Análise IEDI
O trimestre da Covid-19
O desempenho da economia brasileira divulgado hoje pelo IBGE reflete integralmente o choque da pandemia de Covid-19, que impôs fortes perturbações à oferta de bens e serviços, mas que também deprimiu a demanda agregada face ao recrudescimento da incerteza, à elevação do desemprego e às medidas de isolamento social e distanciamento físico.
O tombo do PIB chegou a -9,7% na passagem do primeiro ao segundo trimestre de 2020, já descontados os efeitos sazonais. Se comparado ao mesmo período do ano anterior, o PIB recuou ainda mais: -11,4%. Com isso, perdemos -5,9% no acumulado do primeiro semestre.
Ao que tudo indica, este foi o pior momento da crise do coronavirus, mas ainda existem dúvidas sobre o perfil da recuperação. Enquanto não for desenvolvida e distribuída uma vacina eficaz contra a Covid-19, dificilmente haverá completa normalização da atividade econômica, demandando a continuidade de programas de apoio a empresas e famílias. Estes devem, porém, passar por ajustes progressivos adequando-os às mudanças de quadro.
No 2º trim/20, o recuo mais intenso pelo lado da demanda foi registrado pelo investimento: -15,5% frente ao trimestre anterior, com ajuste sazonal, condicionado pela paralisação de projetos em andamento e o adiamento de novos planos, dada a necessidade de liquidez de curto prazo das empresas e toda incerteza que permeia a crise atual.
Um dos aspectos que particularizam este momento de aguda adversidade, além da profusão de resultados negativos, é a intensidade da queda do consumo das famílias, de -12,5%, se aproximando muito da retração do investimento. Sem o auxílio emergencial o recuo teria sido ainda maior, embora os problemas iniciais na execução do programa tenham, em alguma medida, mitigado seu impacto positivo. O consumo do governo também teve importante impacto contracionista (-8,8%, com ajuste).
Deste modo, o PIB total poderia ter registrado perda de dois dígitos no 2º trim/20 não fosse a contribuição positiva da demanda externa. Diferentemente do 1º trim/20, as exportações cresceram +1,8%, sob influência dos resultados positivos da safra agrícola e também do controle do surto de coronavirus na China, que permitiu ao país avançar no restabelecimento de seu dinamismo econômico no 2º trim/20.
Apesar deste desempenho positivo das exportações, o condicionante maior para o setor externo foi o comportamento das importações que, acompanhando a contração do mercado doméstico, recuaram -13,2% frente ao trimestre anterior, já descontados os efeitos sazonais. Este resultado é comparável apenas ao 1º trim/09 (-15,9%), quando a crise financeira global atingiu o Brasil.
Pelo lado da oferta, três setores lideraram a retração econômica do segundo trimestre: a indústria de transformação, os serviços de transporte e outras atividades de serviços, que reúnem sobretudo os serviços pessoais. As variações com ajuste sazonal a seguir mostram a gravidade da situação.
• PIB total: +0,5% no 4º trim/19; -2,5% no 1º trim/20 e -9,7% no 2º trim/20;
• PIB da agropecuária: -0,7%; +0,5% e +0,4%, respectivamente;
• PIB da indústria de transformação: +0,1%; -1,9% e -17,5%;
• PIB do comércio: -0,2%; -1,4% e -13,0%;
• PIB dos serviços de transporte: +1,3%; -2,4% e -19,3%;
• PIB outros serviços: +0,8%; -5,3% 1 -19,8%, respectivamente.
A gravidade da pandemia para os ramos de serviços pessoais e de transporte, que levaram o setor como um todo a registrar -9,7%, era esperada, já que as medidas de isolamento comprometem diretamente suas atividades. Além da queda da mobilidade de pessoas, os serviços de transporte também foram prejudicados pelo menor nível geral de atividade econômica. O comércio não ficou muito atrás e caiu -13%.
