A Contribuição da
Complexidade das Exportações
para o Desenvolvimento. Em um
cenário internacional da produção
e comércio organizados em cadeias globais
de valor, torna-se cada vez mais importante
entender a qualidade da participação
das empresas dos diferentes países
e como ela está relacionada ao seu
próprio desenvolvimento e ao da economia.
Em geral, atuar em atividades mais intensivas
em conhecimento e tecnologia, inovadoras e
que geram diferenciação –
ou simplesmente que são mais exclusivas,
isto é, porque poucos concorrentes
conseguem faze-lo – está
associado à possibilidade de níveis
mais elevados de valor dos bens e serviços
e de maior poder de mercado.
Pensando nisso, recentemente os economistas
Ricardo Hausmman e César Hidalgo, respectivamente
da Universidade de Harvard e do Instituto
Tecnológico de Massachusetts (MIT)
dos Estados Unidos, criaram indicadores para
analisar a complexidade dos bens exportados
pelos diferentes países, reunidos no
Atlas da Complexidade Econômica, uma
base de dados que periodicamente lança
uma publicação com as principais
análises relativas ao último
ano de atualização, disponíveis
no site http://atlas.cid.harvard.edu/
O indicador de complexidade considera duas
dimensões: a diversificação
e a ubiquidade. A diversificação
é tomada em termos da quantidade de
produtos exportados por um país, enquanto
a ubiquidade é avaliada pela quantidade
de países que exporta cada produto.
O simples e abrangente ponto de partida do
indicador é, assim, de que quanto maior
a variedade de bens que um país consegue
exportar e quanto mais exclusivos forem seus
produtos exportados, maior a complexidade
econômica. Em outras palavras, a complexidade
econômica é maior quanto menos
ubíquos e mais diversificados os produtos
exportados.
Em seus estudos, os autores e outros pesquisadores
do Atlas têm demonstrado que existe
uma significativa correlação
entre a estrutura produtiva dos países
e a desigualdade de renda: quanto mais complexa,
menor a desigualdade. Conforme explicam na
introdução do livro, as sociedades
modernas podem produzir uma quantidade tremenda
de conhecimento produtivo porque as diversas
partes do processo estão distribuídas
entre diversos trabalhadores, empresas, regiões
e países.
A diversidade de especializações
organiza-se a partir de instituições
e mercados, de forma que a acumulação
social desse conhecimento produtivo é
desigual e está relacionada diretamente
com o desenvolvimento econômico e a
elevação do padrão de
vida. “É por isso que o trabalhador
comum de um país rico trabalha em uma
firma maior e mais conectada do que as firmas
dos países pobres”. Para que
a sociedade opere com um nível alto
de conhecimento produtivo, é preciso
que o tecido produtivo se torne cada vez mais
sofisticado, elevando a produtividade, salários,
emprego e a dinâmica de renda. Mesmo
em países ricos produtores de recursos
naturais mais raros, ou seja, que poucos exportam,
a melhor distribuição das rendas
das exportações de produtos
e a dinamização da economia
também está relacionada com
a sofisticação do tecido produtivo.
Mais além, o Atlas da Complexidade
revela que a complexidade econômica
é a principal explicação
para a diferença entre os padrões
de crescimento dos países comparada
a outros determinantes relacionados à
governança e à qualidade das
instituições, como estabilidade
política, cumprimento da lei, qualidade
da regulação, efetividade do
governo, controle da corrupção.
A complexidade também se revela mais
importante do que o próprio capital
humano, seja avaliado por anos de escolaridade,
habilidades cognitivas ou pelo conjunto de
medidas educacionais.
Complexidade das Exportações
no Mundo. De acordo com o Atlas
da Complexidade Econômica da Universidade
de Harvard, em um ranking de 123 países
o Japão foi o responsável pelas
exportações mais complexas em
2014, tendo mantido sua posição
de 2004. Alemanha vem em segundo, também
mantendo sua colocação, seguida
pela Suíça, Coreia do Sul, Suécia,
Áustria, República Tcheca, Finlândia,
Hungria e Eslovênia. Esses últimos
países, sobretudo aqueles em desenvolvimento,
fazem parte dos esquemas regionais de integração
intra-industrial, recebendo investimentos
preferenciais de Alemanha, EUA e Japão.
