufa.
O desempenho da lucratividade operacional, como visto anteriormente, não foi suficiente para compensar a ampliação do custo do serviços das dívidas, o que comprometeu a lucratividade líquida das empresas, notadamente na indústria. O desafio tende a se elevar em 2025, quando se espera uma desaceleração importante de nosso PIB e a manutenção por um período mais longo de taxas de juros em patamares elevados.