IEDI na Imprensa - Potencial transformador
Potencial transformador
Folha de São Paulo - 03/07/2015
Pedro Luiz Passos
Empreendedorismo de alto impacto, voltado à tecnologia, pode acelerar reencontro com desenvolvimento
Na busca pela retomada do desenvolvimento, o Brasil não pode prescindir da capacidade transformadora do empreendedorismo de alto impacto, aquele que gera efeitos econômicos e sociais consistentes por intermédio de dois fatores cruciais para a competitividade: a inovação e o dinamismo que imprime ao mercado.
Essa não é a realidade do país. Existe aqui um terreno fértil para a disseminação do empreendedorismo, mas falta ênfase em iniciativas com conteúdo tecnológico disruptivo, como revela o Global Entrepreneurship Monitor, projeto conduzido pela London Business School. Segundo o levantamento, um terço dos brasileiros entre 18 e 64 anos dedica-se ao próprio negócio, maior índice entre 68 países pesquisados.
Tais números criam a falsa ideia de que temos uma economia dinâmica e empreendedora. Infelizmente, estamos distantes disso.
Boa parte dos pequenos empresários adotou o caminho como via de escape ao desemprego ou à carência de perspectivas profissionais --ou seja, por necessidade, não por opção. São mais prestadores de serviço do que empreendedores. Estes se caracterizam pelo desejo de inovar e crescer continuamente.
Sem ações específicas, esse quadro não mudará. Para incentivar o empreendedorismo de fundo tecnológico, responsável por grandes transformações mesmo em economias destacadas pelo gigantismo de seus grupos empresariais, como EUA e Coreia do Sul, é necessário estreitar as conexões entre empresas e universidades. É o que ocorre nos EUA.
Lá pesquisadores e alunos são estimulados a levar ao mercado o resultado de seus estudos, criando um celeiro riquíssimo de start-ups, tal como tem ocorrido aqui em polos de incubação e aceleração de empresas emergentes, localizados em Porto Alegre, em Campinas e no Recife. No exterior, há exemplos inspiradores de reorientação econômica voltada ao empreendedorismo. Em Nova York, a parceria do setor público com a iniciativa privada permitiu a construção do novo campus da Universidade Cornell, onde centros de pesquisas conviverão com incubadoras de negócios.
Os recursos vieram da prefeitura, da universidade e, note-se, de contribuições privadas --Charles Feeney, empresário americano que fez fortuna com lojas duty free, doou US$ 350 milhões.
São projetos que podem se tornar o embrião de cadeias de produção e serviços, graças à escala gerada a partir da concentração geográfica.
Nesse sentido, uma experiência do Chile merece atenção. Trata-se do programa Start-Up Chile, vinculado a uma agência de fomento local, que atraiu 22 empreendedores de 14 países para se instalar em Santiago.
Todos recebem visto de trabalho de um ano e US$ 40 mil. A contrapartida é que os negócios apresentem potencial de crescimento e alcance internacional, estimulando, assim, a integração do país à economia global --objetivo, aliás, dos programas de incentivo ao empreendedorismo que se revelam exitosos.
A China concede bolsas de estudo a jovens talentos em universidades dos EUA não só de graduação, mas também para fundar uma start-up antes de retornar. O sucesso na empreitada não é fundamental, já que o intuito é imprimir aos futuros empresários uma visão global para sua atuação corporativa.
A orientação para uma política de apoio ao empreendedorismo está, enfim, desenhada e contempla duas vertentes: a inovação tecnológica e a inserção internacional. Um bom começo seria evitar que iniciativas como os polos de incubação e aceleração já existentes fossem submetidas ao contingenciamento de verbas que atinge diversos programas oficiais. Com o caminho traçado, cabe ao governo demonstrar disposição para segui-lo.
PEDRO LUIZ PASSOS, 63, empresário, é presidente do IEDI (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial) e conselheiro da Natura. Escreve às sextas-feiras, a cada 14 dias, nesta coluna.