IEDI na Imprensa - Déficit externo da indústria de alta tecnologia acende alerta antes mesmo de tarifaço de Trump, diz IEDI
O Globo
Segundo levantamento do instituto, importações da indústria de transformação superaram exportações em US$ 37,2 bilhões no primeiro semestre, com rombo de US$ 25,1 bilhões na troca de bens de alta intensidade tecnológica
Vinicius Neder
O déficit do comércio exterior da indústria de transformação, atividade mais atingida pela sobretaxa adicional de 40% imposta pelos EUA a partir de agosto sobre as exportações do Brasil, atingiu US$ 37,2 bilhões no primeiro semestre, recorde para o período, com destaque para um rombo também recorde de US$ 25,1 bilhões na troca de bens de alta intensidade tecnológica, segundo estudo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI).
A guerra comercial do presidente americano, Donald Trump, pega a indústria brasileira já num momento de dificuldades com a competitividade internacional, e promete mais turbulências, tanto porque cria barreiras em um dos mais importantes mercados para manufaturados do Brasil quanto porque poderá impulsionar, ainda mais, a invasão de produtos da China e de outras potências industriais no mercado nacional.
Segundo o economista-chefe do IEDI, Rafael Cagnin, o Brasil tem déficit comercial na indústria de transformação desde por volta de 2010, na esteira da crise financeira global de 2008 e do avanço ainda maior da indústria chinesa no mundo todo. E esse rombo foi piorando ano após ano.
Antes mesmo do tarifaço de Trump, a balança comercial do primeiro semestre já tinha alguns recordes negativos relacionados à baixa competitividade internacional da indústria brasileira, mostra o levantamento do IEDI — com base nos dados oficiais de comércio exterior, conforme classificação da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Rombos recorde na alta tecnologia
No primeiro semestre, os déficits recorde no comércio exterior de bens de alta intensidade tecnológica (US$ 25,1 bilhões) e de média-alta tecnologia (US$ 40,5 bilhões) apontam para uma segunda fase do avanço da China.
Nos últimos dez anos, as indústrias chinesas passaram de produtos mais básicos, com produção intensiva em mão de obra, para o desenvolvimento e fabricação de bens de alta tecnologia, lembrou Cagnin. A guerra comercial é um motivo para a China avançar ainda mais em mercados além dos EUA.
— Dada a falta de competitividade, e que todo mundo vai tentar diversificar mercados, o Brasil poderá sair perdendo. Haverá um risco adicional de perder mercado (externo) para outros fornecedores — afirmou Cagnin.
Há riscos também no mercado doméstico. A indústria nacional tem defasagem tecnológica e poderá perder ainda mais espaço para importados mais baratos, mesmo com alta tecnologia, vindos da Ásia, disse o economista do IEDI.
Efeitos secundários preocupam mais do que impactos diretos
Para Cagnin, os impactos negativos dos desvios de comércio — um efeito secundário do maior fechamento do mercado americano — deverão ser maiores do que os prejuízos diretos nas trocas bilaterais entre Brasil e EUA.
Mesmo assim, os impactos diretos são importantes: as exportações de alguns dos setores mais vulneráveis à sobretaxa americana ajudam a mitigar o rombo na balança comercial da indústria.
Segundo o estudo do IEDI, nos produtos de média intensidade tecnológica, o superávit (US$ 601 milhões) do primeiros semestre foi o menor desde 2014 — apesar do salto de 15,8% nas exportações de produtos metalúrgicos, que têm nos EUA seu principal mercado e cujas vendas serão atingidas pelo tarifaço.
Nos bens de média-baixa intensidade tecnológica da indústria da transformação, o saldo comercial foi positivo no primeiro semestre, com US$ 27,9 bilhões, mas o resultado foi obtido com uma queda de 1% nas exportações, ante a primeira metade de 2024.
Nesse grupo estão os alimentos industrializados e os produtos industriais de madeira. Os segundos, que tiveram alta nas exportações, também têm nos EUA seu principal mercado externo e serão atingidos pela sobretaxa.
