IEDI na Imprensa - Indústria recua 0,2% em julho
O Globo
Resultado vem após avanço de 12,9% no mês anterior
Gabriel Martins
Após um avanço de dois dígitos em junho, a produção industrial brasileira recuou 0,2% em julho, informou o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) nesta terça-feira. A queda foi bem menor do que a projetada pelo mercado. Especialistas ouvidos pela Bloomberg indicavam que a produção ia cair 1,3% este mês. No mês anterior, o setor cresceu 12,9%, recuperando as perdas de 10,9% do mês de maio, período no qual os caminhoneiros paralisaram suas atividades por dez dias.
Na comparação com o mesmo período de 2017, a indústria teve expansão de 4%. No ano de 2018, a indústria avança 2,5%, e em 12 meses acumula alta de 3,2%.
Entre as grandes categorias econômicas, na comparação de julho com o mês anterior, apenas os Bens Intermediários tiveram desempenho positivo, com alta de 1%. Bens de Capital recuaram 6,2%, Bens de Consumo Duráveis tiveram queda de 0,4% e Bens de Consumo Semi e não Duráveis apresentaram variação negativa de 0,5%.
Já quando a comparação é feita entre julho de 2018 com igual período de 2017, Bens de Capital tiveram alta de 6,5%, Bens Intermediários subiram 3,5%, Bens de Consumo Duraveis apresentaram variação positiva de 16,9% e os Semi e não Duráveis tiveram alta de 1,8%.
Na avaliação de Tabi Thuler Santos, coordenadora da Sondagem da Indústria do FGV/Ibre, o resultado de julho deste ano veio melhor do que o mercado esperava:
— O dado de julho veio melhor do que as expectativas do mercado financeiro. Entretanto, gosto de comparar os meses de abril e julho deste ano para tentar analisar o cenário sem os efeitos da greve dos caminhoneiros. Com esta base, o índice em julho acelerou 0,3%. — indica Tabi. — Este percentual não é motivo de comemoração, porque retrata um ambiente de recuperação econômica lenta, entretanto, ele não pode ser interpretado como um resultado desanimador. De toda forma, tivemos indícios de que o período de paralisação dos caminhoneiros, na maior parte, já foi superado.
A variação negativa em julho é reflexo das taxas negativas em dez dos 26 ramos pesquisados pelo IBGE, com destaque para veículos automotores, reboques e carrocerias, que recuaram 4,5%, e produtos alimentícios, com queda de 1,7%.
Em relação aos ganhos do período, os destaques ficam com produtos químicos, com alta de 4,3% (segundo mês seguido de crescimento na produção), e outros equipamentos de transporte, com alta de 16,7% em julho (eliminando parte do recuo de 24,4% nos meses de maio e junho).
— O resultado de julho veio precedido de duas taxas de maior volatilidade, uma queda intensa em maio e um avanço acentuado em junho, que estavam diretamente relacionadas com a paralisação dos caminhoneiros. A taxa negativa pode ser explicada como uma correção da produção em junho. Como a greve afetou muito a indústria, é possível que as empresas tenham produzido mais, e agora tiveram de fazer ajustes — indica André Macedo, economista e gerente de Indústria do IBGE.
O economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale, considerou o resultado da produção industrial de julho positivo, já que avalia a retração de 0,2% como um movimento de acomodação após uma acentuada alta.
— O resultado foi dentro do esperado e mostrou que a crise ficou estanque nos meses de maio e junho. Os bens de capital, que representam investimento, continua crescendo forte, 6,5% na comparação com igual período de 2017, mostrando uma economia menos volátil. A queda de 0,2% é mais uma acomodação depois da forte alta que o houve e junho — explicou Vale.
A coordenadora da FGV diz que as projeções para a indústria no fim deste não indicam alta nas taxas de crescimento, mas apontam que o setor fechará 2018 no campo positivo.
— Se a indústria mantiver o nível de produção de julho até dezembro, ou seja, se ficar estável, o crescimento no ano será de 2,1%. Não é esperada uma alta forte até o fim do ano.
Por meio de nota, o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI) indicou que o movimento de desaceleração da produção industrial não foi causado exclusivamente pela paralisação dos caminhoneiros. Entretanto, pondera o IEDI, este fato afetou a indústria na passagem do primeiro para o segundo semestre.
