China e Brasil: As Velocidades
de Mudanças dos Sistemas de Inovação.
Tanto a China, como o Brasil
têm buscado adaptar suas políticas
de CT&I ao novo contexto da economia mundial
e aos chamados desafios da sociedade do conhecimento.
Os documentos oficiais deixam claro uma crescente
ênfase na inovação, a
busca de apoio às empresas como protagonistas
principais dos sistemas de inovação,
a introdução de políticas
de estímulo ao esforço tecnológico
empresarial, uma indução à
maior cooperação entre universidades
e empresas, etc. Mas é preciso, antes
de qualquer comparação pontual,
salientar uma diferença marcante entre
a China e o Brasil: a velocidade da mudança.
Qualquer indicador de desempenho da China
pode resumir isso. Entre 2000 e 2009, o gasto
da China em P&D passou de 0,9% do PIB
para 1,7%, um desempenho impressionante, frente,
por exemplo, ao Brasil, cuju gasto passou
de 1,0% para 1,2% do PIB. Mas, esse número
conta apenas parte da história. Como
o PIB da China multiplicou-se por três
naquele período e o do Brasil cresceu
pouco mais de 60%, o crescimento do gasto
da China foi, de fato, muito maior. No ano
2000, embora gastasse quase o mesmo em relação
ao PIB (0,9% na China e 1,0% no Brasil), a
economia chinesa já era mais de duas
vezes (2,4) a brasileira e o seu gasto cerca
de 2,2 vezes o do Brasil. Em 2009, o gasto
em P&D da China comparado com o do Brasil
era 6,5 vezes maior.
O dinamismo da economia chinesa é um
fato marcante. Mantido esse diferencial, é
possível estimar que o gasto em P&D
da China seja cerca de dez vezes maior que
o do Brasil em 2020. O ritmo da mudança
não se reflete apenas no gasto. O dinamismo
cria outro ambiente, estimula o investimento
privado, muda culturas e comportamentos, induz
o risco, coloca a economia em contato com
o mundo e premia o sucesso. Entender as diferenças
entre a China e o Brasil passa pela comparação
de seus indicadores, mas passa também
por entender a diferença notável
entre uma economia de crescimento acelerado
e uma de crescimento moderado.


Características Gerais dos Sistemas
Nacionais de C, T & I no Brasil e na China.
É possível identificar
as características básicas dos
sistemas nacionais de CT&I da China e
do Brasil. Um primeiro fato que chama atenção
é como evoluíram esses sistemas
nas últimas décadas. Há
trinta anos, quer em termos de patentes depositadas
no escritório norte-americano (USPTO),
quer em termos de publicações
científicas internacionais, o Brasil
apresentava números bem melhores que
a China: depositava sete vezes mais patentes
e sua produção científica
era sessenta por cento maior que a chinesa.
Hoje esses números mais que se inverteram:
a produção científica
chinesa, medida por publicações
internacionais, é quase quatro vezes
a brasileira e o número de patentes
da China depositadas no USPT é quase
quinze vezes maior que o correspondente do
Brasil.
Atualmente, e isso é central para compreender
as peculiaridades dos dois países,
há que se evidenciar as diferenças
entre o Brasil e a China em termos das dimensões
absolutas de seus sistemas nacionais de CT&I.
Nesse sentido, vale atentar para:
- O gasto em P&D da China, em relação ao PIB, é hoje cerca de 40% maior que o do Brasil e tem crescido a taxas muito elevadas, comparativamente ao gasto brasileiro. Mas, em razão da diferença de tamanho entre as duas economias, isso implica dispêndios anuais em CT&I, como foi dito, seis vezes e meia maior na China que no Brasil – quando medido em dólares americanos pelo poder de paridade de compra, PPC. (Medido em dólares correntes, o gasto em P&D da China era, em 2009, equivalente a 4,5 vezes o gasto do Brasil).
- As maiores diferenças entre China e Brasil não estão, contudo, nos investimentos, mas na área de recursos humanos formados e alocados no seu sistema de CT&I. Na China, o pessoal em atividades relacionadas à P&D é quinze vezes o contingente equivalente do Brasil. As matrículas em cursos de pós-graduação nas áreas de ciência, tecnologia e engenharia são doze vezes maiores. Esses números são significativos, pois a população chinesa é “apenas” sete vezes maior que a brasileira. Em que pese os indicadores de escolaridade geral do Brasil serem até melhores que os da China, o viés da formação superior do sistema brasileiro, em que é muito baixo o percentual de egressos em cursos de engenharia, afeta negativamente a disponibilidade de recursos humanos no Brasil e salienta uma diferença importante entre os países, especialmente quando se trata do tema inovação.
- Outra diferença que chama atenção é a performance da balança comercial chinesa em bens de alta intensidade tecnológica. Cerca de 31% da pauta de exportação de manufaturados chinesas está associado a esse tipo de produto, contra apenas 11% no Brasil. Em termos absolutos, a China apresenta um saldo positivo na balança comercial de manufaturas de alta tecnologia (US$ 113 bilhões quando se excluí a indústria química e US$ 67 bilhões quando se inclui o conjunto da química), enquanto o Brasil apresenta déficits (US$ 18 bilhões sem a química e US$ 31 bilhões com a inclusão do conjunto da indústria química). (Os bens considerados de alta tecnologia, na classificação adotada pela OECD, são: informática e equipamento de telecomunicações; instrumentos médicos e ótica; aeronáutica e a indústria farmacêutica, que é parte da química. A química não farmacêutica é considera de média alta tecnologia nesta classificação).
