IEDI na Imprensa - Indústria Pode Estar Perto de Estabilização
Publicado em: 02/06/2016
Indústria Pode Estar Perto de Estabilização
Valor Econômico - 02/06/2016
Arícia Martins
A longa e profunda crise que a indústria atravessa levou economistas a ver como resultado um pouco mais favorável a queda de 1,2% do PIB do setor entre o último trimestre de 2015 e o primeiro de 2016, feitos os ajustes sazonais, quinto recuo seguido na comparação contra o trimestre anterior. A expectativa média de 12 instituições consultadas pelo Valor Data era de retração maior: 2,1%.
Embora longe de mostrar sinais consistentes de recuperação, a avaliação é que a indústria de transformação - cuja atividade diminuiu 0,3% na passagem trimestral - já parece, ao menos, ter chegado ao "fundo do poço". Para que a produção volte a crescer, afirmam economistas, é fundamental que a taxa de câmbio permaneça em nível mais competitivo e que o Banco Central comece a cortar juros. Com essas duas condições atendidas, é possível ver um início de reação da atividade industrial a partir do fim deste ano.
De janeiro a março, a única contribuição positiva partiu da produção e distribuição de eletricidade e gás, água, esgoto e limpeza urbana, que tem peso pequeno no PIB e avançou 1,9%. A alta foi influenciada pela melhora do regime hídrico, que proporcionou o desligamento de térmicas. O PIB do setor extrativo encolheu 1,1%, ainda afetado pelo desastre da Samarco em Mariana (MG) e, também, pela paralisação de plataformas de petróleo, segundo a gerente de contas trimestrais do IBGE, Claudia Dionísio.
Apesar da relativa melhora no dado trimestral, outras comparações mostram números preocupantes: sobre o primeiro trimestre de 2015, o PIB industrial encolheu 7,3%, com retração de 10,5% na parte de transformação, de 9,6% no setor extrativo e de 6,2% na construção.
Nessa análise, a única influência positiva veio também da produção e distribuição de eletricidade, que subiu 4,2%. Nos quatro trimestres encerrados em março, o tombo do total da indústria no PIB chegou a 6,9%, contração mais forte que a observada no fim de 2015, de 6,2%.
Pelo lado da oferta, a principal explicação para a diferença entre a previsão de queda de 0,8% para o PIB no primeiro trimestre e o resultado efetivo de recuo de 0,3% foi o desempenho menos negativo da indústria, diz Luis Otávio de Souza Leal, economista-chefe do banco ABC Brasil. Leal previa contração de 2,5% para o PIB do setor, que, em sua avaliação, foi ajudado no primeiro trimestre pelo cenário mais benigno para a produção de energia elétrica e pelo processo de ajuste estoques ocorrido no setor de transformação.
"Boa parte do ajuste de estoques já foi feito no segundo semestre de 2015, o que tem provocado melhora dos índices de confiança", afirma Leal. A grande exceção é o setor automobilístico. O estoque de carros novos já diminuiu, observa o economista, mas, mesmo assim, segue bem acima do nível ideal, o que reduz a capacidade de reação do setor.
Caso ocorra um "ciclo virtuoso" no segundo semestre - em que as medidas de ajuste fiscal sejam aprovadas, abrindo espaço para uma queda do juro básico - as expectativas para o crescimento poderão melhorar, o que incentivaria a retomada na produção de bens de capital e bens duráveis, avalia Leal.
Para Júlio Gomes de Almeida, consultor do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI), o PIB do primeiro trimestre reforça a avaliação de que a atividade se estabilizou no setor de transformação. "Daí a voltar a crescer são outros 500, mas parar de cair é o primeiro sinal de que vai andar", disse.
Com a variação dos primeiros três meses de 2016, observa Almeida, o PIB da indústria manufatureira voltou ao mesmo nível do primeiro trimestre de 2004. A forte intensidade do tombo do setor na crise atual, aponta o economista, dá a dimensão da capacidade de reação da indústria daqui para frente, que, para ele, depende da manutenção do câmbio no patamar atual - que já ajudou o PIB neste início de ano - e também, do início de um ciclo de redução de juros. Nesse cenário, o PIB industrial pode voltar a crescer em algum momento do segundo semestre.
Mais pessimista, Nelson Marconi, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV), avalia que o "fundo do poço" para a indústria será atingido no próximo trimestre. Os dados divulgados pelo IBGE mostram, em sua opinião, apenas que o ritmo de queda da produção deve diminuir. O último trimestre do ano passado, pondera Marconi, pode ser considerado uma base de comparação bastante fraca e, mesmo assim, a produção física medida pelo IBGE recuou 2,1% de janeiro a março, na comparação com os três últimos meses de 2015.
A tendência declinante do investimento (que caiu 2,7% no primeiro trimestre), a crise no setor automobilístico, a alta do desemprego e a queda nas vendas do varejo não permitem ver algum alento nos últimos números do PIB industrial, argumenta Marconi, para quem o único indicador positivo é o avanço de 6,5% das exportações no primeiro trimestre. Setores industriais como alimentos e bebidas, produtos de madeira, celulose e químicos já se beneficiam do dólar mais alto, diz.
Além da permanência do câmbio no nível atual e da redução dos juros, Marconi defende a necessidade de medidas concretas por parte do governo para que a indústria volte a crescer. É preciso, segundo o professor, detalhar a composição do ajuste fiscal e lançar um programa de concessões com melhor arcabouço institucional. Nesse ambiente, as expectativas voltariam e, em consequência, o investimento. "A partir do momento em que o governo consiga montar esse quadro, em seis meses a indústria pode estar crescendo razoavelmente bem."
Os fabricantes de bens de capital e de bens duráveis têm capacidade de se recuperar rapidamente com o câmbio atual mantido e queda dos juros, concorda Almeida, do Iedi, mas, em meio à forte crise da indústria nos últimos anos, alguns segmentos estão com sua existência ameaçada, como o de produtos de informática. "A nossa indústria de computadores é uma candidata a deixar de existir." (Colaboraram Robson Sales e Alessandra Saraiva)