IEDI na Imprensa - Com Fim da CPMF, Expectativa É de Corte de Gastos Públicos
Com Fim da CPMF, Expectativa É de Corte de Gastos Públicos
Gazeta Mercantil - 14/12/2007
Ricardo Rego Monteiro, Ana Carolina Saito, Cristina Borges Guimarães e Cláudia Dianni
Existe um aparente consenso entre especialistas de que a contrapartida do governo diante da derrota na batalha política pela prorrogação da CPMF será dada por meio de redução das despesas. No entanto, não há unanimidade de que esta seria uma solução definitiva para compensar a perda de arrecadação estimada em R$ 40 bilhões para 2008. A preocupação gira em torno da possibilidade de os cortes atingirem investimentos que prejudiquem a trajetória de desenvolvimento do País e da tentação frente à alternativa de aumentar outros tributos. Outro dissenso diz respeito aos impactos do fim da contribuição sobre variáveis macroeconômicas como câmbio, inflação, consumo e investimentos.
O consultor do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi) e ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Júlio Gomes de Almeida, acredita que o fim da CPMF trará "dores de cabeça". Já o Instituto Brasileiro de Planejamento Brasileiro (IBPT) aposta em aumento do poder de compra do brasileiro, redução de preços ao consumidor e crédito ainda mais barato. O economista Raul Velloso, por sua vez, afirma que a melhor solução seria a substituição da CPMF por ela mesma.
"A oposição acenou com a possibilidade de negociar a continuidade da contribuição no ano que vem e essa oportunidade não pode ser descartada. Até lá contaremos com paliativos e só resta rezar para que os mercados não enlouqueçam. Caso isso ocorra poderá haver desvalorização do real decorrente de fuga de capitais com reflexo de aceleração da inflação", afirmou Velloso.
Segundo o IBPT, a CPMF tira do bolso do trabalhador 1,9% de seu rendimento bruto. Do total gasto com a contribuição, 1,7 ponto percentual (p.p.) é desembolsado na compra de produtos e 0,2 p.p. na movimentação financeira - a média é inferior à alíquota de 0,38% pois nem todos têm movimentação bancária.
Para salários de até R$ 500, o custo com o tributo é superior, atingindo 2,4%. Em faixas maiores, representa cerca de 1,2%. "A extinção da CPMF representa um ganho real no rendimento", diz o presidente do IBPT, Gilberto Luiz do Amaral, acrescentando que uma família gasta em média R$ 630 por ano com o tributo.
Na sua avaliação, os preços de produtos e serviços também devem cair, mas é difícil mensurar o seu percentual. "Alguns setores vão repassar e outros não", diz.
Muito além da CPMF
Reflexos na inflação e nos investimentos não são esperados por Almeida. "Os investimentos estão crescendo a taxas altas no País e contariam com a chancela de uma política industrial no ano que vem. Essa chancela foi retirada, mas os investimentos devem continuar apesar do adiamento das desonerações. O impacto da CPMF nos preços é difícil de ser avaliado e os empresários não promoverão reduções até terem certeza do fim do tributo."
Para o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Armando Monteiro Netto, o clima positivo para investimentos vai muito além da questão da CPMF, que afeta a receita pública no curto prazo, mas não a decisão de investir dos empresários. "O clima de investimentos reflete a percepção das potencialidades de mercado e o Brasil é muito maior que a CPMF", disse. No entanto reconheceu que pode haver um espaço menor para a desoneração dos investimentos no curto prazo. Ele disse ainda esperar que o governo atue no curto prazo pelo lado dos gastos e resista à tentação de elevar alguns tributos. "A perda da CPMF também poderá ser compensada pela via saudável do crescimento, com aumento da arrecadação decorrente de um PIB vigoroso."
Desenvolvimento
Segundo o IBPT, a entrada de R$ 40 bilhões na economia deve resultar em um acréscimo de 0,5 ponto no PIB. "A CPMF representa 1,4% do PIB que vai retornar em consumo e aumento de produtividade", afirma Amaral.
