IEDI na Imprensa - Produção industrial avança 8,9% em junho, segundo mês seguido de alta
O Globo
Resultado vem após tombo histórico de abril, mas ainda está 13,5% abaixo do patamar de fevereiro, antes das medidas de isolamento
Pedro Capetti
A atividade industrial do Brasil segue esboçando uma lenta recuperação após o tombo severo causado pela pandemia de Covid-19. Dados divulgados nesta terça-feira pelo IBGE mostram que o setor avançou 8,9% em junho, na comparação com maio. Foi o segundo mês consecutivo de alta na comparação mensal, após as quedas históricas registradas em março e abril, mas ainda longe de recuperar as perdas acumuladas na crise.
O crescimento registrado em junho se dá em cima de uma base de comparação depreciada. Na comparação com o mesmo período do ano passado, a indústria registrou queda de 9%, oitavo resultado negativo seguido nesse tipo de comparação.
— São expansões que ocorrem sobre uma base (de comparação) depreciada. Mesmo com dois avanços seguidos na casa de 8%, o patamar que a indústria opera neste momento é o terceiro mais baixo da série histórica — explica André Macedo, gerente da pesquisa do IBGE.
Economistas afirmam que o resultado fechado do segundo trimestre consolida a tendência de queda do PIB de dois dígitos no período, a ser divulgado em setembro pelo IBGE. Na comparação com o primeiro trimestre deste ano, a indústria amargou uma contração de 17,5% no três meses encerrados em junho.
No entanto, os números apontam para uma possível melhora no terceiro trimestre, caso as flexibilizações das medidas de isolamento sigam ocorrendo e não haja um novo ciclo de fechamento de indústria por conta da pandemia.
Em junho, o setor industrial foi beneficiado pelas medidas de flexibilização e protocolos de segurança, criados em diversos estados. Houve crescimento em 24 dos 26 setores, com a reativação das plantas industriais paralisadas, na comparação mensal.
O setor de veículos automotores, reboques e carrocerias avançou 70% no mês, influenciado principalmente pela produção de caminhões e carros. No entanto, ainda está 53% abaixo da produção registrada em fevereiro, no pré-pandemia. O mesmo cenário se reflete em outros ramos industriais.
Para Renata de Mello Franco, economista da FGV/Ibre, os números ainda não indicam a recuperação da produção, mas uma retomada de fábricas que estavam paradas nos últimos meses.
— Os setores que mais contribuíram para a produção industrial foram aqueles que perderam mais. O número é positivo, mas indica mais uma “despiora” do setor do que um avanço da produção industrial — avalia.
O setor ainda encontra-se 13,5% abaixo do patamar de fevereiro, período anterior às medidas de restrição e isolamento.
Em todos os segmentos que compõem a indústria, o aumento registrado em maio e junho foi insuficiente para compensar as grandes perdas de março e abril. No acumulado no ano, frente a igual período do ano anterior, o setor industrial retraiu 10,9% entre janeiro e junho.
Para os próximos meses, economistas afirmam as taxas de crescimento na comparação mensal devem ser menores e cada vez mais dependentes do aumento da demanda interna.
Em maio e junho, parte do crescimento na comparação mensal ocorreu por um efeito de reabertura das empresas, após serem fechadas no ápice da crise. Com a estabilização no processo de reabertura, qualquer aumento dependerá de um aquecimento da economia.
Por isso, a alta no desemprego, junto com a queda na renda disponível da economia, devem, ao longo do tempo, minar novos avanços da mesma magnitude. Hoje o país tem 19,1 milhões de brasileiros que não estão procurando trabalho por conta da pandemia ou por falta de vagas onde mora.
— Se não tiver uma recomposição da renda das famílias, vamos ter um freio na recuperação da indústria nos próximos meses — alerta Renata.
Além disso, a indústria brasileira já vinha apresentando fragilidade antes da pandemia do novo coronavírus. Em 2019, sequer havia recuperado as perdas da crise no biênio 2015 e 2016, e retraiu 1,1%, segundo o IBGE.
Agrava o quadro o fato de que a indústria pouco poderá contar com o setor externo para ganhar tração nos próximos meses.
— A recuperação da crise 2015 e 2016 já se mostrava bastante fragilizada, insuficiente e frágil — ressalta Rafael Cagnin, economista do IEDI (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial) — A variação positiva é menos importante do que o perfil que vamos ter nos próximos meses.
Na avaliação de Cagnin, uma recuperação mais sustentada depende de dois fatores: controle da curva epidemiológica e de um processo transitório das medidas emergenciais anunciadas pelo governo, como auxílio emergencial e programas de crédito.
— Se mantiver um relativo controle da pandemia podemos acelerar esse processo. Não será bem uma (recuperação) em “V” (desenho do gráfico quando há grande queda e uma volta para perto do estágio em que estava numa velocidade alta). A curva está mais achatada do que foi a queda — ressalta.
Para Daniel Xavier Francisco, economista do Banco ABC Brasil, é preciso reduzir a incerteza para uma recuperação mais consistente, cada vez mais dependente do cenário doméstico. A expectativa do mercado, segundo o Boletim Focus, é que o setor registre uma queda 7,9%.
— É um risco enquanto a doença não for reduzida. Isso (novo ciclo de fechamento) pode minar a recuperação.