O desastre da exportação

Julio Gomes de Almeida – Ex-Secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda e Professor do Instituto de Economia da Unicamp

Brasil Econômico – 06/03/2015

Os dados fechados para 2014 mostram o estado a que o país chegou na exportação industrial. Os resultados da pesquisa feita pelo Iedi a partir de uma classificação da OCDE para produtos da indústria de transformação são um bom ponto de partida para uma análise por parte dos formuladores de nossa política econômica. As vendas de bens industriais para o exterior tiveram no último triênio um declínio generalizado em seus 19 setores. A queda foi em média de 3,4% ao ano entre 2012 e 2014, com perdas de exportação em valor que alcançaram US$ 10 bilhões. Para quem tem uma economia fragilizada e com poucas alternativas de crescimento e que, ademais, enfrenta dificuldades também na exportação de bens primários (onde a queda no triênio foi ainda maior, 5,3%), tais resultados deveriam ter merecido uma nova política de exportação de manufaturados.

Para se ter ideia da abrangência do mau resultado, 14 dos setores da indústria tiveram declínio na média dos últimos três anos, sendo também este o número de setores que declinaram suas vendas ao exterior em 2014. A fase negativa não poupou nenhum dos segmentos por intensidade tecnológica, exceto o da indústria de alta tecnologia, graças ao desempenho da indústria Aeronáutica e aeroespacial, leia-se Embraer. Mesmo assim, a exportação de alta tecnologia teve variação zero de 2012 a 2014 e queda de 0,7% no último ano desse período. Muito expressivos foram os índices negativos em Material de escritório e informática (-12%) e, principalmente, em Equipamentos de rádio, tv e comunicação (-22%).

Em média-alta tecnologia, onde se concentram os ramos da metal-mecânica, incluindo Bens de capital e Veículos automotores e, ainda, Produtos químicos e Máquinas e equipamentos elétricos, a redução média foi a maior entre todas as demais: 6,9%. O resultado desse grupo, que penalizou todos os seus cinco setores, foi progressivamente se ampliando até alcançar 13,5% em 2014. A perda de vendas da indústria automobilística em mercados da América do Sul tem parcela elevada de responsabilidade nesse caso.

Já em média-baixa tecnologia e em baixa tecnologia a variação negativa menor, de 2,3% em ambos os casos, preservou a característica central do desempenho exportador dos últimos anos no que diz respeito à alta abrangência de maus resultados entre os setores. Alguns ramos, no entanto, lograram aumentos dignos de registro, casos de Produtos minerais não-metálicos, Madeira, papel e celulose e Têxteis, couro e calçados.

Em suma, estamos diante de um quadro de exportação de bens industriais que combina: 1) um persistente e já prolongado período de declínio; 2) o mau resultado não reflete a influência de determinado ou determinados segmentos por intensidade tecnológica; e 3) os índices negativos são abrangentes também no que diz respeito aos 19 setores da indústria de transformação.

Sendo esta uma crise exportadora na qual uma prolongada valorização do real foi fator decisivo, a recente desvalorização da moeda poderá determinar sua superação. Não sabemos, contudo, o tempo necessário para que isso ocorra, já que ao longo dos últimos 20 anos fomos deixando para trás mercados relevantes, não fechamos contratos de longo prazo de exportação e o setor industrial brasileiro foi minimizando o investimento de baixo ou inexistente retorno voltado ao comércio exterior. Por outro lado, ninguém é capaz de afiançar quanto tempo perdurará o atrativo excepcional do câmbio que, por outro lado, é prejudicial para as empresas que financiaram suas operações em dólar e montaram estratégias de defesa de seus custos com base na importação de insumos.

À prova de qualquer oscilação da conjuntura, restaria como incentivo exportador o Reintegra, criado em 2011 para ressarcir os exportadores de uma parcela dos impostos incidentes sobre as exportações que não são passíveis de recuperação. Desse ponto de vista, o governo errou ao modificar mais uma vez o instrumento, reduzindo sua incidência (de 3% para 1% das exportações) e, mais importante, introduzindo um componente de incerteza entre os exportadores sobre a continuidade do programa.


Julio Gomes de Almeida é Ex-Secretário de Política Econômica do
Ministério da Fazenda e Professor do Instituto de Economia da Unicamp