Análise IEDI
Crédito direcionado: Uma pedra no caminho da recuperação
Se a economia brasileira vem apresentando sinais de reativação, mesmo sem muita vitalidade e de modo descontínuo, é, em boa medida, graças a certa normalização do quadro do crédito no país desde o ano passado. Primeiro voltaram a fluir as concessões às famílias e mais recentemente àquelas às empresas. Em abril de 2018, a alta das concessões às pessoas físicas foi de 19,1% ante abr/17 e daquelas às pessoas jurídicas, de 26,5%, já descontada a inflação medida pelo IPCA. Com isso, o total das concessões subiu 22,3%.
O acentuado declínio da taxa básica de juros (Selic) entre outubro de 2016 e maio de 2018 – quando este movimento foi interrompido pelo Banco Central – vem contribuindo para a melhora das condições de financiamento da economia à medida que, embora parcialmente, foi sendo repassado aos juros pagos pelos tomadores finais. Tivessem as taxas dos empréstimos acompanhado mais de perto o recuo da Selic, certamente teríamos neste momento uma recuperação mais robusta.
Mas não foram apenas os juros ao tomador que deixaram a desejar. Outro fator a bloquear uma melhora adicional do quadro do crédito e, consequentemente, o ganho de velocidade da recuperação econômica tem sido a evolução do crédito direcionado, que geralmente atende a decisões de investir (em imóveis, em maquinário, etc). As concessões reais acumuladas de janeiro a abril de 2018 registraram queda de 5,8% na comparação interanual. Por isso, a melhora no quadro do crédito decorre apenas do crédito livre, cujas condições são livremente pactuadas entre credores e tomadores: alta de 14,7% em jan-abr/18.
Vale observar que as modalidades de crédito direcionado podem ser operadas por todos os bancos, mas são os bancos oficiais, como a Caixa Econômica Federal (sobretudo financiamento habitacional), o Banco do Brasil (crédito rural) e o BNDES (financiamento ao investimento, inovação, comércio exterior etc), que atuam mais intensamente neste segmento. Por isso, são um fator explicativo dessa evolução negativa as mudanças adotadas por estes agentes nas condições de prazo, juros e das exigências de garantias em suas linhas de crédito direcionado. No caso do BNDES, não há dúvidas de que nos últimos anos houve uma reviravolta importante, levando a uma rápida e expressiva elevação do nível de juros com que o banco opera.
Abaixo, as variações interanuais da média móvel trimestral das concessões reais mostram ainda outro ponto importante a ser mencionado: são notadamente as empresas quem mais tem sofrido com a repetida contração do crédito direcionado, dificultando a redução de seu endividamento e o resgate de alguns dos seus projetos de investimento.
• Concessões reais de crédito direcionado às empresas: -17,1% em fev/18; -13,4% em mar/18 e -15,0% em abr/18.
• Concessões reais de crédito direcionado às famílias: -11,5%; -2,9% e +1,6%, respectivamente;
• Concessões reais de crédito livre às empresas: +13,9%; +11,4% e +19,3%,
• Concessões reais de crédito livre às famílias: +13,8%; +11,6% e +12,8%, respectivamente.
Para as empresas, enquanto as concessões de crédito direcionado encolheram 15,1% no acumulado dos quatro primeiros meses de 2018 frente a igual período do ano anterior, as concessões do crédito livre caminharam na direção oposta, avançando 16,4%. Sintomático desta melhora no segmento livre foi o resultado, em abril, de uma importante modalidade de financiamento coorporativo, o crédito para capital de giro, que voltou ao positivo (+36,4% ante abr/17), depois de 36 meses consecutivos de contração.
Para as famílias, as modalidades do crédito direcionado (financiamento habitacional, principalmente) não têm ajudado tanto quanto aquelas do crédito livre, mas ao menos não têm prejudicado a melhora das suas condições de financiamento. No acumulado de janeiro a abril de 2018, houve variação de +1,6% nas concessões reais de crédito direcionado às famílias e de +13,5% no caso do crédito livre.
Fica claro, então, a partir dos dados divulgados hoje pelo Banco Central, que a melhora das condições de financiamento da economia implica destravar o crédito direcionado, cuja operação se concentra nos bancos oficiais. Esta é uma pedra no caminho da recuperação que precisa ser retirada para que o crescimento econômico, que foi decepcionante no primeiro trimestre de 20418, ganhe mais velocidade.
Os dados de crédito divulgados hoje pelo Banco Central mostram que o saldo das operações alcançou R$ 3.1 trilhões em abril, crescimento de 0,3% no mês e de 0,6% em comparação ao mesmo mês do ano anterior. A relação crédito/PIB foi de 46,5%.
