2 de junho de 2015

Indústria
A crise é também do consumo popular


  

 
É muito provável que um dos símbolos do modelo de crescimento dos últimos anos da economia brasileira tenha sido atingido em cheio neste ano. O consumo crescente de uma variedade de bens e serviços realizado pela população brasileira em mais de uma década dá sinais de forte recuo. Ou ainda, tal consumo, que já foi associado a mudanças na estrutura de classes do País, parece ter sofrido um baque em 2015.

Como se sabe, os números do PIB divulgados na semana passada pelo IBGE assinalaram uma retração do consumo das famílias no primeiro trimestre deste ano, algo que não acontecia desde o terceiro trimestre de 2003 – na série que compara trimestre com igual trimestre do ano anterior. Os números da produção industrial divulgados hoje pelo mesmo Instituto mostram que a crise da indústria passou a refletir de modo mais acentuado essa queda no consumo das famílias. Há uma crise aberta no consumo popular de produtos industriais.

A crise da indústria brasileira é geral. Em abril último, a produção despencou em todos seus grandes setores e na maioria de seus ramos produtivos. Nos setores de bens de capital e de bens duráveis, a crise é notadamente drástica. No setor de bens intermediários, ela avança a passos não tão largos, mas persistentemente. No entanto, é no setor de bens de consumo semi e não duráveis que a crise industrial adicionou, neste ano, um novo agravante. É neste setor que se observa diretamente a queda do consumo das famílias brasileiras.

Vale lembrar que, em 2014, quando a atividade produtiva da indústria brasileira em geral caiu 3,2%, a produção industrial do setor de bens de consumo semi e não duráveis ficou praticamente estagnada, ou ainda, ela recuou pouco (–0,2%) – sobretudo se comparada às quedas na produção de bens de capital (–9,2%), bens duráveis (–9,1%) e mesmo de bens intermediários (–2,7%). Já no acumulado dos quatro primeiros meses deste ano, a produção de bens de consumo semi e não duráveis não mais resistiu e caiu 6,8%.

É o pior primeiro quadrimestre registrado para esse setor em toda a série histórica do IBGE, iniciada em 2003, superando mesmo períodos difíceis da economia e da indústria como os anos de 2003 e de 2009.

É fato que em alguns ramos da indústria de bens de consumo semi e não duráveis os índices de produção já não eram bons desde o ano passado, ou ainda, que em alguns deles já foram observados resultados mais adversos em anos anteriores – como o de vestuário e calçados, por exemplo. No entanto, a situação é hoje, para muitos deles, gravíssima: no segmento de vestuário, a produção acumulou a expressiva queda de 13,7% em janeiro-abril deste ano frente igual período de 2014. No de calçados, a queda foi 3,2% na mesma comparação.

Em outros segmentos, no entanto, a crise é “nova”. Exemplo, a indústria de bebidas, outro importante ramo do setor de bens de consumo semi e não duráveis, onde a produção caiu 7,0% no primeiro quadrimestre deste ano. Foi o pior resultado para um primeiro quadrimestre na história recente (desde 2003) desse segmento. O mesmo vale para a fabricação de sabões, detergentes, produtos de limpeza, cosméticos, produtos de perfumaria e de higiene, cuja produção recuou 4,5% no acumulado janeiro-abril último.

Mais um exemplo: a retração de 18,7% na fabricação de produtos farmoquímicos e farmacêuticos nos quatro primeiros meses deste ano está, muito provavelmente, ligada à retração do consumo das famílias, mas aqui pode haver também a transferência da produção doméstica para o exterior. Não se poderia deixar de citar o segmento de alimentos, cuja produção recuou 1,4% no primeiro quadrimestre. É uma queda relativamente mais moderada e que reflete a essencialidade de sua produção.

Se a crise da indústria brasileira foi identificada com a falta de competitividade de seus produtos relativamente aos bens importados, com as expectativas cadentes dos empresários quanto aos seus negócios e, consequentemente, com as baixas taxas de investimento, ela vem sendo agravada com o fraco andamento da economia brasileira nos últimos anos e se aprofunda, neste início de 2015, com a queda do consumo das famílias decorrente do aumento do desemprego e da diminuição do rendimento médio real das pessoas ocupadas.
   

