A economia no limiar de 2015

Julio Gomes de Almeida – Ex-Secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda e Professor do Instituto de Economia da Unicamp

Brasil Econômico – 19/12/2014

A economia brasileira na virada de 2014 para 2015 não poderia deixar de mostrar sinais mais negativos. A impressão que se tem é que estão sendo agravados fatores já conhecidos do quadro econômico e se dissolvendo os poucos determinantes de um melhor nível de atividade. Setor a setor e segundo cada item de demanda, o estado da economia é o seguinte. A indústria propriamente, segundo a divulgação do PIB para o terceiro trimestre do ano, interrompeu uma recessão, mas as últimas pesquisas da CNI e da FGV já sugerem queda de produção e aumento de estoques em novembro, prenunciando retrocesso para o início do ano que vem.

O mesmo se pode dizer sobre a indústria de construção, onde, novamente, as perspectivas levantadas junto aos empresários pela CNI indicam um quadro de adversidade da produção para esse final de ano e baixa perspectiva de reação no início do ano. Convém observar que aqui também os últimos dados do PIB haviam sinalizado para o terceiro trimestre de 2014 o fim da recessão do setor.

No varejo, há uma nítida melhora de vendas no período pós Copa do Mundo, mas isso só se aplica se o conceito utilizado é o de “varejo restrito”, um indicador que não inclui o comércio de automóveis e de materiais de construção. O conceito de “varejo ampliado”, denota queda consistente nos últimos meses e perspectiva de continuidade desse estado de coisas no início do ano que vem. A Fecomercio antecipa um Natal de 2014 apenas equivalente ao do ano passado.

Ainda que serviços seja destacadamente o mais forte e dinâmico empregador da economia, os segmentos que acabamos de reportar têm dimensão relevante no mercado de trabalho, de modo que uma onda de desemprego nesses setores servirá de mecanismo de realimentação da retração da atividade econômica.

Nem mesmo em serviços os indicadores do IBGE são favoráveis, pois acusam desaceleração consistente das vendas nominais, o que seguramente já leva a taxas negativas nos meses finais do ano. Além desta sinalização, um importante indício de que o setor acumula crescentes sinais de debilidade é o próprio desempenho do consumo familiar, que nos três últimos trimestres teve crescimento muito próximo a zero. Esta é uma indicação de perda gradativa de impulso do setor, talvez traduzindo-se em queda na virada para 2015.

O investimento deve ser analisado sob três perspectivas. Primeiramente, no investimento em setores básicos, a inversão da Petrobrás, segundo anúncio recente de sua presidente, deverá declinar, assim como se espera queda em infraestrutura. Neste último caso, porque aí poderá recair uma parcela do ajuste fiscal em curso e porque o programa de concessões deve continuar em compasso de espera, como ocorreu em 2014.

Em segundo lugar, dependerá da melhora das expectativas que o ajuste fiscal se propõe a promover, mas cabe sublinhar que as expectativas a que nos referimos é a dos empresários que decidem o investimento e não as avaliações do mercado financeiro, as quais não necessariamente coincidem. Muito grave para o investimento e o nível de atividade poderão ser os desdobramentos das restrições financeiras para pagamentos de seus fornecedores por parte da Petrobrás e a interrupção do fluxo de obras por parte das grandes construtoras envolvidas no Lava Jato. Trata-se de uma cadeia muito relevante que poderá sofrer um efeito dominó com amplas consequências para o resto da economia.

Finalmente, taxa de juros em alta — em que magnitude e em que prazo, ainda não se sabe — e restrição de recursos para o BNDES — cuja intensidade também não é conhecida — são temas adicionais de uma regressão das inversões que, caso não sejam tomados os cuidados necessários, poderá superar em 2015 a marca negativa de 2014 (-5%).

Pouco se pode esperar do setor externo como via de escape de curto prazo para dar vida a uma economia com perspectiva recessiva no limiar de 2015, haja vista a queda apurada nas vendas externas de manufaturados até outubro (-10%) e a fase já não favorável vivida pela exportação de commodities.

Modular em cada passo a execução do ajuste fiscal, da taxa de juro, dos preços administrados e do câmbio é o mínimo recomendável para uma economia em frangalhos.


Julio Gomes de Almeida é Ex-Secretário de Política Econômica do
Ministério da Fazenda e Professor do Instituto de Economia da Unicamp