Na indústria de transformação, o choque adverso tende a ser mais complexo. Reflete rupturas no fornecimento peças, partes e componentes; reorganização das linhas de produção em função dos protocolos de distanciamento social; e a contração da demanda interna e externa. Como produz muitos bens cujos mercados exigem confiança e condições adequadas de financiamento, o contexto atual é particularmente desafiador para o setor.
Assim, foi a indústria de transformação o principal elemento a condicionar a queda de -12,3% da indústria total, embora o ramo de construção (-5,7%) também tenha aprofundado muito seu nível de perda.
Já o PIB da agropecuária, a despeito da safra favorável, pouco cresceu, contribuindo de maneira muito marginal para amortecer o retrocesso dos outros setores da economia. Apresentou variação de apenas +0,4% no 2º trim/20, praticamente o mesmo desempenho do 1º trim/20 (+0,5%).
Segundo dados divulgados pelo IBGE, o Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil registrou, no primeiro trimestre de 2020, R$ 1,653 trilhão a preços correntes, apresentando retração de 9,7% na comparação com o trimestre anterior, a partir de dados dessazonalizados.
Com relação ao segundo trimestre de 2019, houve variação negativa de 11,4%. No que se refere à oscilação do acumulado nos últimos quatro trimestres frente a igual período do ano anterior houve decréscimo de 2,2%.
Ótica da oferta. Frente ao primeiro trimestre de 2020, a partir de dados dessazonalizados, houve acréscimo de 0,4% para o setor agropecuário, para o setor da indústria registrou-se queda de 12,3% e para serviços houve uma variação negativa de 9,7%.
Para os subsetores da indústria, na mesma base de comparação, houve retração em todos os segmentos: indústrias de transformação (-17,5%), construção (-5,7%), produção e distribuição de eletricidade, gás e água (-4,4%) e indústrias extrativas (-1,1%).
Nos subsetores de serviços, ainda sobre o trimestre anterior e com ajuste sazonal, dois setores apresentaram variações positivas: intermediação financeira e seguros (0,8%) e atividades imobiliárias (0,5%). Os demais setores apresentaram retrações: transporte, armazenagem e correio (-19,3%), outras atividades de serviços (-19,8%), comércio (-13,0%), administração, defesa, saúde e educação públicas e seguridade social (-7,6%) e informação e comunicação (-3,0%).
No comparativo com o mesmo trimestre do ano anterior, a partir de dados dessazonalizados, o setor agropecuário apresentou variação positiva de 1,2%, enquanto o setor da indústria apresentou queda de 12,7% e o setor de serviços retração de 11,2%.
Para os componentes do setor industrial, frente ao mesmo trimestre do ano anterior, o setor de indústrias extrativas apresentou variação positiva de 6,8%. Os demais segmentos analisados registraram decréscimos: indústria de transformação (-20,0%), construção (-11,1%) e produção e distribuição de eletricidade, gás e água (-5,8%).
No setor de serviços, ainda na mesma base de comparação, dois segmentos apresentaram incremento: atividades financeiras de seguros e serviços relacionados (3,6%) e atividades imobiliárias (1,4%). Os demais segmentos apresentaram variações negativas: outras atividades de serviços (-23,6%), transporte, armazenagem e correio (-20,8%), comércio (-14,1%), administração, saúde e educação públicas (-8,6%) e serviços de informação e comunicação (-3,2%).
Ótica da demanda. Sob a ótica da demanda, frente ao primeiro trimestre de 2020, para dados com ajuste sazonal, houve acréscimo somente em exportações de bens e serviços (1,8%). Por outro lado, houve decréscimo em: formação bruta de capital fixo (-15,4%), importações de bens e serviços (-13,2%), consumo das famílias (-12,5%) e consumo do governo (-8,8%).
Por fim, na comparação com o segundo trimestre de 2019, apenas o segmento de exportações de bens e serviços apresentou variação positiva (0,5%). Em sentido oposto, os demais seguimentos registraram retração: formação bruta de capital fixo (-15,2%), importações de bens e serviços (-14,9%) consumo das famílias (-13,5%) e consumo do governo (-8,6%).