IEDI na Imprensa - Por Um Bom Plano, País Está Disposto a Sacrifício, Afirma Wongtschowski
Publicado em: 18/12/2015
Por Um Bom Plano, País Está Disposto a Sacrifício, Afirma Wongtschowski
Valor Econômico - 18/12/2015
Por Ligia Guimarães e Catherine Vieira
A sociedade brasileira está disposta a aceitar sacrifícios para sair da crise. Precisa, apenas, de um plano que seja capaz de capturar o "entusiasmo nacional" e, enfim, encontrar alternativas à paralisação que atinge a economia e a política. "Nenhum país comete suicídio. O Brasil há de achar uma saída alternativa para a crise", afirma Pedro Wongtschowski, presidente do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi) desde agosto deste ano e membro do conselho do Ultra. "O Brasil está preparado, e eu diria que está até ansioso, para aderir a um plano convincente que nos mostre uma saída", diz Wongtschowski.
Para dar voz à "frustração" e ampliar o espaço da indústria no debate sobre o futuro do país, o Iedi lança o documento "Para Vencer a Crise", elaborado a partir de dezenas de encontros promovidos pela entidade entre empresários, economistas e representantes do governo, e que será entregue hoje a autoridades. O lançamento ocorre na mesma semana em que outra voz da indústria, a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), anunciou apoio formal ao impeachment da presidente Dilma Rousseff.
Definido como entidade "low profile" pelo próprio presidente, o Iedi prefere não firmar posição a respeito de temas "essencialmente políticos", como o impeachment. "Cada empresário pode se posicionar", diz Wongtschowski.
O presidente do Iedi é mais taxativo, no entanto, ao opinar sobre os efeitos de uma eventual saída do ministro Levy do governo. "Eu acho ruim, uma sinalização negativa. O Levy representa a racionalidade do governo federal", afirmou ele. A retirada do grau de investimento do país por mais uma agência de rating, diz Wongtschowski, terá efeito ainda mais grave que o do primeiro rebaixamento. "O custo de captação de recursos para o país será a partir de agora maior", afirma.
Os ativos das 39 empresas que assinam o documento - entre elas Vale, Gerdau, Natura, Embraer, Ambev e Klabin - equivalem a 28,5% do Produto Interno Bruto (PIB), de acordo com cálculo do Valor Data. Dos debates no Iedi participaram nomes como Joaquim Levy, Luciano Coutinho, Armando Monteiro, José Serra, Delfim Netto e José Roberto Mendonça de Barros.
Na visão da entidade, a reativação da indústria depende hoje muito mais de ações no plano macroeconômico. O instituto propõe, por exemplo, que a política industrial evite subsídios, exceto para a inovação ou situações específicas em que o apoio faça sentido. A seguir, os principais trechos da entrevista:
Valor: Qual foi a intenção do documento? Faltava uma voz da indústria em meio à crise?
Pedro Wongtschowski: O Iedi julgou importante, nas circunstâncias do momento, se posicionar e deixar claro que há questões de natureza conjuntural que afetam a performance da economia brasileira. Há, também, um conjunto de questões de ordem estrutural. Temos certa frustração por não ter visto, até agora, nenhum projeto econômico que capture o entusiasmo nacional, que é uma coisa possível e necessária. A adesão da sociedade viabiliza a aceitação de sacrifícios: trabalhadores, investidores, pessoas físicas e pessoas jurídicas.
Valor: Haverá esse apoio?
Wongtschowski: O Brasil está preparado, e eu diria que até ansioso, para aderir a um plano estruturado e convincente que nos mostre uma saída. E se esse plano implicar restrições e sacrifícios, acho que o Brasil está preparado para aceitá-los. Uma das razões desse documento é a explicitação dessa frustração a respeito da ausência de um plano nacional que mostre um horizonte de longo prazo.
Valor: Nas propostas, a agenda fiscal vem antes da agenda de política industrial. É intencional?
