IEDI na Imprensa - Os "Suspeitos" de Sempre na Queda do Spread Bancário
Os "Suspeitos" de Sempre na Queda do Spread Bancário
Gazeta Mercantil - 16/12/2004
Editorial
Na véspera de completar onze anos de tramitação, a Câmara dos Deputados aprovou a nova Lei de Falências. Era um compromisso antigo - inclusive com o Fundo Monetário Internacional (FMI) - para modernizar uma legislação que datava de 1945. A nova lei dá correta prioridade à manutenção de postos de trabalho, quando facilita a recuperação de empresas em dificuldades financeiras. Há um ganho adicional na lei: preservada a empresa, os credores terão mais garantia. É inevitável, portanto, que cresça a esperança de que o custo do dinheiro entre nós se reduza porque, enfim, "o risco de emprestar" diminuiu.
A nova Lei de Falências estabeleceu uma divisão entre os credores de massas falidas: na "primeira classe" estarão as instituições financeiras com direitos preferenciais na recuperação dos créditos até mesmo quanto às dívidas trabalhistas; estas terão prioridade limitada a valor fixo. Com a derrota da proposta do relator, deputado Osvaldo Biolchi, de que todo tipo de crédito estivesse incluído no plano especial de recuperação judicial de pequenas e médias empresas, os bancos também ganharam. O Ministério da Fazenda também recusou a proposta do relator porque poderia dificultar a redução do spread bancário - a diferença entre a taxa de captação e a aplicada aos requisitantes de crédito. Em outras palavras: a Fazenda temia que, se o risco de emprestar não caísse, o preço da oferta de crédito continuaria nas nuvens. A ansiedade por oferecer garantias para reduzir spread foi de tal ordem que, de modo inédito na história recente do Brasil, o pagamento de débitos com garantia real ficou à frente dos tributários. Ou seja, até a Receita Federal perdeu.
O problema agora está em transformar a ansiedade em atender aos bancos em efetiva esperança de diminuição do spread bancário. É curioso que, quando algumas garantias aumentam, como se o País todo estivesse na pista do aeroporto de Casablanca, convocam-se os "suspeitos" de sempre para manter o statu quo no crédito bancário: os níveis de inadimplência dos tomadores e o crédito dirigido.
Pesquisa apresentada no começo de dezembro pelo Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi) mostrou, a partir de dados do Banco Central (BC), que o spread bancário cresce desde julho, apesar da queda no índice geral de inadimplência: 7,5% em setembro, 7,2% em outubro, em relação ao mesmo período do ano passado. O aumento do crédito em outubro - R$ 123 bilhões, 2,2% a mais que no mesmo mês de 2003, descontada a inflação - é o sexto crescimento consecutivo ao longo do ano. O BC identificou que o aumento do crédito ocorreu entre pessoas físicas, ou seja, para consumo. A disputa entre os grandes bancos para aquisições de financeiras especializadas no setor de crédito ao consumo confirma que, se a renda ainda não cresceu, a recuperação da capacidade de endividamento da população é notória. Bancos compram financeiras porque a operação compensa, pela simples razão de que o crédito tomado para consumo é honrado.
Por outro lado, autoridades financeiras, inclusive do BC, argumentaram que ocorre um desvio de recursos captados pelos bancos, obrigados a realizar operações com taxas mais baixas. Esta seria outra razão do alto spread. As operações não dirigidas - as que permanecem "livres" - seriam obrigadas a pagar a diferença. Crédito dirigido, porém, é voltado a investimento, com aceleração de produção, com efeito multiplicador por toda a economia, beneficiando os bancos. Além disso, a maior parte desses créditos é oferecida por instituições financeiras estatais. Por todo o mundo desenvolvido existem créditos direcionados à produção (US$ 21 bilhões nos Estados Unidos só para pequenas empresas, US$ 31 bilhões na Alemanha ou US$ 18,5 bilhões do Korean Development Bank) e o spread bancário não excede a um dígito.
Os dados do BC demonstram que a taxa média relativa ao crédito para pessoa física manteve-se em 63,2% e sem variação entre setembro e outubro. Pessoas físicas recebem um quarto disso para deixar dinheiro nos bancos. Juros cobrados de pessoas jurídicas tiveram aumento de 0,7% no mesmo período, alcançando 31,1% ao ano, maior taxa desde novembro de 2003, de 32,3% ao ano.
Não há dúvida que a nova Lei de Falências retirou mais uma desculpa que impedia a redução do spread bancário. Resta saber se precisaremos alcançar o risco zero absoluto - já estamos perto disso com o empréstimo com desconto em folha - para que o spread bancário seja, no Brasil, apenas civilizado. Apesar de todas as concessões, por enquanto, está muito longe de ser.