Análise IEDI
Sem crédito, sem recuperação
As condições de financiamento da economia brasileira em 2016 foram dramáticas. A contração de 7,8%, em termos reais, das concessões de crédito no acumulado do ano fez com que o estoque total do crédito (R$ 3,1 trilhões) em relação ao PIB recuasse para 49,3% (-4,35 pontos percentuais), revertendo uma longa tendência de elevação dessa relação que prometia colocar o país mais em linha com o resto do mundo.
O crédito às empresas foi quem liderou esse movimento de queda das concessões no ano passado, registrando -14,9% em termos reais. As famílias também foram atingidas, mas em uma intensidade muito menor (-1,6% no acumulado do ano).
As operações com recursos direcionados, das quais se esperaria um comportamento menos cíclico, de forma a atenuar os efeitos recessivos da crise de crédito, foram justamente a modalidade a apresentar as variações mais negativas no crédito corporativo: -27,9%, em termos reais, contra -12,7% das concessões livremente pactuadas entre bancos e empresas.
Embora em menor magnitude o mesmo comportamento se deu no financiamento às famílias, em que as concessões com recursos direcionados ficaram 13,5% menores em 2016 (em termos reais) enquanto aquelas com recursos livres permaneceram quase estáveis (-0,3%).
Com isso, o ritmo de declínio das concessões totais com recursos direcionados foi mais do que o triplo daquele com recursos livres, em grande medida devido à ausência do BNDES como moderador da recessão, um papel que ele cumprira tradicionalmente em sua trajetória. Suas concessões reais tiveram um tombo de -40,5%.
Além do endurecimento das exigências dos bancos para realizar novas concessões, dada sua elevada aversão a riscos, a retração do crédito em 2016 também foi influenciada pelo ambiente econômico geral bastante recessivo, que reduz o nível de atividade das empresas e do consumo das famílias e adia projetos de investimento.
Entretanto, a queda da demanda por novos créditos também decorre das taxas de juros muito elevadas ao longo do ano passado. Em termos nominais, os juros médios das concessões totais passaram de 29,8% a.a. para 32,0% a.a. entre dez/15 e dez/16. A alta maior veio dos juros do crédito livre, de 47,3% a.a. para 52,0% a.a., no mesmo período, puxados pelas concessões às famílias, cujas taxas médias saltaram de 63,7% a.a. para 71,5% a.a.
Juros altos e em elevação na maior parte do ano e crédito em retração mais acentuada que o PIB podem refletir, em alguma medida, o baixo dinamismo da economia como um todo, mas também consistem em destacadas causas da crise em que vivemos. Nessas condições, torna-se extremamente difícil a tão necessária desalavancagem das empresas e das famílias para que se possa retomar o crescimento.
Espera-se, ao menos, que a aceleração dos cortes da taxa básica de juros (Selic) pelo Banco Central, ao baratear o custo de financiamento dos bancos, possa dar continuidade e mesmo intensificar o discreto movimento de redução dos juros dos empréstimos visto no último bimestre de 2016 (de 33,3% a.a. para 32,0% a.a. entre out/16 e dez/16).
Dessa maneira, poderia abrir-se uma nova etapa no mercado de crédito, especialmente se viesse acompanhada de uma moderação dos spreads bancários, sabidamente extremamente elevados no Brasil. Isso é uma possibilidade concreta diante da trajetória recente da inadimplência, que no caso do crédito às famílias já mostra alguma redução (de 4,2% para 3,9% entre dez/15 e dez/16).
Segundo os dados divulgados hoje pelo Banco Central, o saldo das operações de crédito alcançou R$ 3.107 bilhões em dezembro de 2016, correspondendo a 49,3% do PIB. As operações realizadas com de recursos livres alcançaram 24,7% do PIB e a parcela com recursos direcionados, 24,6% do PIB.