- Uma última grande diferença entre os dois sistemas está relacionada ao papel desempenhado pelo setor privado em cada país. Na China os gastos em P&D são hoje preponderantemente de responsabilidade das empresas, na medida em que representam três quartos do dispêndio nacional em P&D (74%), contra um percentual de gasto privado no Brasil da ordem de 50%. Com isso, o dispêndio privado em P&D da China já é mais de dez vezes o equivalente no Brasil, embora, como se ponderará mais à frente, deve-se ter em mente que as empresas estatais têm um papel muito relevante na economia chinesa e bem menor no Brasil.

O Desenho dos Sistemas Nacionais
de C, T & I no Brasil e na China. Em
termos formais, os sistemas nacionais de C&TI
da China e do Brasil se assemelham, ambos
contam com um Ministério específico
(MOST na China e o MCT no Brasil), com instâncias
superiores de coordenação e
um conjunto de atores descentralizados (Universidades,
Institutos de Pesquisa e Empresas).
Contudo, essa similaridade formal encobre
o fato de que, na China, há um grau
muito maior de centralização
das decisões e um peso mais acentuado
do Grupo de Coordenação Nacional
de C&T e Educação, por meio
do qual são concebidos e acompanhados
os grandes planos para CT&I.
A sistemática chinesa de formulação
e implementação de planos quinqüenais
confere ao seu planejamento, quer em termos
gerais ou setoriais, uma eficácia muito
maior. Em primeiro lugar, porque a cultura
de planejamento de longo prazo já está
estabelecida e é uma rotina para todos
os órgãos de governo. Em segundo
lugar, porque há continuidade nas ações
e os novos planos dão sequência
aos anteriores, sem as rupturas que comumente
ocorrem no Brasil. Em terceiro lugar, porque
a implementação dos programas
é favorecida pelo grau de comando e
controle que o Estado chinês possui
sobre muitos dos atores envolvidos, que em
grande parte depende diretamente do governo
(empresas estatais, institutos federais de
pesquisa, etc.) ou estão sujeitos a
regras bem mais rígidas, inclusive
no que tange ao IDE.
Os diversos programas implementados nos últimos
anos pela China são exemplos deste
intento de planejar e implementar ações
de longo prazo – Programa Nacional de
P&D em Tecnologias-chave (1982); Programa
Nacional de P&D High-tech – Programa
863 (1986); Programa Nacional de Pesquisa
Básica – Programa 973 (1997);
Spark (1986); Torch (1988); Programa Nacional
de Infra-estrutura de Ciência e Tecnologia
(2001); Ambiente para as Indústrias
de Base Tecnológica (2001) e o Programa
Nacional de Médio e Longo Prazo para
Desenvolvimento da Ciência e da Tecnologia
(2006). Veja-se IEDI, "A Transformação
da China em Economia Orientada à Inovação",
2011. Não se dispõe de uma avaliação
consistente da eficácia dessas ações,
mas a recorrente avaliação positiva
de alguns desses programas parece indicar
que ao menos parcialmente eles têm tido
sucesso em contribuir para a transformação
da economia chinesa. Ademais, o crescimento
a taxas muito elevadas sempre exerce um efeito
favorável ao planejamento de longo
prazo, pois a demanda acelerada por recursos
humanos e financeiros, associada a orçamentos
públicos e privados também crescentes,
abre amplas margens de manobra para ajustes
e reprogramações.
Para além do planejamento de longo
prazo, também merece destaque, dentre
essas peculiaridades da economia chinesa,
o peso de seu segmento estatal. Segundo o
Censo Econômico de 2008, 30% do total
dos ativos empresariais e quase 50% dos ativos
no setor industrial eram, em 2008, de propriedade
de empresas estatais (State-Owned Enterprises
– SOEs). Embora o número dessas
empresas não seja expressivo para as
dimensões da China (154 mil empresas
estatais ao fim de 2008 ou pouco mais de 3%
do total de empresas chinesas), as grandes
empresas públicas controlam parte significativa
do investimento e das decisões econômicas,
entre elas as relativas ao gasto em P&D.
O núcleo duro desse conjunto de empresas,
coordenadas pelo State-Owned Assets Supervision
and Administration Commission of the State
Council (SASAC) é ainda bem menor,
mas detém extraordinário poder
econômico. O SASAC controla diretamente
as chamadas "empresas centrais",
pouco mais de cento e trinta empresas de enorme
porte, selecionadas para estarem entre as
maiores e mais importantes em termos globais.