Impressiona a ascensão de Coreia do
Sul em dez anos, passando da 15ª posição
para a 4ª, e também da Hungria
– da 18ª para a 9ª. Vale destacar
também a queda relativa dos EUA, da
8ª colocação em 2004 para
13ª em 2014 e a rápida ascensão
chinesa da 33ª para 17ª. Em contraste,
o Brasil, que em 2004 já estava numa
situação de 41º no ranking
da complexidade, caiu para a 51ª posição
em 2014, atrás de diversos países
em desenvolvimento, como México, Uruguai,
El Salvador e Costa Rica.
Os vinte países mais complexos incluem
economias de alta renda e alguns poucos de
média renda, como Eslováquia
ou México, para onde houve realocação
da produção relacionada às
cadeias produtivas, respectivamente, da União
Europeia e do NAFTA. Contudo, há exceções
de países ricos que não estão
entre os mais complexos – devido à
baixa diversidade de suas pautas de exportação
– como Noruega (31ª), Emirados
Árabes (63ª) e Austrália
(79ª). Mas sem dúvida, da 80ª
posição em diante, ou seja,
os países menos complexos do ranking,
são de baixa renda. Portanto, conforme
mostra o mapa, pode-se traçar uma nova
divisão centro/periferia baseada na
complexidade das exportações,
ainda que não haja uma perfeita correlação
positiva com a qualidade de vida e padrão
de renda dos países.
Em uma lista de mais de 800 produtos (seguindo
classificação SITC - Standard
International Trade Classification revisão
4), os cinco mais complexos pertencem aos
ramos de máquinas ou de químicos
e saúde. Já entre os cinco menos
complexos, despontam produtos dos ramos de
petróleo, mineração e
gêneros agrícolas tropicais ou
temperados. Interessantemente, petróleo
refinado é um dos produtos mais complexos,
ao passo que o petróleo cru está
entre os menos complexos.
De acordo com os Atlas, alguns ramos de produtos
estão no núcleo do tecido produtivo,
sendo mais essenciais para a capacidade de
diversificação, ou seja, de
incremento da própria complexidade.
Esses grupos são, essencialmente, máquinas,
materiais para construção, químicos
e saúde e vestuário. Ou seja,
são atividades mais complexas e que,
por consequência, apresentam mais conexões
com o restante das atividades produtivas.
Já petróleo cru, algodão,
arroz e soja tendem a ter menores conectividade
e complexidade.
Adicionalmente, maquinário, eletrônicos,
químicos e saúde e outros químicos,
além de serem os ramos de produtos
mais complexos, são também os
de maior participação no comércio
internacional (cerca de 50% considerando a
média 2006-2008), incluindo um grupo
maior de produtos exportados. Os maiores exportadores
nestes ramos de produtos incluem Alemanha,
Estados Unidos, Japão, França,
Bélgica, Hong Kong e China. O Brasil
está entre os maiores produtores de
cereais e óleos vegetais, carne e ovos
e outros produtos agrícolas, que têm
complexidade média-baixa.
Complexidade das Exportações
e Importações do Brasil. Aquedado
Brasil no ranking da complexidade das exportações
entre 2004 e 2014 se deve à deterioração
da pauta, cada vez mais concentrada em produtos
minerais (27% – notavelmente, minérios
de ferro e petróleo cru), produtos
vegetais (17% – soja, milho e café)
e alimentos (12% – açúcar
bruto e farelo de soja). Dentre os gêneros
industriais destacam-se máquinas e
equipamentos elétricos (6% –
rodo-escavadeiras, partes de ignição),
produtos de metal (6% –derivados do
ferro), químicos e relacionados (5%
–corindo artificial, medicamentos) e
equipamentos de transporte (7% – carros,
aeronaves). Por outro lado, as importações
brasileiras são compostas de itens
mais complexos industriais como máquinas/
elétricos (25% – circuitos integrados
eletrônicos, telefones, turbos a jato),
produtos minerais (21% – petróleo
refinado e cru), químicos e relacionados
(16% – fertilizantes, pesticidas) e
equipamentos de transporte (11% – carros,
partes e acessórios).