A carteira de crédito com recursos livres atingiu R$ 1.557 bilhões, representando uma expansão de 0,6% frente ao mês anterior, em termos nominais. Em relação ao mesmo mês do ano anterior, a retração nominal foi de 4,9%. O valor destas operações realizadas junto a pessoas físicas correspondeu a R$ 809 bilhões, elevação nominal de 0,5% frente ao mesmo mês do ano anterior. Já o valor das operações junto a pessoas jurídicas alcançou R$ 747 bilhões, um crescimento de 1,1% frente a novembro.
O estoque de crédito com recursos direcionados em dezembro último, de R$ 1.550 bilhões, representou, em termos nominais, queda de 0,4% frente ao mês anterior e redução de 2,0% frente a dezembro de 2015. O saldo referente a pessoas físicas somou R$ 798 bilhões (recuo nominal de 1,4% sobre o mês anterior); para pessoas jurídicas somou R$ 814 bilhões, 2,0% menor do que o registrado no mês anterior.
No mês de dezembro foram concedidos R$ 316,2 bilhões em novas operações de crédito, frente a R$ 343,3 bilhões no mesmo mês do ano passado, uma variação negativa de 7,9%. Deste volume, R$ 276,4 bilhões foram originados de recursos livres (redução de 6,7% frente ao mesmo mês do ano anterior).
Dentre as concessões de crédito às pessoas físicas a partir de recursos livres, destacaram-se as operações de crédito rotativo (R$ 127,6 bilhões), cartão de crédito (R$ 100,0 bilhões) e cheque especial (R$ 30,2 bilhões). Junto às empresas, as principais modalidades foram capital de giro (R$ 20,5 bilhões), conta garantida (R$ 19,2 bilhões), cheque especial (R$ 17,5 bilhões) e desconto de duplicatas (R$ 13,8 bilhões).
As concessões com recursos direcionados apresentaram variação negativa de 15,1% frente a dezembro de 2015, atingindo R$ 39,8 bilhões. Nas novas concessões de crédito realizadas com recursos direcionados destacaram-se, para pessoas físicas, as modalidades de financiamento imobiliário (R$ 9,8 bilhões) e crédito rural (R$ 7,6 bilhões). Para as empresas, as principais modalidades foram BNDES (R$ 9,5 bilhões) e rural (R$ 7,2 bilhões).
Setores. Do saldo total de crédito do sistema financeiro nacional, a carteira de operações para a indústria alcançou R$ 747,2 bilhões, o que representa uma retração nominal de 10,3% frente a dezembro de 2015. No caso da indústria de transformação, a redução do saldo nominal foi de 13,0% nesta mesma comparação, atingindo o valor de R$ 410,6 bilhões. O setor agropecuário respondeu por R$24,4 bilhões do montante, valor 3,4% menor, em termos nominais, do que o registrado em novembro de 2015. O saldo de serviços, de R$ 741,0 bilhões em dezembro de 2016, teve redução nominal de 8,1% em relação ao mesmo mês do ano anterior.
Juros e Inadimplência. A taxa média de juros total atingiu 32,0% a.a. em dezembro. Nas operações originadas a partir de recursos livres, esta taxa foi de 52,0% a.a. (avanço de 6,1 p.p. em relação a dezembro de 2015), sendo de 71,5% ao ano para pessoas físicas e 28,2% para pessoas jurídicas. Já no âmbito das operações de crédito com recursos direcionados, a taxa média foi de 10,7% a.a. (aumento de 0,9 p.p. frente ao mesmo mês do ano passado), sendo de 10,4% para pessoas físicas e 11,0% para pessoas jurídicas.
A inadimplência total de dezembro (3,7%) recuou 0,1 p.p. em relação a novembro. Nas operações com recursos livres, a inadimplência foi de 6,0% para pessoas físicas e 5,2% para pessoas jurídicas. Para os contratos feitos com recursos direcionados, a taxa foi de 1,7% para as famílias e 1,8% para empresas.