IEDI na Imprensa - Ponto fora da curva
O Globo
Aumento da produção industrial em abril surpreende, mas não deve se sustentar no restante do ano
José Paulo Kupfer
A produção industrial, medida pelo IBGE, surpreendeu positivamente em abril. Mas o crescimento de 0,8% sobre março e de 8,9% em relação a abril de 2017 pode ser considerado um ponto fora da curva, numa trajetória de crescimento lento e descontínuo. A característica da evolução setorial nessa fase de recuperação é a ausência de força para sustentar expansão mais consistente.
Falta qualidade e impulso na evolução mais recente da indústria, como resume Rafael Cagnin, economista do IEDI, a entidade que reúne grandes empresários industriais brasileiros. Entre altas e baixas mensais, os dados ajustados mostram estagnação da produção entre outubro de 2017 e março de 2018.
Os resultados de abril expressam avanços a partir de bases baixas e, no caso do aparentemente forte crescimento interanual, um efeito-calendário — abril de 2017 teve três dias úteis a menos do que abril de 2018. A produção industrial, mesmo com o dado positivo de abril, continua 1,3% abaixo do nível alcançado em dezembro do ano passado.
Ao contribuir para paralisar parte da produção por falta de insumos, os acontecimentos de maio parecem suficientes não só para reverter a curva ascendente nos próximos meses como também para reduzir as projeções de crescimento no conjunto de 2018. As projeções para maio apontam perdas acentuadas, com contração de 5% em relação a abril e 3%, na comparação com maio de 2017.
Não são apenas os efeitos diretos da greve dos caminhoneiros que devem ser considerados na avaliação da trajetória da indústria até o fim do ano. A produção de veículos — e, em especial, a exportação de veículos —, que em abril, mais uma vez, esteve entre os segmentos que ajudaram a puxar para cima a produção industrial, tende a enfrentar dificuldades no futuro próximo.
Embora a desvalorização da taxa de câmbio possa ajudar nas exportações de manufaturados em geral, as vendas ao exterior de veículos, segmento responsável pelos melhores resultados da indústria já há algum tempo, devem sofrer perda de ritmo. O motivo é a previsível retração do mercado comprador da Argentina, o mais importante destino dos carros brasileiros no mercado externo, às voltas com mais uma crise econômica.
Também as expectativas, reforçadas pelas incertezas eleitorais e ainda mais deterioradas depois do colapso no abastecimento provocado pela paralisação do transporte rodoviário de carga, prometem atrapalhar até mesmo a incipiente recuperação da produção industrial refletida nos números de abril. Tanto que as previsões para o crescimento da indústria em 2018 já estão sendo cortadas de 3,5% para 2,5%, repetindo, caso se confirme, o ritmo de expansão observado em 2017.