Elas atuam em áreas consideradas de
segurança nacional (indústrias
estratégicas ou chaves), como energia,
defesa, telecomunicações, construção
naval e aviação; e em indústrias
consideradas básicas para a estratégia
chinesa de desenvolvimento, como maquinas
e equipamentos, automotiva, tecnologias da
informação, siderurgia, química,
pesquisa e desenvolvimento. Apesar de poucas,
elas possuem milhares de subsidiárias,
em campos os mais diversos – um exemplo
do que representam estas empresas, em termos
do esforço tecnológico da China,
está no fato de empregarem cerca de
cinco milhões de engenheiros, número
que não tem crescido nos últimos
anos, mas que é expressivo em si mesmo.
Mas, para além do planejamento e do
controle estatal da economia, talvez entre
as maiores diferenças entre a China
e o Brasil, no que toca às políticas
nacionais de CT&I, está o grau
de importância que o Estado chinês
dá às questões de ciência,
tecnologia e educação, compreendidas
como parte indissociável da estratégia
chinesa de desenvolvimento. Duas dimensões
são marcantes: a enorme ênfase
do esforço educacional na China, comparativamente
ao Brasil; e o fato da agenda de CT&I
ser entendida como parte de sua agenda econômica,
com um foco cada vez mais direcionado às
empresas.
Por fim, cabe reafirmar que, hoje, a trajetória
chinesa se beneficia do tamanho e do ritmo
de crescimento de sua economia. Mas é
preciso salientar que essa estratégia
também foi condicionada, no passado
e mesmo nos tempos atuais, pelo aprendizado,
e também pela enorme pressão,
que as políticas industriais e tecnológicas
dos demais países asiáticos
colocaram sobre a própria China. Nesse
sentido, as trajetórias do Japão
e da Coréia são uma fonte de
inspiração e de desafio ao Estado
chinês.

As Estratégias Governamentais
de C, T &I no Brasil e na China. Desde
o início da década de 1980,
o Governo chinês vem elaborando programas
nacionais de ciência e tecnologia (C&T)
que têm sido executados ao longo de
sucessivos planos qüinqüenais (IEDI,
2011). As áreas prioritárias,
objetivos e metas desses programas foram sendo
revistos e reorientados às diretrizes
e aos objetivos estratégicos do plano
em vigor. Chama a atenção o
fato de esses programas serem muitas vezes
implementados ao longo de dois, três
ou quatro planos quinquenais.
Apesar da importância dos programas
iniciados ainda nos anos oitenta, os fatos
mais marcantes da nova estratégia chinesa
vieram com o 11º Plano Quinquenal (2006-2010),
quando a China mudou o foco de sua estratégia
de crescimento, priorizando atividades orientadas
à inovação tecnológica
no lugar da indústria e agricultura
tradicionais. O Programa Nacional de Médio
e Longo Prazo para Desenvolvimento da Ciência
e da Tecnologia (MLP), de 2006, cujo horizonte
vai até o ano de 2020, é o grande
instrumento dessa mudança, com ênfase
na inovação nativa, no salto
tecnológico em áreas prioritárias
e já com ambição de alcançar
um protagonismo global. É marcante
que a coordenação destas ações
tenha envolvido diretamente o gabinete do
primeiro ministro. (Veja-se IEDI, 2011)
Mais recentemente, com o novo plano quinquenal
chinês (2011-2015), a ênfase dada
a essa dimensão da estratégia
chinesa foi reforçada. Esse novo plano
quinquenal faz a emblemática proposta
de passar do 'made in China' para
o 'design in China'. A China já
é o principal exportador de produtos
manufaturados do mundo e também é
o segundo fabricante de bens de alta tecnologia
do mundo. Contudo, apesar de os gastos em
P&D da indústria de alta tecnologia
terem triplicado entre 2003 e 2008, o diagnóstico
desse novo plano quinquenal é que o
País ainda apresenta um atraso quando
se trata dos esforços de P&D das
empresas desses setores. Sua meta é,
portanto, deixar de ser uma plataforma de
exportação de grandes empresas
multinacionais estrangeiras – e também
das empresas nacionais – para dar um
salto qualitativo, passando da imitação
para a inovação, buscando a
liderança mundial apoiada na inovação.
Essa estratégia guarda uma distância
grande em relação às
estratégias do Brasil. Não há
por parte dos planos brasileiros setores ou
tecnologias selecionadas que ambicionem liderança
global. Mais saliente ainda é que as
políticas de inovação
brasileiras, que ganharam importância
nos últimos dez anos, estão
muito concentradas na reforma dos instrumentos,
mas dão pouca importância aos
aspectos estratégicos e aos objetivos
econômicos decorrentes dessas ações.
De outro lado, as políticas brasileiras
são mais fontes de estímulo
ou indutoras de mudanças de conduta
dos atores do que mandatórias, como
ocorre na China. Comparativamente à
estratégia chinesa, pode se indicar
que, no Brasil, prevalecem alguns aspectos
problemáticos das políticas,
a exemplo de:
- O Brasil tem tradição de formulação de planos nacionais para CT&I desde os anos 1970, com os chamados Planos Básicos de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, PBDCTs, e depois no período de criação do MCT, nos anos 1980. Mas, essa tradição só foi recuperada recentemente, a partir da criação de novos instrumentos de fomento e de financiamento, e de políticas industriais e tecnológicas um pouco mais ativas.
