Desde o início de 2016, a indústria vem dando os
primeiros passos na direção de uma trajetória
de reativação de sua produção. É
bom que se diga que este estágio é marcado mais
por desacelerações do ritmo das quedas do que por
um retorno a taxas positivas, mas, se tudo der certo, será
representativo do início da recuperação industrial.
Por isso, todo cuidado é pouco neste momento em que mesmo
os setores que mostram sinais de reação estão
extremamente fragilizados e muito sujeitos a revezes.
A Análise
IEDI de hoje aborda o tema do desempenho industrial do primeiro
semestre de 2016 segundo a intensidade tecnológica de seus
setores, agrupados em quatro faixas: alta, média-alta,
média-baixa e baixa, que seguem a classificação
adotada pela OCDE. Vejamos, em primeiro lugar, a trajetória
recente da indústria de transformação como
um todo.
Se em 2014
teve início uma nova recessão industrial e 2015
foi o ano em que o mergulho da indústria se intensificou,
o primeiro trimestre de 2016 trouxe uma estabilização
das perdas para, no trimestre seguinte, ocorrer uma moderação
substancial da queda da produção industrial, cujo
índice registra quase metade do patamar da redução
do final do ano passado. Os resultados da indústria de
transformação do terceiro trimestre de 2015 até
o segundo trimestre de 2016, ilustram bem essa trajetória:
em ordem, -10,8%, -12,4%, -11,0% e, agora, -5,7%, sempre frente
ao mesmo período do ano anterior.
Para que a
volta ao crescimento da indústria pudesse acontecer mais
rapidamente, implicando numa inconteste trajetória de recuperação,
alguns elementos dinamizadores, hoje ausentes, deveriam entrar
em cena, a exemplo da redução dos juros, da retomada
dos investimentos em infraestrutura, da volta do crédito,
da melhora do emprego, bem como do estancamento da apreciação
cambial que testemunhamos nesses primeiros seis meses do ano.
O câmbio
em um nível competitivo é essencial porque o setor
externo tem sido uma importante fonte de dinamismo para a indústria.
No primeiro semestre de 2016, o quantum das exportações
de manufaturados teve elevado crescimento (10,6%), ao que se deve
somar ainda um processo de substituição de importações.
Além
da válvula de escape da crise via setor externo, a indústria
pode estar sendo beneficiada por outro fator. A já prolongada
recessão da economia vai tornando mais difícil que
empresários e famílias adiem indefinidamente certos
gastos de investimento e de consumo. A defesa da competitividade
das empresas e a preservação do nível de
consumo das famílias abrem oportunidade para o desengavetamento
de alguns desses gastos, especialmente diante de uma melhora,
ainda que insuficiente e muito recente, da confiança de
empresários e consumidores. Vale mencionar ainda que a
existência de estoques ajustados desde o início de
2016 é outro fator favorável para a indústria.
Os dados mostram
com muita clareza que a moderação da crise industrial
em 2016 tem sido alavancada por uma rápida redução
do patamar de queda das indústrias de alta e média-alta
intensidade tecnológica, que foram as que mais caíram
em 2015, e pela quase estabilização da indústria
de baixa intensidade tecnológica. A única faixa
que ainda não deu sinais de reação foi a
de média-baixa tecnologia. A seguir, a evolução
de cada uma dessas faixas é acompanhada em maiores detalhes.
A indústria
de alta tecnologia, que viu quedas em torno -20% ao longo de todos
os trimestres de 2015, recuou para patamares substancialmente
mais baixos nos dois primeiros trimestres de 2016 (-15,6% e -5,9%,
frente ao mesmo período do ano anterior). Dois de seus
setores conseguiram voltar a crescer neste ano: aeronáutica
e aeroespacial, no segundo trimestre (+0,4%), algo que não
ocorria desde o último trimestre de 2014, e farmacêutica,
cuja produção teve não só crescimento,
mas aceleração na primeira metade do corrente ano
(+1,3% no primeiro trimestre e +2,5% no segundo).
Já
os setores do complexo eletroeletrônico, que também
compõem a faixa de alta intensidade tecnológica,
continuam apresentando declínio, mas a taxas bem menores
do que em trimestres passados. No caso de material de escritório
e informática, que é um dos componentes deste complexo
e que viu sua produção despencar -50% no terceiro
trimestre de 2015, agora vivencia uma retração que,
apesar de ainda muito dura, corresponde à metade desse
percentual (-24,8% no 2º trim/2016). No caso de aparelhos
de rádio, TV e comunicação, a moderação
da queda é ainda muito recente, somente ocorrendo do primeiro
para o segundo trimestre de 2016 (de -36,7% para -15,7%).
