A perspectiva para o varejo

Julio Gomes de Almeida – Ex-Secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda e Professor do Instituto de Economia da Unicamp

Brasil Econômico – 13/02/2015

Alguns traços devem ser destacados na análise de como foi o desempenho do varejo em 2014 e como está delineado seu percurso nesse início de 2015. O aumento em volume das vendas do comércio restrito (que não inclui os ramos de Veículos, motos, partes e peças e Material de construção) chegou a 2,2% no ano passado, um índice baixo para os padrões do varejo, que ao longo de muitos anos crescera a taxas próximas a 10%. Mas não foi de todo ruim, se tivermos em conta que outros setores da economia brasileira — notadamente a indústria e os serviços associados à manufatura — acusaram retrocesso.

De certa forma, este índice é parte de um “pouso” relativamente suave do varejo: este crescera 8,4% em 2012 e 4,4% no ano seguinte para chegar à taxa já referida de 2,2% no ano passado. Isto permitiu ao setor acomodar seu ritmo de investimento, que até 2013 fora muito intenso, e preservou sua capacidade de honrar compromissos decorrentes de sua acentuada expansão. Também preservou o nível de emprego gerado pelo setor. Ou seja, tendo sido um dos líderes de crescimento na economia em anos anteriores, o varejo não voltou atrás naquilo que pode ser considerado sua maior contribuição à economia brasileira no período recente: a geração líquida de empregos combinada com uma grande formalização do trabalho.

É evidente que o comércio varejista entrou em nova fase após a desaceleração de 2013/2014, o que significa dizer que as empresas deverão a partir de agora adequar toda a sua estratégia de negócio, já que, talvez por alguns anos, o setor poderá ter evolução muito baixa ou mesmo negativa. A propósito, índice negativo teve o chamado varejo ampliado já em 2014 (-1,7%), devido a um forte revés no segmento de Veículos, motos, partes e peças (-9,4%) e a uma estagnação (variação zero) das vendas de Material de construção. Ou seja, tais segmentos anteciparam o que pode ser uma tendência generalizada do varejo proximamente.

A esse respeito cabe sublinhar uma característica que notabilizou os meses finais do ano passado. Em sua maioria, os ramos varejistas tiveram variação positiva em 2014, mas isso correspondeu ao desempenho médio do ano, não à performance dos seus meses finais, o que reforça a possibilidade de que pelo menos em boa parte de 2015 o varejo se depare com quedas de vendas de forma generalizada entre seus ramos.

Tomemos o caso de Hipermercados, supermercados, alimentos, bebidas e fumo, que é o de maior dimensão no varejo. Suas vendas aumentaram 1,3% no ano com um todo de 2014, mas nos três meses finais desse mesmo ano caíram 0,2%. Outro exemplo vem do importante segmento de Móveis e eletrodomésticos, com aumento de 0,6% no ano, porém queda de 1,2% no último trimestre.

Em um caso houve desaceleração nos meses finais, porém mantendo o resultado no terreno positivo: Combustíveis e lubrificantes teve aumento de 2,6% na média do ano passado como um todo, mas variação de apenas 1,2% no último trimestre. Em outros segmentos, 2014 já registrou declínio que se repetiria no último trimestre. Foram os casos de Tecidos, vestuário e calçados, com redução de 1,1% no ano como um todo e queda de 1% no trimestre final, e Livros, jornais, revistas e papelaria, cujos percentuais foram, respectivamente, de -7,7% e -9,4%. Em Equipamentos e materiais para escritório, informática e comunicação houve também queda no ano (-1,7%), mas o último trimestre registrou melhora de 4,7%.

Somente dois segmentos não acusaram qualquer abalo em sua trajetória anterior, caracterizada pelo elevado crescimento: Artigos farmacêuticos, médicos, ortopédicos, de perfumaria e cosméticos e Outros artigos de uso pessoal e doméstico (onde têm destaque as lojas de departamento) elevaram suas vendas reais em 2014 em 9% e 7,9%, respectivamente, sem mostrar desaceleração no último trimestre.

Portanto, o varejo, embora tenha logrado obter um crescimento positivo no ano passado, provavelmente nesse momento está registrando retração, um processo que desde 2003 não se assistia no setor se for excetuado o ano de crise global de 2009.


Julio Gomes de Almeida é Ex-Secretário de Política Econômica do
Ministério da Fazenda e Professor do Instituto de Economia da Unicamp