IEDI na Imprensa - "Mais Importante que a Alta do Dólar Será a Atuação do BC"
"Mais Importante que a Alta do Dólar Será a Atuação do BC"
Brasil Econômico - 31/07/2013
Segundo o economista-chefe do Iedi, Rogério César de Souza, a depreciação cambial pode não ser tão benigna para a indústria.
Gustavo Machado
Muito se espera dos efeitos positivos que a alta do dólar pode exercer sobre a indústria. No início dos anos 2000, a desvalorização cambial foi a grande responsável pelo fim do déficit comercial do Brasil com seus parceiros.
Agora, segundo o economista-chefe do Iedi, Rogério César de Souza, a depreciação cambial pode não ser tão benigna para a indústria.
Ele conta que muitas companhias contrataram fornecedores estrangeiros e a dependência de insumos importados é maior. Além disso, alerta, a alta volatilidade do câmbio é o maior dos problemas.
Porque já se inverteu o entusiasmo do início deste ano com a indústria e os investimentos?
Boa parte da piora das perspectivas está atrelada ao resultado da indústria no primeiro semestre. Se a economia brasileira patinou mais nesse semestre, ou se ficou aquém do que era esperado, isso se deve à indústria. Vemos que o governo tem dificuldade em desatar o nó do investimento. Mas há uma perspectiva positiva para a indústria e também para os investimentos públicos em infraestrutura, que aparecerão mais nesse segundo semestre.
Em maio a indústria foi excepcionalmente ruim. Junho deve repetir os mesmo números?
Maio teve algumas peculiaridades. Um movimento de gangorra em diversos setores importantes; cresceram muito em alguns meses e depois despencaram. Ficou claro nesses primeiros meses que alguns segmentos estão fazendo estoques ou tentando adaptá-los. O ramo de alimentos caiu 4,4% em maio, depois de crescer 4,3% em abril. O setor de máquinas e equipamentos caiu 5%, mas tinha registrado alta de 9%. A expectativa é que a indústria comece a apresentar um resultado mais próximo dos bens intermediários, com alta de 0,2% a 0,3% ao mês. Achamos que a indústria está mais ou menos por aí. Na média, a trajetória será essa, de crescimento tímido e até mesmo frágil.
Alguma projeção para junho?
Não dá para prever o que aconteceu com os estoques nesse mês. Há uma volatilidade muito grande e dificulta a análise pontual. É possível que, no final do ano, a indústria feche em 2,5%. Um crescimento bom, mas nada para soltar rojões, já que em 2012 caiu 2,6%.
Quais setores puxam a alta?
Bens de capital e bens de consumo duráveis. Ano passado tiveram um desempenho muito ruim. Os bens de capital caíram 11,8%; duráveis, 3,4%. Agora, crescem 3,3% e 4,6%, respectivamente. Isso é bom, mesmo com os anabolizantes, como as reduções de IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados). Além deles, refino de petróleo e aviões.
O dólar tem ajudado?
Bastante. Mas vale lembrar que uma grande volatilidade não é boa para ninguém. Prejudica principalmente os exportadores. A atuação do Banco Central para amenizar isso é importante.
A indústria, hoje, é mais dependente das importações?
Realmente há essa questão, mas é difícil mensurar. Depois do câmbio sobrevalorizado por tanto tempo, muitas empresas estabeleceram relações internacionais de fornecimento. Em termos de bens de capital, várias empresas já adquiriram máquinas e renovaram seus equipamentos a tempo. Mas as que criaram laços terão novos problemas de custo de produção.
Alguns veem essa integração como algo positivo, que trás competitividade.
Sabemos que muitas empresas deixaram de ter fornecedores domésticos, que passaram a ser estrangeiros. Não sei até que ponto isso é facilmente reversível.
No início dos anos 2000, a desvalorização cambial teve um efeito instantâneo sobre as exportações. Hoje, a desvalorização ajuda menos que àquela época?
O câmbio tem muitos efeitos sobre a indústria. Ele ainda explica muito da evolução recente. A desvalorização irá colaborar para que as exportações aumentem. Se ajuda menos ou mais do que antes, não sei. O fato é que contribuirá positivamente. Mais importante que a desvalorização, será o papel do Banco Central em evitar a volatlidade e dar segurança ao mercado. Ele não deve influenciar a taxa de câmbio de longo prazo. Ele deve deixar essa taxa livre, mas amenizar as oscilações. Isso é o que o empresário necessita neste momento.
Qual é a taxa de câmbio de equilíbrio para a indústria?
Acho que é mais ou menos essa taxa de R$ 2,30. Se contássemos o que a valorização nos atrapalhou, ela deveria ficar um pouco mais desvalorizada. Mas sem variações abruptas. Uma taxa que deveríamos buscar pelos próximos dois anos.
Os incentivos fiscais foram determinantes para essa reação?
Entre os empresários que tenho conversado, o entendimento é de que ajudaram. Se não garantiram a alta da produção, não deixaram cair tanto. No têxtil, um segmento que vem caindo bastante, ajudaram a segurar um pouco a produção. Estancou o sangramento.
As margens estão sendo apertadas pelo custo de produção e concorrência externa?
Nos mais diversos segmentos o movimento é exatamente esse. O custo cresce a taxas maiores que os preços e indica que a indústria está perdendo margem. Ela não consegue passar para frente essa alta justamente pela concorrência. A saída dela é tentar ser mais produtiva. Para isso precisa incorporar mais tecnologias, mais inovação e a chave para isso são os investimentos. Há também questões internas, a lição de casa. Hoje a indústria pensa que tem que sobreviver, e investir com essa expectativa não é fácil.
Existe um problema de produtividade da mão de obra?
Depois de 2008, vimos que a produção caiu mais que o emprego. É a tese de que a indústria segura os trabalhadores com a expectativa de que a situação iria mudar. Isso não é mais assim. O emprego está caindo em alguns setores, em outros está estagnado. A perspectiva é de que, se a produção retomar, é possível que o emprego volte a se recuperar em um prazo um pouco mais longo.
Mas essa produtividade é problema da demanda ou da capacidade da mão de obra?
Normalmente, é o capital humano que olhamos para falar de produtividade. Mas no âmbito geral, há uma conjunção desses dois fatores (trabalhadores e demanda). É fato que, quanto mais tecnologia e capital humano, tem-se o crescimento da produtividade. Mas as coisas caminham juntas. Se houver demanda, a oferta tenta atender.
O novo ciclo de aperto monetário modifica o cenário?
Isto não deve influenciar tão cedo. Depende da magnitude do aperto, mas a variável que favorecerá ou não a indústria é o andamento da economia brasileira e dos parceiros comerciais mais próximos.
Quanto ao governo, como vê sua comunicação?
O governo, desde a época do Lula, tem uma boa disposição para conversar com a indústria. Mas acho que parte das políticas não são bem sucedidas. Participei de algumas reuniões de política industrial e fiquei impressionado com as boas ideias que foram colocadas à mesa. Mas quando são feitos os anúncios, os pacotes, estão longe de uma política industrial. Essa política deveria ser uma política de estado, não de governo. É preciso uma política que conduza a indústria e que seja explicada com clareza. Do ponto de vista do Iedi, faltam políticas de longo prazo.
Como vê a contaminação da queda de confiança?
Boa parte desses indicadores de confiança mostra que a expectativa está caindo, mas muitos deles ainda estão em campo positivo. Uma variável importante para as expectativas são as taxas de juros, que estão em patamares favoráveis para fomentar os investimentos. Por outro lado, há a questão da demanda, não apenas doméstica, mas internacional. A confiança reflete todas essas preocupações.