A indústria
de média-alta tecnologia seguiu a mesma tendência
em linhas gerais. Suas perdas foram caindo gradativamente no decorrer
dos últimos trimestres (-21,5% no último trimestre
de 2015 para -18,8% e -7,9% nos dois trimestres de 2016). Nenhum
de seus setores chegaram a apresentar taxa positiva de crescimento,
mas a indústria química (exceto farmacêuticos)
ficou bem perto disso (-0,8% no trimestre findo em jun/16).
É nesta
faixa que se concentram os setores líderes da crise industrial,
mas que agora dão uma contribuição fundamental
para um desempenho não tão ruim tanto para a indústria
de média-alta tecnologia como para o setor industrial como
um todo.
Exemplos muito
ilustrativos disto vem dos setores de bens de capital e de veículos,
que compõem este grupo. Tanto em máquinas e equipamentos
elétricos quanto em máquinas e equipamentos mecânicos
as perdas foram reduzidas bastante na passagem do primeiro para
o segundo trimestre de 2016 (de -20,1% para -5,5%, no primeiro
caso e de -23,6% para -7,3% no segundo). Já a moderação
da queda da produção no caso de veículos
teve início antes, na entrada deste ano. Desde o quarto
trimestre de 2015 até o segundo de 2016 as taxas foram
de -34,0%, -27,8% e -14,0%.
O fato de
essas duas faixas de alta e média-alta intensidade tecnológica
terem assumido trajetórias semelhantes é um bom
indício, já que compreendem setores mais pró-cíclicos
e com maiores efeitos de encadeamento para o conjunto do setor
industrial. O aspecto ruim dos resultados é que taxas negativas
ainda bastante elevadas persistem na maioria dos setores dessas
mesmas faixas.
A faixa de
baixa intensidade tecnológica tradicionalmente é
menos pró-cíclica e na presente crise dá
sinais de caminhar mais claramente para o retorno ao crescimento.
Ao longo da atual recessão sua produção caiu
acompanhando apenas de longe os grandes líderes da retração
industrial (sua maior queda, de -6,2% ocorreu no terceiro trimestre
de 2015). Atualmente, está virtualmente estabilizada com
declínio de -0,8% no segundo trimestre de 2016.
A essencialidade
dos bens produzidos por setores desta faixa (a exemplo de alimentos)
e sua boa inserção no comércio internacional
lhe conferem o comportamento cíclico já assinalado,
de ter menor amplitude do que as demais faixas, funcionando como
um colchão amortecedor para a indústria. Com um
câmbio mais realista, pôde começar a reativar
sua produção. Apesar disso, convém salientar
que, por depender da massa de rendimentos e ter cadeias produtivas
mais curtas, os setores dessa faixa não são candidatos
típicos a liderar uma recuperação puxando
a indústria como um todo.
Muito dessa
evolução recente da faixa de baixa tecnologia se
deve à produção de alimentos, bebidas e tabaco,
que depois de dois anos de contração, acaba de voltar
ao terreno positivo (+3,3% no segundo trimestre de 2016). Mesmo
o setor de têxteis, couro e calçados, que ainda declina,
parece estar numa situação um pouco menos complicada
(-15,2% no 4º trim/15 e -5,4% no 2º trim/16). Em ambos
os casos, o câmbio mais competitivo foi fundamental, ampliando
exportações e possibilitando substituir importações.
O câmbio
também beneficiou o setor de madeira, papel e celulose,
outro componente da faixa de baixa intensidade tecnológica,
que, como se sabe, goza de competitividade internacional. Suas
perdas já baixaram expressivamente e parecem caminhar para
a estabilidade (passaram de -11,3% no último trimestre
de 2015 para apenas -1,9% no segundo de 2016).
Por fim, a
indústria de média-baixa intensidade tecnológica
permanece presa na crise que, em seu caso, se prolonga desde o
final de 2013. Do último trimestre de 2015 ao segundo de
2016, suas retrações não saem do entorno
de -10%. Neste caso, aspectos conjunturais, apenas, não
explicam todo o problema.
Em produtos
metálicos, por exemplo, que acusa perdas superiores a -10%
há mais de quatro trimestres seguidos, sofre internamente
com a crise recente da indústria automobilística
e de construção civil, importantes demandantes de
seus produtos, mas também está sujeita a uma forte
concorrência internacional devido ao excesso de capacidade
no mundo (sobretudo na siderurgia).
Derivados
de petróleo, por sua vez, caíram quase -10% no segundo
trimestre de 2016, enquanto minerais não metálicos
continuam também caindo muito (-13,4% e -10,4% nos dois
trimestres de 2016).
O único
setor de média-baixa intensidade tecnológica que
conseguiu arrefecer sua queda (de -15,7% no primeiro trimestre
para -6,2% no segundo trimestre de 2016) foi o de borracha e produtos
plásticos, cuja aderência ao clico econômico
tende a ser mais importante que a dos demais da mesma faixa.