A economia brasileira enfrenta o segundo ano seguido de recessão.
Do ponto de vista do equilíbrio financeiro das empresas
não financeiras, observou-se a deterioração
dos indicadores de rentabilidade e de endividamento, sob forte
influência, depois de 2010, do aumento das despesas financeiras.
A Carta IEDI
de hoje analisa os dados sobre distribuição do valor
adicionado a partir dos resultados apresentados nos Demonstrativos
de Valor Adicionado de 129 empresas industriais selecionadas entre
2013 e 2015. Constata-se, além da queda da rentabilidade,
uma perda de capacidade de o setor industrial reter lucros que,
em face à conjuntura de profunda incerteza e contração
da demanda agregada, resulta na dificuldade das empresas em responder
a uma eventual melhora conjuntural do cenário econômico
com o aumento dos investimentos.
Entre 2013
e 2015, o valor adicionado total das empresas da amostra permaneceu
praticamente estagnado em termos nominais, na faixa de R$ 400
bilhões ao ano com pouca variação anual.
O ano de 2015 foi o de maior valor com R$ 417 bilhões e
o de menor foi 2014 com R$ 391 bilhões. Notou-se retração
nominal significativa do valor adicionado gerado nas atividades
ligadas à construção civil, mineração
e siderurgia.
Embora o valor
agregado total tenha crescido nos demais setores, o aumento da
participação de remuneração do capital
de terceiros não permitiu folga para o acréscimo
dos lucros retidos, pelo contrário, dada a rigidez das
demais divisões da distribuição do valor
adicionado – gasto com pessoal, tributos e dividendos –
os lucros retidos ficaram negativos, como forma de suportar o
crescimento das despesas financeiras.
O governo
se apropriou da maior parcela do valor adicionado pelo conjunto
da indústria. Entre 2013 e 2015, a sua participação
foi em média de 41,0% do total. Isto significou um volume
de tributos da ordem de R$ 499 bilhões no acumulado do
período. Os bancos, por sua vez, vêm logo em seguida,
com uma parcela de apropriação do valor adicionado
não muito diferente daquela do governo: R$ 443 bilhões
ou 36% do total, no acumulado de 2013 a 2015. Já os empregados,
em terceiro lugar, ficaram com R$ 297 bilhões do valor
adicionado, isto é, 25% do total acumulado no período.
Houve um pequeno
acréscimo na participação no valor gasto
com pessoal durante o período, concentrado sobretudo no
ano de 2015.
A participação
dos tributos decaiu durante o período, acompanhando o ritmo
da atividade econômica. Vale salientar que antes da queda,
a participação dos tributos alcançou cerca
de um terço no total do valor adicionado, excluindo a Petrobras
da amostra: em 2013, ano de expansão econômica, a
indústria destinou R$ 72,5 bilhões para tributos
(33,8% do total).
Assim como
a participação dos gastos com pessoal, a distribuição
de resultados aos acionistas demonstrou também certa estabilidade
durante o período, indicando que há certa regularidade
na distribuição de resultados apesar das condições
da economia.
Nota-se aumento
significativo da participação da remuneração
do capital de terceiros, sobretudo para o ano de 2015. Excluindo
a Petrobras da amostra, a participação salta de
34,7% para 62% entre 2013 e 2015, o que demonstra o impacto do
processo de fragilização financeira do setor industrial.
Embora o aumento
das despesas financeiras tenha sido disseminado em todos os setores,
houve concentração principalmente nos setores de
bens intermediários, construção civil e material
de construção. O impacto pode ser observado no comportamento
dos lucros retidos durante o período, que atingiu no agregado
participação negativa em 2015. Este resultado deveu-se
exclusivamente a perda contabilizada na Vale da ordem de R$ 40
bilhões. Excluindo-se este valor, as empresas acumularam
R$ 4,1 bilhões de lucros retidos com queda nominal de 56,5%
em relação a 2014
Destacam-se
prejuízos acumulados para um grupo significativo de setores
em 2015, principalmente entre os setores de bens intermediários
e para a construção civil e material de construção,
mas de forma extensa houve a redução contínua
dos lucros retidos nos resultados anuais para todos os setores.
A retração
dos lucros acumulados impactou a capacidade de investir do setor
industrial, que apresentou queda dos investimentos para um conjunto
de setores, em especial, novamente bens intermediários,
construção civil e material de construção.
A exceção
fica por conta dos setores de papel e celulose e siderurgia, entre
os bens intermediários, que aumentaram seus investimentos,
mas também sua exposição financeira, acumulando,
em alguns casos importantes, prejuízos significativos no
período.
Excluídas
as empresas dos setores de papel e celulose e siderurgia e a Petrobras,
a Vale e a JBS, 121 companhias industriais adquiriram ativos imobilizados
da ordem de R$ 24,4 bilhões em 2013. De lá para
cá, este montante diminuiu para R$ 21 bilhões em
2014 e para R$ 19,5 bilhões em 2015 com queda de 20,1%
no período. Dentre as categorias de uso, o pior desempenho
foi em bens intermediários com queda de 44,6% entre 2013
e 2015 no agregado sem as empresas dos setores Siderúrgico
e de Papel e celulose, a Petrobras e a Vale.
Os dados em
conjunto sugerem que o agravamento da situação econômica
no país inseriu algumas cadeias produtivas – em especial,
bens intermediários, material de construção
e construção civil – em um processo de fragilização
financeira, em que as receitas operacionais correntes deixaram
do cobrir as despesas financeiras.
No caso de
não haver um fator de aumento da demanda agregada ou dos
preços em alguns setores vinculados ao mercado exterior,
o processo de fragilização financeira deverá
aumentar devido ao acréscimo dos níveis de endividamento.