Análise IEDI
A restrição do crédito à recuperação
Os dados divulgados hoje pelo Banco Central deixam claro que o mercado de crédito é um importante entrave à recuperação econômica. Aos atuais níveis vertiginosos das taxas de juros cobradas nos empréstimos e dos spreads bancários, fica praticamente impossível que o crédito flua de forma a contribuir para a redinamização que se faz urgente na indústria e na economia brasileira.
A despeito da persistente contração do crédito, os juros não fizeram outra coisa que não subir consistentemente ao longo da crise. De fato, este é um mercado em que a redução do volume de negócio (concessões de novos créditos) nem de longe leva a menores preços (taxas de juros).
Entre dezembro de 2014 e outubro de 2016, isto é, do início da aguda recessão até hoje, os juros pagos pelas empresas saltaram de 24,2% a.a., em termos nominais, para 30,4% a.a.. De forma muito mais acentuada, no caso das famílias essa evolução foi de 49,6% a.a. para 73,7% a.a., níveis estes verdadeiramente inacreditáveis para quaisquer padrões internacionais. Esses valores dizem respeito apenas ao crédito livre, que de certa forma refletem mudanças na composição do financiamento, em especial para as famílias, que foram levadas a recorrer a linhas de crédito mais caras.
Dois aspectos chamam atenção. O primeiro deles é que mesmo antes da crise os níveis de juros tanto às empresas como às famílias já eram bastante elevados. O segundo é que esses níveis subiram em mais de 1/3 no período recente. Então, o crédito, que já era caro, ficou ainda mais caro.
Como os indicadores financeiros das empresas abertas para o terceiro trimestre de 2016 mostram, a queda de suas receitas devido ao recuo das vendas soma-se ao pesado fardo do pagamento de juros de seus empréstimos colocando em xeque sua rentabilidade e, por conseguinte, seus lucros acumulados e sua capacidade de investimento.
Se do lado das empresas a situação é desafiadora, o que dizer das famílias para quem os juros médios ultrapassam 70% ao ano? Nessas condições, o processo de desalavancagem das famílias é extremamente doloroso, fazendo com que o crédito demore ainda mais para retomar seu papel de indutor da demanda de bens industriais. Vale notar que entre dez/14 e out/16 a inadimplência média do crédito às famílias também subiu (de 5,3% para 6,2%), mas proporcionalmente bem menos do que os juros de seus empréstimos.
Com recessão econômica e juros subindo, não é de se estranhar o recuo das concessões de crédito desde o ano passado.
Os dados de crédito, divulgados hoje pelo Banco Central, indicaram que o saldo das operações alcançou R$3.095 bilhões em outubro, que corresponde a uma participação no PIB de 50,3%. As operações de crédito realizadas a partir de recursos livres responderam por 25,1% do PIB e a parcela com recursos direcionados, por 25,2% do PIB.
A carteira de crédito com recursos livres atingiu R$1.544 bilhões, o que representou uma retração de 0,2% frente ao mês anterior, em termos nominais. Em relação ao mesmo mês do ano anterior, a retração nominal foi de 3,7%. O valor destas operações realizadas junto a pessoas físicas correspondeu a R$802 bilhões, elevação nominal de 0,2% frente ao mesmo mês do ano anterior. Já o valor das operações junto a pessoas jurídicas alcançou R$741 bilhões, uma diminuição de 0,6% frente a outubro de 2015.
O estoque de crédito com recursos direcionados atingiu em outubro R$ 1.552 bilhões, o que representou, em termos nominais, quedas de 0,7% frente ao mês anterior e de 0,2% frente a outubro de 2015. O saldo referente a pessoas físicas foi de R$737 bilhões (aumento nominal de 6,3% sobre o mesmo mês do ano anterior), enquanto que, para pessoas jurídicas, foi de R$815 bilhões (5,4% menor do que o mês de outubro de 2015).
No mês de outubro foram concedidos R$ 270,9 bilhões em novas operações de crédito, frente a R$ 294,3 bilhões no mesmo mês do ano passado, uma variação real negativa de 7,4%. Deste volume, R$ 246,7 bilhões foram originados de recursos livres (redução de 4,5% frente ao mesmo mês do ano anterior).
Dentre as concessões de crédito às pessoas físicas a partir de recursos livres, destacaram-se as operações de cartão de crédito (R$ 91,3 bilhões), cheque especial (R$ 30,8 bilhões) e crédito pessoal (R$ 16,1 bilhões). Junto às empresas, as principais modalidades foram cheque especial (R$ 18,4 bilhões), conta garantida (R$ 17,0 bilhões), capital de giro (R$ 15,8 bilhões) e desconto de duplicatas (R$ 10,7 bilhões).
Quanto às concessões com recursos direcionados, a variação real foi de -30,2% frente a outubro de 2015, atingindo R$ 24,1 bilhões.
Nas novas concessões de crédito realizadas com recursos direcionados destacaram-se, para pessoas físicas, as modalidades de crédito rural (R$ 5,1 bilhões) e financiamento imobiliário (R$ 6,0 bilhões). Para as empresas, as principais modalidades foram crédito rural (R$ 4,0 bilhões), BNDES (R$ 5,4 bilhões) e financiamentos imobiliários (R$ 1,2 bilhões).
Setores. Do saldo total de crédito do sistema financeiro nacional, a carteira de operações para indústria alcançou R$ 758,6 bilhões, o que representa uma expansão nominal de 4,2% frente a outubro de 2015. No caso da indústria de transformação, a redução do saldo nominal de crédito foi de 9,9% nesta mesma comparação, atingindo o valor de R$ 418,4 bilhões. O setor agropecuário respondeu por R$23,5 bilhões do montante, valor 5,8% menor, em termos nominais, do que o registrado em outubro de 2015. O saldo do setor de serviços foi de R$ 741,5 bilhões, redução nominal de 5,3% em relação ao mesmo mês do ano anterior.
Juros e Inadimplência. A taxa média de juros total atingiu 33,3% a.a. em outubro. Nas operações originadas a partir de recursos livres, a taxa média foi de 54,0% a.a. (avanço de 6,1 p.p. em relação a outubro de 2015): 73,7% para pessoas físicas e 30,4% para pessoas jurídicas. Já no âmbito das operações de crédito oriundo de recursos direcionados, a taxa média foi de 11,0 % a.a. (aumento de 0,5 p.p. frente ao mesmo mês do ano passado): média de 10,2% para pessoas físicas e 12,0% para pessoas jurídicas.
A inadimplência total de setembro fica estável em 3,9%, um aumento de 0,7 p.p. em relação a outubro passado. Nas operações feitas com recursos livres, a taxa de inadimplência média registrada foi de 5,9%: 6,2% para pessoas físicas e 5,6% para pessoas jurídicas. Para os contratos feitos com recursos direcionados, a taxa média foi de 1,9% (variação de 0,3 p.p. frente ao mês anterior) %: 2,0% para as famílias e 1,8% para empresas.