A carteira de crédito com recursos livres ficou em R$ 1.601 bilhões, variação positiva de 0,6% em relação ao mês anterior e acréscimo de 4,9% quando comparado com abril de 2017. A parcela destas operações realizada junto a pessoas físicas foi de R$ 869,8 bilhões, crescimento de 7,8% quando comparado com o mês de abril de 2017 e crescimento de 0,8% quando em relação ao mês imediatamente anterior. Por sua vez, o valor das operações junto a pessoas jurídicas ficou em R$ 731,4 bilhões, apresentando aumento de 1,7%, também na comparação com o mesmo período de 2017, e crescimento de 0,4% em relação ao mês anterior.
O estoque de crédito com recursos direcionados ficou em R$ 1.489 bilhões para abril, em termos nominais, indicando retração de 3,6% frente ao mesmo mês do ano anterior e decréscimo de 0,1% quando comparado ao mês de março de 2018. O saldo referente a pessoas físicas foi de R$ 808,7 bilhões, apresentando aumento de 4,9% quando comparado ao mês de abril de 2017. O saldo relativo a pessoas jurídicas foi de R$ 680,4 bilhões, retração de 12,1%, sendo que somente o crédito rural apresentou crescimento.
Em abril, foram concedidos R$ 300,1 bilhões em novas operações de crédito, crescimento de 22,4% frente ao montante de R$ 245,2 bilhões observado em abril de 2017. Deste volume, R$ 275,2 bilhões foram originados de recursos livres e R$ 25,0 bilhões de recursos direcionados, o que representou, quando comparados aos mesmos meses do ano anterior, aumento de 25,3% para recursos livres e retração de 2,0% para recursos direcionados.
Dentre as concessões de crédito às pessoas físicas a partir de recursos livres, destacaram-se as operações de crédito rotativo (R$ 115,1 bilhões), cartão de crédito (R$ 87,1 bilhões), crédito não rotativo (R$ 37,2 bilhões), cheque especial (R$ 31,7 bilhões) e crédito pessoal (R$ 23,0 bilhões). Quanto as pessoas jurídicas, as principais modalidades foram desconto de duplicatas (R$ 23,6 bilhões), cheque especial (R$ 17,5 bilhões), conta garantida (R$ 16,8 bilhões) e capital de giro (R$ 15,0 bilhões).
Nas novas concessões de crédito realizadas com recursos direcionados destacaram-se, para pessoas físicas, as modalidades de financiamento imobiliário (R$ 6,9 bilhões), crédito rural (R$ 6,0 Bilhões), microcrédito (R$ 857 milhões) e BNDES (R$ 763 milhões). Já para as empresas, as principais modalidades foram Crédito Rural (R$ 5,7 bilhões) e BNDES (R$ 3,4 bilhões).
Setores. Considerando o saldo total de crédito do sistema financeiro nacional, por atividade econômica, a carteira de operações para a indústria atingiu R$ 664,4 bilhões, o que significa um decréscimo nominal de 9,7% frente a abril de 2017. O saldo do setor de serviços foi de R$ 707,4 bilhões, retração nominal de 0,4% em relação ao mês do ano anterior, variação negativa de 3,6% no comércio geral e aumento de 4,8% na administração pública. Por fim, o setor agropecuário apresentou crédito de R$ 21,5 bilhões, valor 3,2% menor, em termos nominais, do que o registrado no mês de abril de 2017.
Analisando a distribuição de crédito do sistema financeiro nacional, por controle de capital, temos que as instituições financeiras públicas contribuíram em R$ 1,6 trilhões, representando 53,4% do volume de crédito, as instituições financeiras privadas contribuíram com R$ 1,0 trilhão, representando 32,5% e as instituições financeiras estrangeiras contribuíram com R$ 434 bilhões, representando por sua vez 14,1% do crédito total no sistema financeiro.
Juros e Inadimplência. A taxa média de juros das contratações de abril situou-se em 25,9% a.a., o que representou reduções de 0,3 p.p. no mês e de 4,2 p.p. em 12 meses. Para esse resultado foram relevantes a redução no custo das operações com empresas, de 0,6 p.p. no mês, para 16% a.a., notadamente em capital de giro, -0,4 p.p. Nas concessões para pessoas físicas, a taxa de juros média declinou 0,2 p.p., para 32,8% a.a., com redução disseminada por diversas modalidades. Por fim a inadimplência média em abril registrou 3,3%, queda de 0,6 p.p comparado ao mês de abril de 2017 e estabilidade frente ao mês anterior.