IEDI na Imprensa - Especial: Levy assume BNDES menor, mas há quem defenda que banco possa diminuir ainda mais
O Estado de São Paulo
Vinicius Neder
A chegada de Joaquim Levy para presidir o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) encontrará a instituição de fomento em meio a um processo de mudança no planejamento estratégico, que reduziu seu tamanho a pouco menos da metade. A dúvida agora é se a redução vai parar onde está ou seguirá na direção de um banco ainda menor. A indicação de Levy, no entanto, é vista como uma vitória da ala mais liberal do governo de Jair Bolsonaro, o que pode significar força para a segunda opção.
Embora uma desaceleração no BNDES já tivesse começado em 2015, justamente quando Levy assumiu o Ministério da Fazenda, no segundo governo da ex-presidente Dilma Rousseff - no fim daquele ano, o banco devolveu R$ 15,8 bilhões ao Tesouro -, a guinada para valer foi iniciada no governo Michel Temer, a partir de maio de 2016.
A primeira encarregada da missão, a economista Maria Silvia Bastos Marques, assumiu a presidência de um BNDES que se colocava entre os maiores bancos de desenvolvimento do mundo, após receber R$ 416 bilhões em aportes do Tesouro Nacional ao longo dos governos do PT, de 2008 a 2014.
Aproveitando a baixa demanda por crédito para investimentos, Maria Silvia restringiu os empréstimos, elevou juros, mudou condições e, em acordo com o Ministério da Fazenda, ampliou as devoluções antecipadas da dívida com a União. De 2015 a 2018, o BNDES devolveu R$ 309 bilhões ao Tesouro.
Com isso, os desembolsos anuais tombaram. No auge, em 2010, atingiram R$ 278,3 bilhões, em valores atualizados de 2017, o equivalente a 4,3% do Produto Interno Bruto (PIB). No ano passado, ficaram em R$ 70,8 bilhões, ou 1,1% do PIB, a metade da média dos últimos 20 anos - 2,3%. "Não é hora de desidratar ainda mais o BNDES", disse Júlio Gomes de Almeida, diretor-executivo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI).
Para o economista, o nível de desembolsos do ano passado já deixa o BNDES "no osso", seria o mínimo para dar conta de financiar investimentos que fontes privadas, como a emissão de títulos no mercado financeiro, não dão conta. Continuar a redução poderia frear a economia, num contexto de alta na demanda por crédito para investimentos quando a recuperação econômica ganhar fôlego.
Em julho, o BNDES firmou com o Tesouro Nacional uma reestruturação da dívida com a União, antecipando o prazo final de 2060 para 2040. Com isso, o pagamento anual da dívida foi elevado e um cronograma, acertado. Após a renegociação, a diretoria do BNDES sinalizou que a capacidade de desembolsos anual ficaria em 1,2% do PIB, algo na casa de R$ 80 bilhões.
Só que a equipe econômica do presidente eleito, Jair Bolsonaro, discute ampliação ainda maior das devoluções anuais, uma estratégia para abater a dívida pública, objetivo já defendido pelo futuro ministro da Economia, Paulo Guedes. Quanto menos o BNDES desembolsa, mais pode devolver.
Assim como em outras áreas do futuro governo, o comando do BNDES era alvo de uma disputa entre o grupo formado por militares, com visão mais estatizante, e o grupo liderado por Guedes, com visão mais liberal. A indicação de Levy, doutor em economia pela Universidade Chicago, mais famoso centro do pensamento econômico liberal no mundo, seria uma vitória de Guedes.
Segundo uma fonte que acompanha as discussões da equipe de transição, ouvida no início do mês, para o grupo mais liberal, o BNDES poderia se dedicar apenas às privatizações. Vendidas as estatais e concedidos os principais projetos de infraestrutura em carteira, o banco ficaria sem função.
Professor do Departamento de Economia da PUC-Rio e diretor do BNDES na gestão de Maria Silvia, Vinicius Carrasco defende a segunda posição. Para ele, o governo deveria seguir com a redução, acelerando a venda da bilionária carteira de ações do banco e acabando com as exigências de conteúdo local no crédito, o que reduziria a demanda pelo financiamento de bens de capital.
Com isso, o BNDES poderia devolver mais recursos à União e, ao fim do processo, em três ou quatro anos, abrir mão dos recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), sua principal fonte. Para Carrasco, os desembolsos anuais poderiam ficar entre R$ 25 bilhões e R$ 30 bilhões, com foco na privatização. No limite, o BNDES poderia se converter em autarquia, com quadro de funcionários bem menor do que os atuais 2,2 mil servidores. "O banco existe, tem que fazer alguma coisa com ele e é difícil liquidar", disse.
Já o presidente da Associação de Funcionários do BNDES, Thiago Mitidieri, defende o papel do banco no apoio à recuperação da economia e critica as devoluções antecipadas ao Tesouro, que tornam a instituição "vulnerável". "É necessário pensar o BNDES no longo prazo, dentro de um projeto de País, com planejamento e políticas de desenvolvimento", disse o dirigente, em mensagem escrita ao Estado, desejando "boa sorte" a Levy.