- Os planos e políticas nacionais recentes (PACTI, PITCE, PDP, Plano Brasil Maior) dão grande ênfase à inovação, mas são frágeis em termos de opções estratégicas. Temos uma dificuldade intrínseca de escolher prioridades ou de implantar ações setoriais de grande fôlego, que estejam articuladas às estratégias do setor privado, talvez com a única exceção do setor de petróleo e gás, em razão da capacidade de planejamento e de implementação de ações da Petrobrás.
- A capacidade dos planos de CT&I do Brasil de coordenar, articular interesses e de alterar, de fato, a conduta dos diversos atores é pequena, comparativamente ao caso chinês. Para além das diferenças entre a ossatura do Estado chinês e brasileiro e do peso das empresas estatais e da capacidade de alinhamento de interesses, há também diferenças marcantes de desenho e governança. Aqui, o Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia é uma instância frágil, mais voltada a abrigar e contemplar 'stakeholders' convencionais do sistema de C&T do que formular planos estratégicos nacionais de longo prazo. É marcante o fato de que o CCT brasileiro mal disponha de equipe ou recursos capazes de formular e acompanhar de fato os planos nacionais, enquanto o processo de elaboração dos planos mais relevantes da China conte com numerosos grupos de trabalho e um staff técnico não apenas qualificado, mas igualmente numeroso.
- Outra grande diferença entre a estratégia chinesa e brasileira é a precária articulação entre a estratégia do Brasil em CT&I e a agenda econômica nacional. Em parte, isso se explica pela origem do MCT brasileiro, criado quando da redemocratização do País, mais em função do contexto político do que de uma opção de estratégia de desenvolvimento. A precária articulação do MCT com a agenda econômica salienta sua característica de lócus de interlocução com a comunidade científica vis-à-vis ao seu papel de articulação com setores centrais de governo, como o Ministério de Desenvolvimento e o Ministério da Fazenda. Esse não é caso chinês, muito mais inspirado no sucesso das estratégias asiáticas e nos “modelos” japonês e coreano de políticas tecnológicas.
China e Brasil: A Base do Sistema Educacional. Brasil
e China têm sistemas educacionais ainda
precários vis-à-vis os países
já desenvolvidos. Apesar da universalização
do sistema educacional básico, a escolaridade
é baixa, tanto no ensino secundário,
quanto no ensino superior. O positivo é
que, em ambos os casos, as taxas de escolaridade
têm crescido a ritmos acelerados.
A taxa de escolaridade bruta do ensino médio
passou, no caso da China de 39% para 62% entre
1.999 e 2.008. No mesmo período, a
mesma taxa de escolaridade bruta do ensino
médio passou de 78% para 92% no Brasil
– utilizaram-se taxas brutas de escolaridade
para efetuar esta comparação
em razão de não se dispor das
taxas líquidas de escolaridade da China;
para o Brasil, o percentual de jovens de 15
a 17 anos que freqüentavam o ensino médio,
em 2009, era de 50,9%, segundo a PNAD/IBGE.
No ensino superior, a taxa de escolaridade
bruta da China passou, no mesmo período,
de 6,5% para 22,7%, enquanto no Brasil passou
de 13,3% para 34,4%.
O crescimento da escolaridade nos dois países
tem sido notável. No nível superior,
a escolaridade (matrículas) cresceu,
durante a década passada, a taxas superiores
a 22% na China e próximas a 11% ao
ano no Brasil. Evidentemente, ambos os sistemas
têm ainda problemas de qualidade, tanto
no nível superior, quanto em outros
níveis de ensino, embora nesse campo
os progressos recentes da China sejam significativos.
Apesar das similaridades existentes entre
os dois países, algumas diferenças
chamam a atenção. Primeiro,
como já foi dito sobre a China, a diferença
de escala. A performance chinesa de ampliação
do ensino superior absorveu, em dez anos,
cerca de novos 20 milhões de alunos.
No Brasil, com um desempenho também
expressivo, esse aumento da escolaridade implicou
novos 3,8 milhões de alunos. No ensino
médio, o crescimento absorveu outros
20 milhões de estudantes na China,
com um acréscimo absoluto pequeno no
caso do Brasil – depois de ter-se expandido
no início da década, as matrículas
no ensino médio regular no Brasil tem
se mantido no mesmo patamar de 8,5 milhões
de alunos, nos últimos anos. O crescimento
de matrículas tem ocorrido exclusivamente
no ensino profissional.
Uma segunda diferença diz respeito
aos progressos de cada país em termos
de qualidade. Uma proxi da posição
relativa da China e do Brasil, em termos da
evolução recente da qualidade
do ensino médio, é seu desempenho
no PISA (Programme for International Student
Assessment). Em que pese as limitações
desse tipo de exame em países continentais
como Brasil e China, as diferenças
neste caso são marcantes, porque a
China (Xangai) se situou no ranking do PISA
na primeira posição, em 2009,
enquanto a posição brasileira
(que melhorou em relação ao
exame anterior) foi apenas a 54ª ou a
58ª, dependendo do quesito avaliado.