 
Segundo dados divulgados pelo IBGE, a produção industrial de abril registrou variação negativa de 1,2% frente a março na série livre de influências sazonais, após ter apresentado estabilidade no mês anterior. Na comparação com abril de 2014 a indústria assinalou queda de 7,6%. Dessa forma, a indústria acumulou decréscimo de 6,3% nos primeiros quatro meses do ano, em comparação com o mesmo período de 2014. O indicador acumulado dos últimos doze meses frente a igual período imediatamente anterior apresentou variação negativa de 4,8%.

Entre as categorias de uso na comparação com o mês imediatamente anterior, todas as categorias de uso assinalaram queda na produção industrial. O setor de bens de capital foi a categoria com maior queda ao recuar 5,1%. O resultado das demais categorias foi: bens de consumo semi e não–duráveis (–2,2%), bens de consumo duráveis (–1,8%) e bens intermediários (–0,2%).

Todos os índices por categorias de uso na comparação com igual mês do ano anterior apresentaram taxas negativas: bens de capital (–24,0%), bens de consumo duráveis (–17,1%), bens de consumo semi e não–duráveis (–9,3%) e bens intermediários (–3,2%).
No acumulado do ano, bens de capital (–19,7%), bens de consumo duráveis (–16,0%) e bens de consumo semi e não–duráveis (–6,8%) foram as categorias com maior queda na produção, enquanto o segmento de bens intermediários (–2,9%) teve recuo inferior a média nacional (–6,3%).

O recuo de 1,2% da indústria entre março e abril alcançou 19 dos 24 ramos pesquisados, com destaque para as perdas registradas por veículos automotores, reboques e carrocerias (–2,5%), perfumaria, sabões, detergentes e produtos de limpeza (–3,3%), máquinas, aparelhos e materiais elétricos (–5,4%), outros equipamentos de transporte (–8,5%), metalurgia (–2,4%), produtos farmoquímicos e farmacêuticos (–5,3%), produtos de metal (–2,5%), produtos de borracha e de material plástico (–2,3%), bebidas (–2,2%), celulose, papel e produtos de papel (–2,2%), equipamentos de informática, produtos eletrônicos e ópticos (–3,2%), produtos alimentícios (–0,4%) e máquinas e equipamentos (–1,2%). Por outro lado, os maiores impactos positivos foram a indústria extrativa e coque, produtos derivados do petróleo e biocombustíveis (ambos com avanço de 1,5%).

 

 
Na comparação com abril de 2014, a produção industrial mostrou queda de 7,6%, influenciada pelo recuo da produção de vinte e três dos vinte e seis ramos pesquisados. As maiores influências negativas ficaram a cargo de: veículos automotores, reboques e carrocerias (–23,2%), coque, produtos derivados do petróleo e biocombustíveis (–8,4%), equipamentos de informática, produtos eletrônicos e ópticos (–32,6%), produtos farmoquímicos e farmacêuticos (–23,5%), máquinas e equipamentos (–11,8%), de metalurgia (–9,8%), bebidas (–13,1%), produtos de borracha e de material plástico (–8,7%), confecção de artigos do vestuário e acessórios (–13,0%), produtos de metal (–8,8%), máquinas, aparelhos e materiais elétricos (–10,1%) e outros equipamentos de transporte (–13,9%), enquanto a atividade que mais contribuiu positivamente foi a indústria extrativa (11,1%).

No índice acumulado para o acumulado de janeiro a abril de 2015, frente a igual período do ano anterior, a queda de 6,3% foi impulsionada pelo recuo de 24 ramos dos 26 ramos investigados, com destaque para: veículos automotores, reboques e carrocerias (–21,3%), coque, produtos derivados do petróleo e biocombustíveis (–7,9%), equipamentos de informática, produtos eletrônicos e ópticos (–28,5%), máquinas e equipamentos (–9,1%), produtos farmoquímicos e farmacêuticos (–18,7%), metalurgia (–7,3%), confecção de artigos do vestuário e acessórios (–13,6%), produtos de metal (–7,8%), bebidas (–7,1%), produtos de borracha e de material plástico (–5,9%), produtos de minerais não–metálicos (–5,4%), produtos alimentícios (–1,4%), outros produtos químicos (–3,0%) e de máquinas, aparelhos e materiais elétricos (–4,8%), enquanto a indústria extrativa registrou ampliação de 10,5%.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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