IEDI na Imprensa - No Cenário Externo, Confiança Em Alta
No Cenário Externo, Confiança Em Alta
Gazeta Mercantil – 29/12/2005
Maior obstáculo para alcançar o investment grade é a relação dívida/PIB que no Brasil, neste ano, continua ainda maior que 50%.
Editorial
Na terça-feira, pela primeira vez, o risco-Brasil caiu abaixo da barreira psicológica dos 300 pontos, batendo nos 298 pontos. O fato não foi episódio isolado. Desde junho, registra-se substancial redução do risco-País. Se, por um lado, a sólida evolução dos fundamentos da economia brasileira dos últimos anos explica essa obtenção de maior confiabilidade no cenário externo, por outro lado, merece atenção a despreocupação dos analistas internacionais de risco para a crise política vivida pelo País no período.
É fato que há muita liquidez no mercado internacional. Há também baixa oferta de títulos da dívida externa dos países emergentes, porque não foi apenas o Brasil que nos últimos meses antecipou pagamentos aos organismos internacionais. Consultores especializados estimam que a participação dos compromissos externos dos países emergentes, em relação ao endividamento global, caiu de 42% em 2002 para 32% neste ano.
A situação brasileira nesse quadro é confortável. Em especial, no horizonte de curto prazo. Entre 2006 e 2007 devem vencer US$ 11,8 bilhões da dívida brasileira, mas o Tesouro Nacional já comunicou a quitação de 20% e a rolagem de US$ 9,4 bilhões, sendo cerca de US$ 5 bilhões no próximo ano. Porém, US$ 3,5 bilhões já foram obtidos antecipadamente em 2005.
Esse quadro também não significa que todos os problemas do financiamento externo brasileiro estão resolvidos. É consenso que o País não deve alcançar o investment grade antes de dois anos. Essa qualificação permitiria ao Brasil obter capitais externos em condições melhores de juros e prazos, porque os gestores dos maiores fundos de pensão teriam autorização para romper certos limites de investimentos no País.
A maior barreira para obtenção desse grau é o perfil das finanças públicas brasileiras. O risco-País não é bem menor (o México, por exemplo, oscila em torno dos 120 pontos) porque a dívida pública ainda é superior a 50% do PIB no Brasil. Investment grade exige que essa relação não ultrapasse 33%.
O crescimento nos gastos com as despesas correntes primárias, ou seja, o custo da folha de pagamento da máquina pública, mais gastos com os aposentados e custeio da máquina administrativa, precisa ser menor do que o avanço do PIB ou não sobram recursos para investimentos.
Em 1995, as despesas correntes primárias da União correspondiam a 15% do PIB. Em 2004, elas atingiram 17,4% do PIB. Neste ano, a estimativa é de que esse índice alcance 18,5% do PIB. Apesar da redução dos gastos do Estado, o aumento do superávit primário (a diferença entre despesa e receita sem os juros) foi produto do aumento da carga tributária, em média 1% ao ano, desde 1997. Nesse ano, a carga era 27% do PIB em 1997 e chegou a 35,9% em 2004. Para este ano, o peso dos impostos deve alcançar 37% do PIB. Como o Estado não reduz as despesas primárias, aumentam os tributos.
O problema não é diferente com os juros da dívida líquida. Como a dívida não diminui, os juros já alcançaram em novembro 8,28% do PIB. Mesmo o superávit recorde deste ano, que deve atingir 5,5% do PIB, a conta final dos juros deve fechar em 2005 próxima a R$ 160 bilhões, R$ 32 bilhões acima de 2004.
O lado mais perverso desses cálculos foi apresentado por Júlio Sérgio de Almeida, diretor do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi): "De cada real que o governo arranca de impostos, quase R$ 0,25 retorna para o feliz grupo que financia a dívida pública".
Sem reduzir a relação dívida pública/PIB, será difícil fazer com que esse R$ 0,25 de cada real pago como imposto se transforme em investimento de infra-estrutura e não em pagamento do "serviço" de dívida estratosférica. Em 2005, segundo o BC, a dívida será 51,5% do PIB, na prática igual a 2004: 51,7%.
Alterar esse quadro significa fazer o Estado brasileiro gastar bem cada real cobrado de impostos. Por isso, investment grade espelha algo mais que grau de confiabilidade externa. É um retrato do que o governo faz com a riqueza que o povo produz. Quando esse retrato é bom, é seguro investir nesse lugar.