No ensino superior, a literatura especializa
tem chamado atenção para uma
suposta baixa qualidade dos recursos humanos
das áreas de ciência e tecnologia
na China, comparativamente a outros países
desenvolvidos. Mesmo assim, a aferir pelo
crescente número de universidades chinesas
que se posicionam entre as melhores do mundo,
nos diversos rankings disponíveis,
o esforço de constituir universidades
de classe mundial tem tido resultados positivos
– entre 10 a 20 universidades chinesas
tem se posicionado entre as quatrocentas melhores
do mundo, nos rankings internacionais e entre
2 a 5 universidades brasileiras freqüentam
estes mesmos rankings (QS, Time, Academic
Ranking of World Universities, etc.); o resultado
da China é conseqüência
de políticas explícitas - como
o Projeto 985, voltado a criar de 10 a 12
universidades de classe mundial.
Em termos da disponibilidade de recursos humanos
para inovação, o número
que chama a atenção é
o de egressos no ensino superior. Entre 1998
e 2008, o número absoluto de estudantes
matriculados no ensino superior aumentou consideravelmente
nos dois países nesse mesmo período:
multiplicou-se por quase 3 no Brasil e por
4,5 no caso da China. A diferença de
escala da China novamente chama a atenção,
pois esse percentual baixo de escolaridade
superior representava, em 2008, um contingente
de mais de 26 milhões de alunos. Aqui
o que se evidencia da China não é
apenas o quantitativo, mas a efetiva disponibilidade
de recursos qualificados nas áreas
de ciência e engenharia.
A grande diferença entre os sistemas
de ensino superior dos dois países
está exatamente no perfil dos egressos:
na China, 5,0% desses egressos se formam na
área de ciências e 36,1% em engenharia
(formação integral e de três
anos). No Brasil os percentuais equivalentes
são de 7,8% e 6,7%, respectivamente.
Em termos absolutos as diferenças são
marcantes. Os egressos em ciências e
engenharia na China, em 2009, eram mais de
1 milhão de jovens em cursos de formação
plena e outros 1,1 milhão em cursos
de tecnólogos (três anos), enquanto
no Brasil os egressos nas áreas de
ciência e engenharia eram de aproximadamente
120 mil jovens, incluindo a formação
plena e tecnólogos.
Essas diferenças relativas entre perfis
existem tanto para os egressos do ensino superior
quanto para a pós-graduação.
Aproximadamente 35% dos mestres e 36% dos
doutores formados na China são engenheiros.
No Brasil esses percentuais são de
13% e 11%. Curiosamente, a disponibilidade
relativa (em relação à
população) de cientistas é
(ou ao menos era, cabe ressalvar, em 2009)
maior no Brasil que na China, bem como há
mais ênfase nessa formação
na graduação e na pós-graduação.
Em certo sentido, isso reflete as influências
e “características” mais
ocidentais de nosso perfil de formação
superior, comparativamente ao perfil asiático
e “soviético” do caso chinês.
A ressalva feita no parágrafo anterior
é importante para entender a China:
a China está mudando em termos da formação
de recursos humanos. Estimativas referentes
ao número per capita de engenheiros
formados entre 2001 e 2009 mostram que aproximadamente
60% dos profissionais formados na China são
tecnólogos (3 anos) e 40% tem formação
plena. No Brasil esses números se invertem:
70% tem formação plena e 30%
são tecnólogos. No começo
da década, a disponibilidade de profissionais,
relativa à população
era o dobro na China. Passados apenas oito
anos, as diferenças se ampliaram enormemente:
em 2009 já era cinco vezes maior que
o número per capita do Brasil. Evidentemente,
em termos absolutos essas diferenças
são gritantes: os quase 2 milhões
de profissionais formados são cerca
de 35 vezes o número de egressos do
Brasil, ainda que subsistam problemas de qualidade
com esta mão-de-obra, tanto na China,
quanto no Brasil.
Apesar desse forte crescimento na formação
de recursos humanos, em 2010, o Conselho de
Estado do governo chinês lançou,
para fazer frente aos seus novos desafios,
um novo plano para a formação
de recursos humanos qualificados – Plano
de Médio e Longo Prazo de Desenvolvimento
de Talentos (2010-2020); veja-se IEDI, 2011
e OECD, Science, Technology and Industrial
Outlook, 2010. Entre os objetivos, está
elevar o número de pesquisadores a
3,8 milhões em 2020, com 40 mil cientistas
de altíssima qualificação
nas áreas-chave de inovação.
Em termos per capita, a meta é elevar
o número de pesquisadores para 43 por
mil habitantes até 2020 (ante 25 por
mil em 2008), bem como aumentar a escolaridade
bruta superior de 24% para 40% em dez anos.




China e Brasil: Propriedade Intelectual.
Um dos fatos que mais tem chamado
atenção sobre o desempenho tecnológico
da economia chinesa é o crescente número
de patentes depositas nos escritórios
internacionais e, também, no escritório
de patentes da China, o SIPO – State
Intellectual Property Office. O número
de patentes internacionais (depositadas ou
concedidas) por instituições
e empresas chinesas tem crescido de forma
exponencial a partir de 2001-2002, acerca
de patentes concedidas pelo USPTO ou solicitadas
via Tratado de Cooperação de
Patentes (PCT). Em parte, isso reflete a ênfase
das políticas tecnológicas na
comercialização da ciência
e na inovação. De outro lado,
é reflexo do posicionamento global
das empresas chinesas, algumas das quais passaram
a frequentar o seleto clube dos maiores solicitantes
mundiais de patentes, como a ZTE e a Huawei.