Através do DATAVIVA (base elaborada
por uma parceria entre o Escritório
de Prioridades Estratégicas do Governo
de Minas Gerais e uma consultoria internacional,
com dados disponibilizados pelos ministérios
do Trabalho e Emprego (MTE) e do Desenvolvimento,
Indústria e Comércio Exterior
(MDIC)) é possível também
entender as diferenças de complexidade
das regiões exportadoras nacionais.
As informações estão
no link http://www.dataviva.info/.
O maior estado exportador da Federação
em 2014 foi São Paulo (US$ 51,5 bilhões),
seguido por Minas Gerais (US$ 29,3 bilhões)
e Rio de Janeiro (US$ 22,6 bilhões).
Se consideradas as microrregiões produtoras,
são líderes São Paulo
(São Paulo mais as cidades do ABC paulista,
US$ 12, 6 bilhões), Rio de Janeiro
(Rio de Janeiro mais 15 cidades da área
metropolitana, US$ 12,6 bilhões) e
Parauapebas (municípios paraenses de
Parauapebas, Eldorado dos Carajás,
Canaã dos Carajás, Água
Azul do Norte, Curionópolis, US$ 8,3
bilhões) – sendo os principais
grupos de produtos exportados, respectivamente,
transportes (23%), petróleo cru (39%)
e minério de ferro (90%). Em termos
de municípios, os maiores exportadores
são Parauapebas (US$ 7,6 bilhões),
Rio de Janeiro (US$ 7,49 bilhões),
São Paulo (US$ 7,32 bilhões).
Quanto aos produtos, como dito anteriormente,
as seções com maior parcela
nas exportações brasileiras
em 2014 foram produtos minerais, produtos
de origem vegetal, gêneros alimentícios,
produtos de origem animal, transportes e máquinas.
As duas últimas seções
incluem produtos com índices de complexidade
mais elevados relativamente aos outros. No
caso de máquinas, o principal município
exportador em 2014 foi Petrópolis,
seguido por Piracicaba; enquanto o principal
destino foram os Estados Unidos. Já
em transportes, tem-se São José
dos Campos e São Bernardo do Campo,
com a Argentina como maior mercado.
Quando se avalia a complexidade das exportações
das microrregiões brasileiras, são
líderes São Paulo+ABC, Campinas,
São José dos Campos, Sorocaba
e Guarulhos. Dentre as vinte microrregiões
com exportações mais complexas,
a maioria pertence ao Estado de São
Paulo, mas também incluem Rio de Janeiro,
Manaus, Caxias do Sul, Curitiba, Porto Alegre,
Ipatinga e Vale do Paraíba Fluminense.
Na lista dos vinte produtos mais complexos,
que somados responderam a míseros 0,2%
das exportações brasileiras
em 2014, há alguns itens das seções
de química, instrumentos, máquinas,
metais. Os produtos que encabeçaram
o ranking foram material fotográfico/
exposto/ revelado (sendo Rio de Janeiro o
principal município exportador e a
Argentina o principal destino), equipamento
de laboratório fotográfico,
vidro soprado, maquinário para têxteis
artificiais e dispositivos de cristal líquido.
Somente na 148ª posição
do ranking é que se encontra um bem
cujas exportações excederam
US$ 1 bilhão.
A diversidade de produção e
exportação de bens no Brasil
é alta, porém bastante concentrada
na região Sudeste, berço também
de produtos de maior complexidade tecnológica.
Porém, os bens mais complexos estão
longe de ser os mais importantes da pauta
comercial brasileira, incluindo o Sudeste.
Ao contrário, como visto, até
2014 existia uma tendência à
maior participação de itens
de baixíssima complexidade. O enfraquecimento
da posição comercial do Brasil
é uma ameaça ao futuro da trajetória
de desenvolvimento. Cada vez mais suas cadeias
produtivas estão sendo corroídas,
perdendo elos sofisticados, de modo que as
exportações estejam se especializando
em atividades menos conectadas e menos complexas.
A conclusão geral desta análise
é que exceto se o Brasil voltar a praticar
políticas industriais e macroeconômicas
corretas em prol do reerguimento industrial
e do fomento às exportações
mais complexas ficará comprometida
a capacidade de crescimento de sua economia.
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