"No primeiro momento, o governo deverá tentar compensar a perda da CPMF com medidas de curto prazo, como aumento das alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), do Imposto sobre Produção Industrial (IPI) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), uma vez que perdeu uma arrecadação que era garantida", avalia o tributarista Rubens Branco, da Branco Consultores. "Logo em seguida, porém, vai perceber que poderá contar com um aumento natural da arrecadação de outros tributos, que deverá crescer com o aumento do PIB."
Entre as ações esperadas pelo IBPT, também figuram os aumentos do IOF, IPI e Imposto de Importação, já que não dependem de aprovação do Congresso. Esses três impostos garantem R$ 52 bilhões aos cofres públicos por ano e, na avaliação de Amaral, a tentativa de compensação não deve ultrapassar os R$ 7 bilhões. Com isso, sem a CPMF, a carga tributária poderia cair 1%, levando em consideração que o governo tomará tais medidas para compensar a perda.
Para o ex-coordenador tributário da Secretaria da Fazenda do estado de São Paulo Clóvis Panzarini, hoje sócio-diretor da CP Consultores Associados, o governo não tem muita margem para compensar a perda da CPMF com o aumento das alíquotas do IPI e IOF. Na melhor das hipóteses, o governo vai perder R$ 20 bilhões, pois a criação de um nova contribuição levaria seis meses, considerando o prazo de três meses de tramitação no Congresso mais 90 dias para entrar em vigor no mesmo ano.
A saída é cortar despesas para não ser obrigado a tirar do superávit primário. "A TV Pública vai custar R$ 1 milhão por dia. Isso não é nenhuma prioridade para o cidadão. São R$ 360 milhões por ano para a TV Lula", diz. O valor representa 1% da arrecadação de CPMF prevista para este ano.
Para Miguel Jorge, haverá prejuízo para empresários
O ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic), Miguel Jorge, disse ontem em Caracas, onde acompanha viagem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e missão de empresários em visita à Venezuela, que "são os empresários que perdem com a não prorrogação da CPMF". O governo não conseguiu aprovar o chamado imposto do cheque no Senado, na madrugada de ontem e com isso terá que rever vários pontos da política industrial, segundo o ministro responsável pela medida.
Miguel Jorge afirmou que o programa já estava pronto e só aguardava a aprovação da CPMF para ser anunciado. Segundo ele, na semana que vem o Mdic em parceria com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), o Ministério das Ciências e Tecnologias e a Casa Civil se reúnem para discutir mudanças no pacote que seria anunciado, mas que contava com a previsão de arrecadação da CPMF, de R$ 40 bilhões em 2008.
Política industrial x PAC
"O governo terá que buscar fontes alternativas de financiamento e reduzir as despesas passíveis de corte no curto prazo. E nenhuma das duas soluções são ideais", disse o consultor do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi) e ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Júlio Gomes de Almeida.
Segundo ele, a opção de recorrer a uma fonte de receita adicional aumentaria a pressão sobre as empresas e seria ruim. "O corte de gastos não deve atingir o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), mas sacrificará a política industrial que previa redução da tributação sobre investimentos e folha de pagamentos." Almeida completa dizendo que a melhor reação do governo seria reduzir os gastos com foco na melhoria da gestão, entretanto essa alternativa não produziria resultados no curto prazo.
"O ideal seria termos uma sociedade que trabalhasse com prazos. Isso permitiria rearticular gastos e formular um programa de gestão até uma data marcada para a extinção da CPMF", afirmou Almeida. Segundo ele, o governo trabalhou com a possibilidade de prorrogação da cobrança do tributo porque tinha metas fiscais a cumprir. Ele deixou claro que não é favorável ao fim da CPMF e defendeu a transformação da contribuição, hoje de caráter arrecadatório, em um tributo com finalidade regulatória.
Almeida acredita que o governo deverá apresentar um novo projeto. "De repente, poderemos ter um programa mais completo, com data prevista para o fim da CPMF ou redução gradual da alíquota para níveis muito baixos que garantam a sua função regulatória e eliminem seu caráter arrecadatório. O problema do Brasil está no lado da despesa e não da tributação. Precisamos atacar os gastos", disse reforçando que espera que o PAC não seja afetado pelo fim da CPMF.