É inegável que a crise atual da economia brasileira
tem determinantes domésticos, mas não devemos subestimar
as dificuldades que teimam em persistir no cenário externo.
Por isso, a Carta IEDI, a ser divulgada hoje, avalia a evolução
recente e as perspectivas para a economia global em 2016 e 2017,
a partir da edição de abril do World Economic
Outlook (WEO) do Fundo Monetário Internacional (FMI).
A conclusão é que o Brasil não poderá
contar muito com a economia internacional para superar sua crise.
As novas projeções
do Fundo preveem uma expansão de 3,2% da economia mundial
em 2016, cifra 0,2 ponto percentual (p.p.) inferior àquela
divulgada em janeiro, que também tinha recuado 0,2 p.p
frente à estimativa de outubro (3,6%). Dado que o desempenho
global foi de 3,1% em 2015, o cenário básico desse
organismo multilateral sugere que a economia mundial andará
de lado em 2016.
A estimativa
de crescimento para 2017 também foi revista para baixo
(de 3,6% em janeiro para 3,5% em abril), mas em menor intensidade
do que aquela de 2016. Embora a previsão aponte para uma
recuperação ligeiramente maior (de +0,2 p.p. para
+0,3 p.p frente a 2016), o cenário continua sendo decepcionante.
Como sintetiza
o título da recente publicação do FMI, o
crescimento econômico mundial está “too
slow, too long”, ou seja, muito baixo por muito tempo.
Esse diagnóstico fica evidente na trajetória do
Produto Interno Bruto (PIB) global nos períodos anterior
e posterior à crise financeira e à grande recessão.
Na fase de
boom, entre 2003 e 2007, a média de crescimento
foi de 5,1%. Em contrapartida, na fase pós-crise (2010-2015),
a média foi de apenas 3,5%, já que, após
a retirada prematura dos estímulos fiscais, as políticas
monetárias não convencionais foram insuficientes
para manter o maior dinamismo registrado no biênio 2010-11.
A partir de 2012, a economia global voltou a crescer mas em num
patamar inferior a 4%, padrão que, segundo o FMI, perdurará
até 2017.
O maior pessimismo
do FMI para 2016 reflete a redução das projeções
tanto para as economias avançadas como para as economias
emergentes e em desenvolvimento. No caso das primeiras, o desempenho
de 2016 deverá repetir 2015 (1,9%), enquanto em outubro
e janeiro as previsões eram de aceleração
do crescimento (2,2% e 2,1%). No âmbito das economias emergentes
e em desenvolvimento, a previsão de abril aposta em ligeira
aceleração do crescimento, dos 4% registrados em
2015 para 4,1% em 2016, o que representa um corte de 0,4 p.p.
da previsão feita em outubro passado.
A piora no
cenário das economias emergentes e em desenvolvimento em
relação à previsão anterior decorreu
de dois fatores. Em primeiro lugar, do impacto maior do que o
anteriormente previsto da desaceleração chinesa
sobre as demais economias desse grupo, por canais diretos (queda
das importações) e indiretos (queda dos preços
das commodities).
Em segundo
lugar, os ingressos de capitais nessas economias atingiram no
segundo semestre de 2015 seu menor patamar desde a crise financeira
global. Além das expectativas de alta da taxa básica
de juros dos Estados Unidos, que se confirmaram em dezembro, contribuíram
para isso a turbulência financeira na China no terceiro
trimestre de 2015 e as incertezas sobre o impacto da desaceleração
desse país sobre as demais economias emergentes.
Ou seja, o
impacto das mudanças na dinâmica da economia chinesa
sobre essas economias não se restringe mais ao comércio
mundial, como observado antes da crise financeira global. No contexto
atual, essas mudanças também se propagam por canais
de transmissão financeiros.
Nesse contexto,
quem mais deve sofrer são os países da América
Latina, sobretudo os exportadores de commodities e os mais dependentes
de financiamento externo. Para 2016, a projeção
de crescimento do PIB latino-americano passou de +0,8%, em outubro,
para -0,5% em abril. A revisão para baixo do Brasil foi
o principal determinante: -3,8% em 2016 (mesmo patamar de 2015),
contra as projeções de -1% e -3,5% realizadas em
outubro e janeiro.
Já
em 2017, o FMI prevê uma relativa aceleração
do PIB global, passando de 3,2%, em 2016, para 3,5%. Isso seria
resultado essencialmente do desempenho das economias emergentes
e em desenvolvimento, devido sobretudo aos seguintes fatores:
(1) normalização gradual das condições
macroeconômicas nas economias em situação
de stress desde 2015; (2) reequilíbrio bem sucedido
da economia chinesa, o que significa manutenção
de taxas de crescimento elevadas, embora menores do que nas duas
últimas décadas; (3) recuperação da
atividade econômica nos países exportadores de commodities,
embora num ritmo também mais modesto que no passado.
O perigo é
que todas essas hipóteses que fundamentam a perspectiva
de melhora do dinamismo mundial em 2017 não venham a se
verificar de fato. É o que sugere o fato de a probabilidade
do cenário básico para 2016 e 2017 se confirmar
ter sido reduzida em comparação com as duas edições
anteriores do WEO em função de riscos de natureza
econômica e não econômica (associados a conflitos
geopolíticos, terrorismo e fluxos de refugiados).
Isso significa
dizer que não apenas o desempenho mundial tem sido decepcionante
como tem aumentado o peso da incerteza sobre ele. Em consequência,
o Brasil não deve poder contar muito com a melhora da economia
internacional para ajudá-lo a superar a crise econômica
em que se encontra.