É muito provável que um dos símbolos do modelo
de crescimento dos últimos anos da economia brasileira
tenha sido atingido em cheio neste ano. O consumo crescente de
uma variedade de bens e serviços realizado pela população
brasileira em mais de uma década dá sinais de forte
recuo. Ou ainda, tal consumo, que já foi associado a mudanças
na estrutura de classes do País, parece ter sofrido um
baque em 2015.
Como se sabe,
os números do PIB divulgados na semana passada pelo IBGE
assinalaram uma retração do consumo das famílias
no primeiro trimestre deste ano, algo que não acontecia
desde o terceiro trimestre de 2003 – na série que
compara trimestre com igual trimestre do ano anterior. Os números
da produção industrial divulgados hoje pelo mesmo
Instituto mostram que a crise da indústria passou a refletir
de modo mais acentuado essa queda no consumo das famílias.
Há uma crise aberta no consumo popular de produtos industriais.
A crise da
indústria brasileira é geral. Em abril último,
a produção despencou em todos seus grandes setores
e na maioria de seus ramos produtivos. Nos setores de bens de
capital e de bens duráveis, a crise é notadamente
drástica. No setor de bens intermediários, ela avança
a passos não tão largos, mas persistentemente. No
entanto, é no setor de bens de consumo semi e não
duráveis que a crise industrial adicionou, neste ano, um
novo agravante. É neste setor que se observa diretamente
a queda do consumo das famílias brasileiras.
Vale lembrar
que, em 2014, quando a atividade produtiva da indústria
brasileira em geral caiu 3,2%, a produção industrial
do setor de bens de consumo semi e não duráveis
ficou praticamente estagnada, ou ainda, ela recuou pouco (–0,2%)
– sobretudo se comparada às quedas na produção
de bens de capital (–9,2%), bens duráveis (–9,1%)
e mesmo de bens intermediários (–2,7%). Já
no acumulado dos quatro primeiros meses deste ano, a produção
de bens de consumo semi e não duráveis não
mais resistiu e caiu 6,8%.
É o
pior primeiro quadrimestre registrado para esse setor em toda
a série histórica do IBGE, iniciada em 2003, superando
mesmo períodos difíceis da economia e da indústria
como os anos de 2003 e de 2009.
É fato
que em alguns ramos da indústria de bens de consumo semi
e não duráveis os índices de produção
já não eram bons desde o ano passado, ou ainda,
que em alguns deles já foram observados resultados mais
adversos em anos anteriores – como o de vestuário
e calçados, por exemplo. No entanto, a situação
é hoje, para muitos deles, gravíssima: no segmento
de vestuário, a produção acumulou a expressiva
queda de 13,7% em janeiro-abril deste ano frente igual período
de 2014. No de calçados, a queda foi 3,2% na mesma comparação.
Em outros
segmentos, no entanto, a crise é “nova”. Exemplo,
a indústria de bebidas, outro importante ramo do setor
de bens de consumo semi e não duráveis, onde a produção
caiu 7,0% no primeiro quadrimestre deste ano. Foi o pior resultado
para um primeiro quadrimestre na história recente (desde
2003) desse segmento. O mesmo vale para a fabricação
de sabões, detergentes, produtos de limpeza, cosméticos,
produtos de perfumaria e de higiene, cuja produção
recuou 4,5% no acumulado janeiro-abril último.
Mais um exemplo:
a retração de 18,7% na fabricação
de produtos farmoquímicos e farmacêuticos nos quatro
primeiros meses deste ano está, muito provavelmente, ligada
à retração do consumo das famílias,
mas aqui pode haver também a transferência da produção
doméstica para o exterior. Não se poderia deixar
de citar o segmento de alimentos, cuja produção
recuou 1,4% no primeiro quadrimestre. É uma queda relativamente
mais moderada e que reflete a essencialidade de sua produção.
Se a crise
da indústria brasileira foi identificada com a falta de
competitividade de seus produtos relativamente aos bens importados,
com as expectativas cadentes dos empresários quanto aos
seus negócios e, consequentemente, com as baixas taxas
de investimento, ela vem sendo agravada com o fraco andamento
da economia brasileira nos últimos anos e se aprofunda,
neste início de 2015, com a queda do consumo das famílias
decorrente do aumento do desemprego e da diminuição
do rendimento médio real das pessoas ocupadas.
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