O início desse boom coincide com a
revisão da legislação
patentária chinesa, feita em 2001,
no contexto da adesão da China à
OMC. Essa trajetória foi reforçada
com as políticas adotadas a partir
de 2006, com o Programa Nacional de Médio
e Longo Prazo para Desenvolvimento da Ciência
e da Tecnologia e o novo plano quinquenal,
que enfatizavam a criação de
empresas e a comercialização
de tecnologias pelos institutos de pesquisa
e universidades. Esses estímulos levaram
as universidades e os institutos a ampliarem
significativamente o registro e o licenciamento
de sua propriedade intelectual, mas as estatísticas
revelam que esse é um esforço
liderado pelo setor privado, que responde
por cerca de 80% dos depósitos de patentes.
O que é notável no exemplo da
China é a consistência dos resultados
alcançados, vis-à-vis as metas
colocadas pelas políticas públicas.
E mais notável é a ambição
da política chinesa de inovação
e de propriedade intelectual. Em 2008, o Conselho
de Estado lançou uma Estratégia
Nacional de Propriedade Intelectual, que visava
reforçar o compromisso e a determinação
da China com a criação, proteção,
utilização e gerenciamento dos
direitos de propriedade intelectual (OCDE,
2011, apud IEDI, 2011). No contexto da crise
internacional, estas ações foram
reforçadas por meio de fundos para
apoiar o registro internacional de patentes
de empresas e universidades chinesas.
Em 2010, a estratégia chinesa de propriedade
intelectual foi formalizada, com objetivos
e metas extraordinariamente ambiciosas para
o ano de 2015, como: ampliar a capacidade
de criar patentes, para alcançar 2
milhões de patentes (invenção,
design e modelo de utilidade) em cinco anos,
o dobro dos números de 2010; estar
entre os dois principais países em
termos de patentes registradas internamente
ao país; igualmente, dobrar o número
de patentes internacionais originadas na China;
aprimorar a eficiência e a qualidade
dos exames de patentes, tendo como meta um
tempo médio de 22 meses para o exame
de patentes de invenção e 3
meses para modelo de utilidade e design; ampliar
o corpo técnico do SIPO para 9 mil
examinadores (50% a mais do que possui hoje
o USPTO).
Um reflexo dessa enorme ênfase chinesa
na propriedade intelectual, comparativamente
ao Brasil, pode-se ser observada por meio
de algumas estimativas, que comparam os dados
de solicitações de patentes
no escritório dos dois países
para 2010 (privilégios de invenção
e modelos de utilidade) e que apresentam uma
série histórica da evolução
de patentes de privilégio de invenção,
discriminando as patentes de residentes e
não residentes.
É visível o forte crescimento
das patentes de privilégio de invenção
na China, comparativamente ao Brasil. Ambas
crescem a partir das mudanças realizadas
em cada país na legislação
patentária, mas a performance chinesa
se destaca pelo contínuo crescimento.
E se destaca, porque, diferentemente do Brasil,
as patentes de residentes são hoje
cerca de ¾ do total, enquanto no Brasil
este percentual não chega a 20%.
Outro fato que chama a atenção
nesses dados é que ambas as legislações
possibilitam utilizar modelos de utilidade
como uma forma de proteção da
propriedade intelectual. Essa forma de proteção
tende a ser mais utilizada por pequenas e
médias empresas domésticas,
em geral associadas a aperfeiçoamentos
ou melhoramentos em máquinas e equipamentos,
em questões de uso prático suscetível
de aplicação industrial. São
em geral processos que não exigem a
satisfação de requisitos complexos
para o reconhecimento dos direitos associados,
tendo como contrapartida prazos menores ou
condições mais restritas de
proteção. Modelos de Utilidade
são raramente utilizados por grandes
empresas estrangeiras. Vale também
dizer que a proteção a modelos
de utilidade é muito mais marcante
na China que no Brasil, o que denota um viés
local que favorece pequenas empresas industriais.



Desempenho da Indústria
e das Exportações de Alta Tecnologia.
Para entender perfeitamente
o que explica o desempenho da China nos anos
recentes é preciso se deter minimamente
sobre o perfil de seu sistema produtivo. Isto
porque a performance de inovação
da China é indissociável de
sua consolidação como um dos
líderes na produção industrial
mundial. Ao longo da década passada,
o peso da China no valor agregado da manufatura
(MVA) mundial saltou de 6,7% em 2000 para
15,6% em 2009 (UNIDO, apud IEDI, 2011). Nesta
década, a China passou a liderar o
mercado mundial em alguns segmentos da indústria,
como máquinas e equipamentos elétricos
e na química, e se posicionou como
um dos principais produtores em quase todos
os demais segmentos industriais. No mesmo
período, a participação
brasileira no MVA manteve-se em 1,7%.