Wongtschowski: As duas coisas vêm juntas, elas têm uma ordem lógica. É só a maneira de colocar. Não diria que é uma prioridade, mas é evidente que a questão fiscal é urgente. Um déficit fiscal [nominal] de 10% do PIB é obviamente insustentável. Mais do que isso, há algo errado com um país que paga 9% do seu PIB de juros. Há algo errado com um país em que a taxa de retorno do investimento na indústria tem sido sistematicamente menor que o custo de capital. Qual é o incentivo do investimento industrial no Brasil com as taxas de juros vigentes? Se um investidor pode optar por comprar títulos do Tesouro Nacional, garantidos pela União e indexados à inflação. Quem investe na atividade industrial hoje são os teimosos. E os que têm a vocação de fazê-lo.
Valor: Como ele foi feito?
Wongtschowski: O Iedi tem um pequeno corpo técnico, liderado pelo Julio Gomes de Almeida, e a forma de atuar são reuniões periódicas com economistas, autoridades do governo, discussões entre os empresários e os conselheiros do Iedi. Tivemos conversas recentes com Joaquim Levy, Luciano Coutinho, Armando Monteiro, Antonio Delfim Neto, José Roberto Mendonça de Barros. Essas reuniões se destinam, primeiro, a organizar a cabeça dos empresários e formar consensos. E, segundo, a ouvir diretamente a visão das pessoas do governo e também dar a eles a visão da indústria brasileira.
Valor: A Fiesp se declarou a favor do impeachment. O Iedi tem posição sobre isso?
Wongtschowski: Não. Não houve discussão, essa é uma questão política e cada empresário pode se posicionar. O Iedi não vai assumir posição sobre uma questão política. O Iedi assume posições, no nosso documento, sobre a situação da economia e da indústria no Brasil. Mas, óbvio, reconhecemos que há um impasse político, uma dificuldade imensa do governo. O governo vai precisar - qualquer governo, para ser eficaz - constituir maioria parlamentar para poder governar. Para poder colocar de pé um projeto de governo. E este governo não conseguiu construir uma maioria, o que é realmente um problema que tem inibido, em parte, a ação. Isso precisa de algum tipo de solução. Qual? O sistema político vai definir.
Valor: Qual a percepção dos empresários sobre a crise atual?
Wongtschowski: Os números são dramáticos. Não me recordo de outra época no Brasil em que tivemos redução da atividade industrial de 7%, 7,5%. E há a perspectiva de que 2016 não será melhor, podendo até ser pior. A maioria dos analistas fala de uma faixa entre 2% e 3% de redução do PIB em 2016. O que significa que, em um período de dois anos, o Brasil vai ter perdido 7%, 8% da sua atividade econômica. E a indústria, 15%, o que é um desastre.
Valor: E as exportações ainda não subiram...
Wongtschowski: O ganho da balança até agora se deu muito mais pela queda das importações do que pelo aumento das exportações. Hoje se forma um consenso no Brasil, e as projeções dos economistas indicam isso também, de que dificilmente o câmbio retornará a valores inferiores a R$ 3,50. As projeções para 2016 variam entre R$ 3,50 e R$ 4,50. É uma indicação de que há, na prática, um piso de dólar imposto pelas circunstâncias, pela realidade da economia brasileira. A exportação será um atenuante para a grave crise no mercado interno, no que tange à indústria. Mas leva tempo.
Valor: Dá para prever quando?
Wongtschowski: As projeções que eu vi falam, em 2016, em um superávit comercial variando entre US$ 30 bilhões e US$ 50 bilhões. Puxado por três fatores: redução de importação, em certa medida causada por recessão, substituição de importação e exportação.
Valor: No documento, o Iedi não pede subsídios, mas uma política industrial mais estratégica.
Wongtschowski: O ministro Armando Monteiro focou, com muita propriedade, em um primeiro momento, no Plano Nacional de Exportação. Um conjunto de medidas positivas, necessárias. Mas tem muito mais coisa para fazer: o objetivo final tem que ser uma indústria mais forte, mais produtiva, mais competitiva, mais inovadora.
Valor: Inovação é o grande foco?
