A crise da exportação

Julio Gomes de Almeida – Ex-Secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda e Professor do Instituto de Economia da Unicamp

Brasil Econômico – 14/11/2014

O ano de 2014 chamou a atenção para a crise vivida pela exportação brasileira. Seu desempenho pífio, que sequer é capaz de cobrir as importações — que também regridem devido à crise da economia — ocasiona um déficit comercial que não ajuda, pelo contrário, em moderar o já elevado déficit em transações correntes das contas externas do país. Duas características centrais devem ser destacadas na análise do problema. Primeiro, ele não é tão recente como fazem crer as avaliações dos analistas. Segundo, a crise é geral, no sentido de que é abrangente do ponto de vista dos macrossetores econômicos ou dos subsetores industriais.

Com dados para os três primeiros trimestres desse ano, em uma classificação de bens que segue metodologia da OCDE, é possível constatar que o mau resultado exportador de 2014 — queda de 2,2% com relação ao ano anterior — seguiu outro ano adverso, que foi 2013 (-1,7%) que, por seu turno, foi precedido do terceiro resultado negativo consecutivo, -4,9%. Portanto, a questão não é nova e sim já se prolonga por um triênio, sem, no entanto, ter tido o impacto que merecia. Convém ainda observar que as quedas ocorreram após dois anos de intenso crescimento em 2010/2011 (da ordem de 30% em cada um) após a grande retração de 2009, devido à crise mundial. Fora isso, o último ano que registrou retração das vendas externas foi 2002: -1,9%.

Do ponto de vista dos macrossetores, a exportação de bens típicos da indústria de transformação teve declínio de 4,2% em 2014 e de 3% como média anual do período 2012/2014. Produtos primários, representando os segmentos da agropecuária e da extrativa mineral, tiveram leve alta em 2014, 0,7%, mas no último triênio sofreram queda quase equivalente aos produtos industriais: -2,9%.

As evidências mostram que o adverso período exportador brasileiro afetou na mesma intensidade produtos industriais e produtos primários, certamente devido a causas distintas. No primeiro caso, uma acirrada concorrência externa, aliada a uma falta de competitividade que é generalizada na economia brasileira, respondem destacadamente. No segundo caso, a queda de preços das commodities exportadas pelo Brasil, motivadas pelo baixo crescimento das economias centrais e pela recente desaceleração da economia chinesa, são os fatores mais importantes. Vale dizer, as causas combinam fatores externos e internos no caso de produtos industriais e apenas fatores externos no caso dos produtos primários.

A maioria dos 18 ramos em que os produtos industriais são classificados sofreu queda na média do último triênio, num total de 12. Em bens de alta tecnologia, somente a Aeronáutica obteve avanço, média de 10% no período em foco. Em todos os demais houve retração, especialmente em Equipamentos de rádio, TV e comunicação e Material de escritório e informática, cujas taxas de declínio foram muito expressivas, respectivamente, 22% e 9,5%. Também regrediram Instrumentos médicos e de precisão e Indústria farmacêutica. No setor de alta tecnologia como um todo, o peso da Indústria aeronáutica se impõe, de forma a gerar uma variação média anual pequena, porém positiva, 0,7%.

Na média-alta tecnologia foi onde o declínio se deu de forma mais intensa, -6% em média por ano, com todos os setores tendo desempenho adverso, com grande destaque para Veículos, Produtos químicos e Bens de capital mecânicos e elétricos. Média-baixa intensidade tecnológica teve redução mais moderada, 2,5% em média, em grande parte pelo efeito amortecedor das exportações (em sua maioria fictícias) de embarcações. Quedas expressivas se deram em Produtos metálicos (aço é um destaque), Borrachas e plásticos e Derivados do petróleo.

Finalmente, na indústria de baixa tecnologia, onde é ampla a fronteira com o agronegócio, a exportação cedeu em média entre 2012 e 2014, 1,9% ao ano. O retrocesso foi mais intenso em Alimentos (-3%), mas em Papel e celulose e em Têxteis, couros e calçados as exportações cresceram, 0,8% no primeiro caso e 2,5% no segundo. Os dados de exportação provam que não há como negar a generalizada perda de competitividade da indústria brasileira no período recente. 


Julio Gomes de Almeida é Ex-Secretário de Política Econômica do
Ministério da Fazenda e Professor do Instituto de Economia da Unicamp