IEDI na Imprensa - Rentabilidade menor reduziu investimentos, mostra estudo
Rentabilidade menor reduziu investimentos, mostra estudo
Valor Econômico - 21/06/2016
Arícia Martins
A piora das expectativas do empresariado não é o único fator que explica o tombo de mais de 26% da Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF, medida das contas nacionais do que se investe em máquinas, construção civil e pesquisa) desde o último trimestre de 2013. Para além da deterioração do ambiente político e econômico, a redução na rentabilidade das empresas brasileiras de 2010 a 2015 diminuiu os recursos disponíveis para investir, segundo estudo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI).
O levantamento, intitulado "Sem Lucro, Sem Investimento", analisou balanços e demonstrações de resultados de 340 companhias não financeiras de capital aberto, cujo faturamento representa cerca de um terço do Produto Interno (PIB). Na média, todas as medidas de lucro recuaram nos últimos cinco anos, com destaque para o lucro líquido, que passou de 3,9% do PIB, a preços de mercado, em 2010, para -1,2% do PIB - ou seja, passou-se a ter prejuízo, em média, nas grandes empresas.
Do conjunto de empresas analisadas, 144 são indústrias. Excluindo Petrobras e Vale da amostra, a margem líquida (relação entre lucro líquido e receita líquida) do setor industrial caiu de 8,3% para apenas 0,5% entre 2010 e 2015. Embora a situação da indústria seja mais preocupante, de acordo com o Iedi, o desempenho das demais atividades econômicas não foi muito diferente: a margem líquida dos serviços diminuiu de 12,9% para 1,2% na mesma comparação, e a do comércio, de 3,3% para 0,5%.
No caso da atividade industrial, além do nível de confiança dos empresários, o acesso a recursos financeiros é outro determinante importante nas decisões de investimento, diz Rafael Cagnin, economista do Iedi. Nesse quesito, empréstimos do BNDES são um complemento aos lucros acumulados pelas empresas, que, ao encolherem bastante nos últimos anos, figuram como outro desincentivo à formação de capital fixo.
A margem operacional (razão entre o lucro antes de juros e impostos e a receita) da indústria ficou menor no período observado, destaca Cagnin, com retração de 5,8 pontos, o que indica que a lucratividade do chão de fábrica também diminuiu, com aumento maior dos custos do que da receita. Nos cálculos do Iedi, a proporção entre o custo dos produtos vendidos e a receita operacional no setor industrial avançou três pontos percentuais de 2010 a 2015, para 77,2%.
"A evolução das demais despesas operacionais que não são controladas pelas indústrias, como é o caso dos custos de transporte e logística, os serviços especializados prestados às empresas e os preços monitorados pelo governo, especialmente a energia elétrica, são itens que provavelmente pressionaram os custos operacionais das empresas", afirma o estudo. Ao mesmo tempo, a capacidade da indústria repassar essa pressão de custos aos preços finais foi reduzida, em meio ao período de câmbio valorizado que tornou os concorrentes importados mais competitivos.
Já a margem líquida embute também custos não relacionados diretamente à produção e, por isso, é o indicador que sofreu deterioração mais forte, afetado pela expansão das despesas financeiras - que cresceram 2,57 vezes entre 2010 e 2015 na indústria, em termos reais. Para Cagnin, a alta é explicada pelo aumento da taxa de juros e, mais recentemente, pela desvalorização cambial. "Se o impacto da desvalorização cambial sobre o mercado externo ou substituição de importações é relativamente lento, nos indicadores de endividamento de empresas é quase imediato."
O efeito do câmbio sobre o estoque de dívida externa das indústrias preocupa, mas, segundo o economista do Iedi, não representa necessariamente um problema imediato para as empresas, que podem ter um "hedge natural" se exportam, ou mesmo usar instrumentos de proteção no mercado de derivativos. Já os juros mais altos são um impacto mais negativo sobre o lucro, porque prejudicam tanto a tomada e renovação de empréstimos por parte dos empresários quanto o volume de negócios. "A taxa de juros é um custo em si e também um fator de depressão da demanda", avalia Cagnin.
Outro reflexo dos juros mais elevados, assim como da crise, pode ser observado na composição do ativo das indústrias. Com perspectivas ruins para o desempenho da demanda e bastante incerteza no cenário econômico, as grandes companhias de capital aberto diminuíram a alocação de capitais em investimentos de longo prazo e elevaram o volume de aplicações financeiras e recursos disponíveis em caixa.
Excluindo Petrobras e Vale, a participação do caixa no total do ativo das indústrias subiu um ponto entre 2010 e 2015, para 10,5%, enquanto a fatia do ativo imobilizado, como edifícios e máquinas, recuou de 31,1% para 27,1%. "Na crise, o empresário correu para operações mais líquidas, mas o direcionamento de recursos para a produção e investimentos ficou comprometido", observa Cagnin.
O Iedi tem argumentado que, no primeiro trimestre, finalmente a atividade industrial parece ter atingido "o fundo do poço", mas o economista da entidade alerta que ainda não é possível antever uma volta do investimento. O grande período de compressão dos lucros e o elevado nível de capacidade ociosa nas fábricas, de acordo com Cagnin, são entraves a uma recuperação da formação bruta.