Wongtschowski: No caso da inovação temos um caso muito concreto, que não abordamos no documento, que é mais conceitual, genérico. Mas é a questão da Lei do Bem, que é um incentivo fiscal universal - todos os países têm um incentivo fiscal à inovação -e o incentivo fiscal à inovação é expressamente permitido por todas as regras da OMC. Teve um efeito muito positivo, por exemplo, de atração de centros de pesquisa. Grande número de empresas, entre outros fatores em função da Lei do Bem, e também obviamente do potencial da economia brasileira, trouxeram seus centros de pesquisas para o Brasil. E, de repente, em uma penada, o governo resolve suspender os efeitos da Lei do Bem, o que retira da economia um componente essencial, que é a previsibilidade e a manutenção dos contratos.
Valor: A indústria foi maltratada nas decisões de ajuste?
Wongtschowski: O governo tem uma dificuldade. Todo benefício, seja de que natureza for, tem um interessado, e um interessado jus sperniandi, que tem direito de protestar. Cabe ao governo e ao Legislativo avaliar os casos e, em prol da solidez da situação fiscal, o que deve ou não ser feito. O que é essencial, o que é acessório, o que pode ser tirado. Nesse caso, mexer na Lei do Bem acho que é um equívoco, porque aponta na direção errada.
Valor: O documento cita que não deveria haver política de subsídio, exceto para inovação.
Wongtschowski: Existem circunstâncias específicas que fazem sentido. As políticas de conteúdo nacional são úteis, necessárias, desde que moderadas, quando não têm intenção protecionista, mas sim de desenvolver a capacidade produtiva nacional. E que sejam temporárias, transitórias. Atendendo essas condições, são positivas, devem ser usadas com moderação. O documento cita a linha de renovação de máquinas. O parque industrial brasileiro, de um lado, é velho. Não todo ele, mas, na média, é. De outro lado você tem a indústria de bens de capital com grande ociosidade. Então é um casamento perfeitamente possível e útil para o Brasil.
Valor: Caberia um incentivo do governo aí?
Wongtschowski: Um incentivo do governo, durante prazo determinado, para permitir a reconstrução da indústria de bens de capital e a modernização da indústria brasileira. Mecanismo inteligente. Pode-se fazer uma depreciação acelerada, por exemplo, de quem trocar a máquina.
Valor: E o Reintegra?
Wongtschowski: É um ótimo exemplo. É uma restituição parcial de impostos embutidos em produtos exportados. A desoneração do investimento e da exportação devem ser princípios centrais de qualquer política industrial. E a desoneração das exportações é difícil de ser plenamente atingida. Então sobram resíduos e impostos nos produtos exportados. Esses resíduos foram estimados em estudo do Iedi entre 5% e 7%, dependendo do setor industrial. Fixar o Reintegra em 3%, a despeito de insuficiente, é razoável. E compensa impostos que fazem parte do produto exportado. E por que é importante? Muitos produtos brasileiros têm margens muito pequenas na exportação. Então 3% do faturamento pode representar a diferença entre exportar e não exportar. O Reintegra não é um incentivo complementar, desnecessário ou perfunctório. É componente central da viabilidade da exportação de muitos produtos industriais.
Valor: A desoneração da folha pode ser revertida?
Wongtschowski: Conceitualmente, em certos setores intensivos em mão de obra, cobrar tributação trabalhista em função do faturamento faz todo sentido. Mas o governo abriu demais o leque e se tornou inviável pelo buraco que causou nas contas da Previdência.
Valor: O BNDES tem diminuído de tamanho, o mercado de capitais pode voltar a crescer?
Wongtschowski: Precisamos implantar o capitalismo no Brasil, o capitalismo de massas. Onde eu, você, somos acionistas de empresas, sócios do desenvolvimento no Brasil. O tamanho da bolsa brasileira, cerca de US$ 500 bilhões. A do Canadá: US$ 2 trilhões. Austrália: US$ 1,5 trilhão. Índia: US$ 1,6 trilhão. Reino Unido, de tamanho parecido com a brasileira: US$ 2,7 trilhões. Isso melhora padrões de governança, porque as empresas têm que se esforçar para se manter na bolsa, reduz o custo de capital, reduz o risco das empresas, reduz o endividamento e torna-as mais propícias a inovar. Transforma a população em sócios do crescimento, reduz a tensão entre o capital e o trabalho, porque o capital passa a ser dos trabalhadores.