O desempenho da China não se restringiu
apenas aos setores de média ou baixa
intensidade tecnológica. Ao contrário,
progressivamente a China ampliou sua fatia
dos chamados bens de alta intensidade tecnológica
(informática, equipamento de telecomunicações,
instrumentos médicos e ótica;
aeronáutica e a indústria farmacêutica).
Nesses segmentos, até meados da década
de noventa, Brasil e China detinham cerca
de 2% do valor agregado mundial. A partir
de então a China ampliou sua fatia
no mercado internacional de bens de alta intensidade
tecnológica para cerca de 14% em 2007,
enquanto o Brasil reduziu ligeiramente sua
participação. Só a menos
de dez anos a China, de fato, começou
a se diferenciar como produtor de bens de
maior intensidade tecnológica, embora
a velocidade com que isto vem acontecendo
impressione, tendo ultrapassado o Japão
e ficado apenas atrás dos Estados Unidos,
que responde por 1/3 deste mercado.
Essa mudança na estrutura industrial
da China, em direção a segmentos
de maior intensidade tecnológica, também
se reflete nas exportações do
país. Hoje, as exportações
de produtos classificados como de alta tecnologia
respondem por quase um terço da pauta
de exportações de manufaturados.
É impressionante, neste aspecto, acompanhar
a reversão do fluxo de comércio
desses tipos de bens: só a partir de
2002 a China passa a apresentar superávit
nesses bens. Mas, em 2008 esse superávit
já era de mais de US$ 120 bilhões.
Em contraposição ao caso chinês,
o Brasil ampliou seu déficit neste
tipo de bens, notadamente nos anos recentes.
O desempenho superavitário da China
está fortemente baseado na sua indústria
de equipamento de informática e de
telecomunicações. A China continua
tendo grandes déficits nos segmentos
de aeronáutica, ótica e equipamentos
médicos e um pequeno déficit
na indústria farmacêutica. O
Brasil diferentemente da China, tem superávit
exclusivamente no segmento aeronáutico,
mas esse superávit é incapaz
de reverter o sinal negativo do saldo comercial
dos bens mais intensivos em tecnologia.



Estrutura, Intensidade e Peso
Industrial da China e do Brasil: Impactos
Sobre o Gasto em P&D. Para
compreender o desempenho recente da China
na área de inovação e
poder melhor compará-lo com o Brasil
é necessário examinar com maior
detalhe o esforço tecnológico
da indústria chinesa e seus determinantes.
A questão relevante é se perguntar
como foi possível à China realizar,
em tão pouco tempo, um processo de
mudança de sua estrutura produtiva
em direção a setores intensivos
em tecnologia, podendo assim tirar proveito
da demanda internacional e reverter seu déficit
comercial nestes setores. E se, de fato, essa
é a diferença essencial entre
a China e o Brasil.
É possível obsevar, para 2008,
ano em que se dispõe de informações
mais detalhadas para as atividades de inovação
industrial em ambos os países, alguns
grandes números acerca do esforço
em P&D da China e do Brasil que permitem
desenhar um quadro geral, antes que nos debrucemos
sobre a estrutura industrial e a intensidade
tecnológica da manufatura nos dois
casos. Como já se mencionou, nesta
data, o gasto em P&D global da China era,
em relação ao PIB, 1,4 vezes
o gasto do Brasil. Mas, ao mesmo tempo, o
gasto do setor privado já era 2,1 vezes
o gasto privado no Brasil e o gasto em P&D
da indústria manufatureira chinesa
era 2,6 vezes maior que o mesmo tipo de gasto
no Brasil. Ou seja, proporcionalmente falando,
as diferenças em termos de P&D
eram muito maiores entre a indústria
da China e do Brasil, do que seria de esperar
do esforço global, público e
privado, em P&D dos dois países.
Essas informações, acrescidas
do desempenho muito favorável das exportações
chinesas de bens de alta tecnologia, parecem
sugerir que a China evoluiu, muito mais rapidamente
que o Brasil, em direção a um
grande esforço tecnológico no
setor industrial. Sem dúvida, esse
fato é parte da realidade que auxilia
a explicar a trajetória chinesa. Mas,
há uma informação que
sugere cautela nesta conclusão: o valor
adicionado pela indústria era duas
vezes maior na China que no Brasil, medido
em relação ao PIB. Ou seja,
parte da diferença se deve ao maior
tamanho relativo da indústria.
Para poder ter conclusões é
preciso examinar o efetivo esforço
tecnológico de cada setor da indústria
da China comparativamente ao Brasil. O Segundo
Censo Econômico da China e a PINTEC
do Brasil nos dão uma medida aproximada
disso, para o ano de 2008, em função
de avaliarem os gastos em P&D em relação
à receita de vendas de cada setor –
o conceito de receita adotado em cada caso
é diferente, mas os dados brutos foram
ajustados, de forma a que os resultados de
intensidade tecnológica fossem compatíveis.
De fato, em 2008, a indústria da China
já era mais intensiva em P&D. Na
média, o gasto em P&D foi neste
ano 30% superior ao realizado no Brasil. É
possível, compreendendo o que ocorre
na China, estimar que esta diferença
esteja se ampliando, ano a ano.
