IEDI na Imprensa - Ganho nos EUA não compensa perda com a China e a Argentina
Ganho nos EUA não compensa perda com a China e a Argentina
Valor Econômico - 03/03/2015
Marta Watanabe
A expectativas dos exportadores brasileiros para 2015 estão voltadas para os Estados Unidos, país que deve manter crescimento este ano, embora com ritmo de aceleração moderado. O Brasil tenta uma reaproximação com os Estados Unidos, mas pelos cálculos dos analistas, eventual melhora no saldo comercial com os americanos não deverá compensar totalmente resultados mais desfavoráveis nas trocas com argentinos e chineses. No ano passado, a melhora no saldo com os Estados Unidos - na verdade uma redução de déficit - foi de US$ 3,4 bilhões, mas a redução de saldo positivo com os argentinos e chineses somou US$ 8,4 bilhões: US$ 5 bilhões a mais.
Mesmo assim o quadro econômico americano desperta mais entusiasmo para a balança comercial que o da China, que deve crescer, mas desacelerar, e que o da Argentina, que deve continuar com a economia em declínio. China, Estados Unidos e Argentina são, nessa ordem, os principais parceiros comerciais do Brasil.
José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), destaca o comportamento dos saldos comerciais como os três países no início do ano dá um pouco da dificuldade que o exportador terá em 2015. No primeiro bimestre o déficit com os Estados Unidos foi de US$ 795 milhões, menos que a metade dos US$ 1,85 milhão em saldo negativo de iguais meses de 2014. O déficit com a China, porém, foi de US$ 3,6 bilhões, 83% maior, na mesma comparação. Com a Argentina o Brasil teve superávit, de US$ 223 milhões, menor que o saldo de US$ 296 milhões dos dois primeiros meses de 2014.
"Claro que o primeiro bimestre não representa o comportamento do ano todo, já que a exportação ainda é fraca tanto para manufaturados quanto para commodities, sem os embarques de soja, ainda", pondera Castro.
A comparação com igual período do ano anterior indica, porém, que a relação bilateral com os americanos não conseguirá compensar os efeitos do comércio com chineses e argentinos, diz Castro. Ele lembra que provavelmente o Brasil deve terminar este ano com déficit no comércio com os argentinos. A última vez que houve saldo negativo foi em 2003. No ano passado, as trocas com a Argentina renderam superávit de US$ 138,9 milhões, uma clara redução em relação aos US$ 3,15 bilhões de 2013.
Ao mesmo tempo, o resultado do comércio entre Brasil e China também corre risco de ficar negativo, diz Castro. O saldo positivo com os chineses vem desde 2009, mas o superávit perdeu vigor ano passado. De US$ 8,72 bilhões em 2013, recuou para US$ 3,28 bilhões em 2014. Para Castro, se não houver déficit com os chineses este ano, o superávit será bem pequeno.
É nesse cenário que se situa o comércio com os EUA, país com o qual o Brasil registra déficit desde 2009. A melhora de resultado esperada com os americanos, portanto, é uma redução do saldo negativo, que já aconteceu no ano passado. Em 2014 o déficit foi de US$ 7,97 bilhões, menor que os US$ 11,37 bilhões do ano anterior, mas superior aos US$ 5,67 bilhões de 2012.
"A exportação brasileira para os Estados Unidos não é pautada por commodities, como no caso da China. A elevação de exportação, portanto, passa pela melhora do desempenho dos manufaturados e nesse tipo de bem não há explosão de exportação", diz Castro. Além disso, analisa ele, a economia americana deve crescer, mas com aceleração gradativa.
"Os Estados Unidos são o destino mais promissor para este ano em razão do cenário favorável da economia, mas o crescimento não será bombástico e o exportador precisa ir atrás para retomar mercado", diz Silvio Campos Neto, economista da Tendências. A consultoria estima crescimento americano de 2,9% para 2015, com avanço em relação aos 2,4% de 2014.
Rogério César de Souza, do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), concorda que a expectativa dos exportadores de manufaturados está nos Estados Unidos. Nisso, a desvalorização do real em relação ao dólar é favorável a quem quer vender no mercado externo. Ele lembra, porém, que o exportador brasileiro não é único que olha para o mercado americano. Com os demais mercados importantes ainda sem crescimento, diz ele, a concorrência é forte e o que definirá a conquista de mercados será a competitividade. "O Brasil vai se valer do crescimento americano, mas haverá grande competição."
Para Souza, dificilmente haverá compensação do mercado americano para as perdas que o Brasil terá em mercados como o da China e da Argentina. A China é um destino tradicional das commodities brasileiras, lembra ele, enquanto os embarques para os argentinos estão mais atrelados ao setor de bens de capital e ao automobilístico. Para os Estados Unidos, as oportunidades de crescimento mais imediatas, diz, estão ligadas aos segmentos têxtil, de calçados e siderúrgico.
De qualquer forma, diz Campos Neto, o quadro americano e seu impacto para a balança brasileira este ano é mais animador que o da China, que deve seguir crescendo bem, mas em desaceleração, o que afeta a exportação brasileira de commodities agrícolas e metálicas. Depois de uma expansão de 7,4% em 2014, diz Campos Neto, a avaliação é de que a economia chinesa cresça 6,9% em 2015. Enquanto isso a Argentina deve sofrer nova contração, com recuo de 1,5% do PIB este ano.
Enquanto a reversão do quadro argentino é uma incógnita, a balança com a China depende do comportamento do preço das commodities. Castro estima que as negociações dos dois principais produtos exportados pelo Brasil ao país asiático não devem contribuir para uma melhora de saldo. A AEB estima que o preço médio do minério de ferro deve cair de US$ 75 a tonelada em 2014 para US$ 55 a tonelada este ano. O preço médio da soja deve baixar de US$ 510 a tonelada em 2014 para US$ 400 este ano.
Isso, avalia Castro, deve reduzir a exportação em ritmo maior do que a provável redução das importações de produtos made in China em razão da queda da demanda doméstica.