"O ano de 2018, pelo menos até a sua primeira metade, foi caracterizado por uma moderação importante do dinamismo industrial. O ritmo que já era insuficiente para fazer frente às pesadas perdas do triênio de crise (2014-2016) deixou ainda mais a desejar. Como o movimento de desaceleração vem desde o começo do ano, não dá nem para responsabilizar a paralisação dos caminhoneiros do mês de maio como causa da inflexão, embora possa ter contribuído para praticamente cortar pela metade a taxa de crescimento na passagem do primeiro para o segundo trimestre do ano", analisou o IEDI.
Bens intermediários contribuem para segurar queda
Macedo, entretanto, ressalta que outras variáveis contribuem para uma produção na faixa negativa.
— Soma-se aos efeitos da greve a questão da confiança dos empresários, que limitam os investimentos, e das famílias, que reduzem gastos. Além disso, existe um grande contingente de trabalhadores fora do mercado de trabalho.
Tabi, da FGV, pontua que a volatilidade que toma conta dos cenários interno e externo pode impactar negativamente a produção industrial no país.
— Em meio a incertezas do período eleitoral e aos atritos comerciais entre grandes potências econômicas, a tendência é que os empresários retraiam seus investimentos e que as famílias reduzam seus gastos. Com volatilidade tanto interna quanto externa, é complicado fazer com que a demanda cresça e escoar a produção.
O gerente do IBGE diz que, embora seja observado um maior número de grandes categorias no setor negativo, a grande categoria que teve desempenho positivo em julho, Bens Intermediários, é a de maior peso na produção industrial, representando cerca de 60%.
— Entre os destaques desta categoria, vale ressaltar o bom desempenho de derivados do petróleo, celulose e papel e outros produtos químicos — destaca Macedo.
Ainda de acordo com o economista do IBGE, a produção industrial brasileira opera 14,1% abaixo do ponto mais elevado da série histórica, alcançado em maio de 2011. Ele pontuou que o atual patamar equivale àquele de maio de 2009.
Incerteza eleitoral pode prejudicar produção industrial
Os números certamente poderiam ser melhor, segundo Vale, se o Brasil não estivesse vivendo uma crise política desde do início do ano passado. Ele diz que economia tem mostrado resistência frente à crise e deve mostrar algum crescimento da indústria, o que deve puxar o resultado do Produto Interno Bruto (PIB), justificando a projeção da consultoria de alta de 1,6% da economia em 2018:
— Mas essa recuperação tem fôlego curto. O último trimestre deve ser de muita instabilidade política, com a incerteza sobre quem vai ganhar, que tipo de programa vai implantar, qual a base política que ele vai ter para governar. Tudo isso vai criar uma incerteza que pode novamente colocar economia em crise.
Para o economista, os candidatos que estão na frente nas pesquisas mostram fragilidades econômicas e políticas que podem é dificultar a condução dos ajustes em 2019:
— O Brasil não aguenta mais desaforo. Não é possível mais adiar ajustes, se não o Brasil entra em crise novamente.
Crise na Argentina
Macedo lembrou que um importante parceiro comercial do Brasil, a vizinha Argentina, enfrenta uma crise econômica que pode afetar a produção industrial brasileira.
— Um contingente relevante das exportações do país se destinam à Argentina. Então, uma crise em um parceiro importante traz problemas para o escoamento da produção de vários segmentos industriais. Já observamos, nos últimos meses, um comportamento de queda nas exportações para este destino — indicou. — Essa situação econômica no país vizinho pode afetar a produção do mercado doméstico nos próximos meses.
Na avaliação de Luis Otávio Leal, economista-chefe do Banco ABC Brasil, a produção do setor automobilístico pode apresentar dois comportamentos nos dados de agosto, motivados pela crise na Argentina e pelo tabelamento do frete no Brasil.
— Cerca de 70% das importações brasileiras para a Argentina estão relacionadas ao setor automobilístico. A fragilidade econômica no país vizinho, somada a uma possível recessão podem impactar negativamente o desemprenho deste setor, que é de grande importância para a indústria brasileira — indica Leal. — Entretanto, o tabelamento do frete tem feito com que grandes empresas comecem a montar frotas próprias. Por essa leitura, o setor automobilístico, por meio da produção de caminhões, pode ter números positivos em agosto.