Indústria Vira o Jogo e Fecha 2002 Com Saldo
Indústria Vira o Jogo e Fecha 2002 Com Saldo
Valor Econômico - 25/03/2003
Comércio exterior: Primeiro resultado positivo desde o início do Plano Real foi de US$ 1,6 bilhão em 2002
Denise Neumann
A balança comercial de bens industriais alcançou seu primeiro superávit comercial após o plano Real em 2002. Depois de acumular um déficit de US$ 7,6 bilhões em 2001, a indústria de transformação encerrou 2002 com superávit de US$ 1,6 bilhão, indicando uma virada de US$ 9,3 bilhões.
Essa virada no comércio de bens industriais respondeu, assim, por 89% do saldo comercial positivo de US$ 13 bilhões alcançado pelo Brasil no ano passado, segundo a Secretaria de Desenvolvimento da Produção do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio. O MDIC possui cálculos para a balança comercial da indústria desde 1996, quando o déficit somou US$ 6 bilhões. Em 1997 e 1998 ele ficou em US$ 10 bilhões negativos.
Dois especialistas em indústria, Mariano Laplane da Universidade de Campinas (Unicamp) e Júlio Sérgio Gomes de Almeida, diretor-executivo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), vêem sinais de substituição de importação neste resultado, ainda que ele tenha sido feito com queda de 17% nas importações e aumento de 2% nas exportações.
"Em alguns setores a substituição não é mais tão tímida. O efeito de substituição de importação provocado pela maxidesvalorização do real em 2002 foi maior que o provocado pela maxi de 1999", avalia ele. Laplane chama atenção para o fato de que a queda na quantidade importada em alguns segmentos foi muito significativa e não foi acompanhada por uma queda proporcional na produção industrial.
No conjunto, a produção física da indústria de transformação aumentou 1,5% em 2002 e o valor de bens industriais importados caiu 17%. De acordo com a Fundação Centro de Estudos de Comércio Exterior (Funcex), a quantidade importada diminuiu 12% em 2002.
"A queda das importações reflete, em parte, a queda no mercado interno de consumo. Mas a queda não explica toda retração das importações. Uma parcela maior do mercado interno foi abastecido pela produção doméstica em 2002", diz Laplane.
Almeida, do Iedi, comemora o desempenho da indústria em 2002. "Foi ela, e não a agricultura, que virou o jogo da balança comercial no ano passado", diz ele. Ele avalia que a substituição de importações foi forte em alguns setores e em outros ocorreu apenas redução de consumo de importados sem troca por fornecedor local.
Almeida cita o setor metalúrgico como o de reação mais completa: o setor aumentou as exportações em 18% no ano passado e as importações destes bens caíram 17%, enquanto a produção física local crescia 3,3%. "O problema é que este setor não tem capacidade para prosseguir nesse ritmo, pois está operando a plena capacidade", observa. De acordo com dados da sondagem conjuntural da Fundação Getúlio Vargas, a ocupação da capacidade instalada foi de 88% no setor metalúrgico no segundo e terceiro trimestres de 2002.
Com base nos dados do MDIC, Almeida calculou que o aumento das exportações industriais explica 7,8% do aumento do saldo total brasileiro em 2002 - de US$ 10,4 bilhões. "E a queda na importação de bens industriais explica 81% deste aumento", acrescenta. Ele calculou como aumento do saldo a diferença entre o superávit de US$ 2,6 bilhões alcançado em 2001 e os US$ 13 bilhões do ano passado.
O que reforça a análise da substituição é o fato de que em alguns setores a importação caiu ao mesmo tempo em que a produção local aumentou. Além do setor metalúrgico, a importação de bens mecânicos caiu 15,7%, enquanto a produção doméstica cresceu 8,7%. No setor químico, a importação foi 7,4% menor e indústria local aumentou a produção em 1,5% e exportou 9,9% mais em valor. Almeida não se entusiasma com os número da indústria química, setor que concentra um dos maiores déficits comerciais do país. "A queda na importação reflete redução de preço e as exportações só vão se sustentar com novo ciclo de investimento no setor", crê Almeida.
No ano passado, lembra Almeida, a formação bruta de capital fixo foi 5% inferior a de 2001, indicando queda no volume de investimentos produtivos no país. "A substituição efetiva tem duas condições: é preciso deixar de importar e aumentar a produção doméstica para substituir o que era comprado no exterior". A primeira condição, avalia, ocorreu. Mas a segunda pressupõe, também, aumento de capacidade produtiva para atender a demanda que antes era atendida pelo exterior.
"A substituição fácil ocorreu. Ela foi mais expressiva onde havia capacidade ociosa. Mas para que seja mais expressiva, é preciso novo ciclo de investimentos", pondera Laplane. "E para investir em aumento de capacidade o empresário precisa vislumbrar perspectivas de aumento do mercado interno consumidor", diz ele.