Mas, curiosamente, essa não é
uma diferença tão marcante como
seria de se esperar. Por exemplo, se essa
comparação é feita com
países mais desenvolvidos, as diferenças
são muitos maiores. A intensidade do
esforço tecnológico da Alemanha,
da Coréia e dos Estados Unidos, medidas
pelo gasto em P&D em relação
ao valor adicionado na indústria, eram
em 2005, comparativamente ao Brasil, aproximadamente
5, 6 ou até 7 vezes maiores, nessa
ordem. A diferença com a China, nesse
sentido, não é tão grande,
embora cresça a um ritmo muito acelerado
– a tomar pelos dados do gasto em P&D
em 2010, de forma aproximada, depois de 2008,
o gasto privado tem crescido em média
20% ao ano e o PIB 10% ao ano; com isso, pode-se
estimar que a intensidade do gasto privado
em P&D e relação à
receita da indústria tenha crescido
quase 20% nestes dois anos. Veja-se: National
Bureau of Statistics, Communiqué on
National Expenditures on Science and Technology
in 2010, September, 2011.
Em alguns setores, a intensidade do gasto
em P&D do Brasil chegava a ser superior
à da China, notadamente na indústria
de petróleo, gás e biocombustíveis;
mas também havia um diferencial a favor
da indústria brasileira nos segmentos
de material de transporte, fumo, e indústrias
diversas. Diferenciais maiores em favor da
indústria chinesa se notavam nos setores
de: bebidas, têxteis, produtos de minerais
não metálicos, siderurgia, metalurgia
de metais não ferrosos e fundição
e em máquinas e equipamentos. Curiosamente,
nos segmentos identificados como indústria
de alta tecnologia, a saber informática,
equipamento de telecomunicações,
instrumentos médicos e ótica;
aeronáutica e farmacêutica, as
diferenças não eram relevantes,
ou por vezes eram favoráveis ao Brasil,
como no segmento aeronáutico.
Uma forma de se examinar essas diferenças
é comparar o que chamamos aqui de efeitos
estrutura, intensidade e peso. Ou seja, o
que seria o esforço em P&D do Brasil
se o país tivesse a estrutura industrial
da China (com a mesma intensidade e peso que
existem no Brasil); qual seria o esforço
em P&D do Brasil se o país tivesse
a mesma intensidade da China (mas com mesmo
peso e estrutura do Brasil) e, por fim, qual
seria o gasto em P&D se a indústria
brasileira tivesse o mesmo tamanho relativo
ao PIB da indústria chinesa (mas com
a intensidade e gasto e a estrutura da indústria
brasileira).
Nesse exercício, percebe-se que os
efeitos estrutura e intensidade pesam pouco:
o gasto em P&D da indústria de
transformação brasileira é
hoje equivalente a 0,37% do PIB do Brasil;
se gastasse com a mesma intensidade (setor
a setor) da China, esse percentual subiria
para 0,43% do PIB; o efeito estrutura teria
uma contribuição negativa (dada
a intensidade do gasto do Brasil, setor a
setor, se nossa estrutura fosse equivalente
à da China, o gasto total seria menor).
Combinados, intensidade e estrutura, o gasto
em P&D passaria de 0,37% do PIB para 0,40%.
A diferença relevante entre "a
China de 2008" e o Brasil na mesma data
era de fato o peso da indústria no
PIB. Se a indústria brasileira tivesse
o mesmo peso da indústria chinesa,
com a mesma intensidade do gasto que já
fazemos e com a mesma estrutura que temos,
o gasto em P&D da indústria seria
de 0,73% do PIB, quase duas vezes maior do
que é hoje.
Esse resultado é interessante, porque
mostra que um grande diferencial da China
para com o Brasil é a relevância
de sua indústria para a estratégia
nacional de catching-up. Não
que não existam outras diferenças,
mas, em termos do esforço em P&D,
¾ da diferença relativa que
existe entre os dois países se explica
pelo peso relativo da indústria. E,
como foi dito, é notável que,
em 2008, na indústria considerada de
maior intensidade tecnológica, as diferenças
fossem ainda pequenas, em termos de P&D.
Pode-se dizer que a China tinha, até
muito recentemente, uma indústria relativamente
não muito diferente do Brasil, em termos
de inovação e esforço
interno de P&D. Seus diferenciais eram
mais de custos muito mais baixos (custos de
produção, em especial carga
tributária, salários e logística,
mas também custo de capital), escala
muito maior e uma taxa de câmbio altamente
favorável.
Mas, o retrato que se faz da China aqui mostra
que ela deve ser vista sempre como uma economia
em forte velocidade de mudança. Sua
indústria hoje não apenas é
quase dez vezes maior que a brasileira, quando
medimos o valor adicionado em termos de paridade
do poder de compra, mas caminha celeremente
para ser cada vez mais inovadora e tecnologicamente
avançada. E caminha porque a economia
chinesa cresce a taxas elevadas e porque encontra
um ambiente favorável a isso, em termos
de um conjunto de políticas muito agressivas
de suporte a esta trajetória.



|