A melhora da economia

Julio Gomes de Almeida – Ex-Secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda

Brasil Econômico – 17/10/2014

Foram dois meses seguidos de crescimento da produção industrial (0,7% em julho e o mesmo percentual em agosto) e agora a pesquisa sobre o varejo do IBGE registrou aumento das vendas reais de 1,1% em agosto, o que neutraliza a queda de 1% no mês anterior. São indicadores claros de que pelo menos em dois de seus setores mais importantes — indústria e comércio — a economia brasileira mostra dinamismo no terceiro trimestre do ano, o que contrasta com o período fortemente negativo que foi o segundo trimestre. São pertinentes algumas observações a respeito do quadro de possível melhora da economia sumarizado acima.

Em primeiro lugar, nada muda com respeito às tendências básicas que o ano de 2014 reservou para a economia brasileira. A inflação permanece alta, acenando, contudo, com a perspectiva de que agora comece a dar sinais de redução quanto aos preços de serviços, este que foi um destacado propulsor dos aumentos do IPCA. O quadro também já está dado para o setor externo, onde a luz amarela do déficit em transações correntes acendeu há algum tempo e assim deve permanecer. O mesmo vale para a situação fiscal, que vem se agravando devido à queda da receita tributária, e para o emprego, que se mantém em nível elevado, mas acusa piora nos últimos meses em função da deterioração do desempenho da economia.

A possível reativação econômica trará perspectiva mais favorável nos dois últimos temas pelo impacto que trará na arrecadação tributária e no estancamento da atual tendência de declínio de novas contratações, que já se traduz em demissões líquidas em setores importantes, como, precisamente, nos casos da indústria e do comércio. Nesta hipótese seria de se esperar um maior otimismo das famílias e um ânimo mais favorável por parte dos empresários, o que favoreceria o crédito, o consumo e o investimento, promovendo a saída da presente recessão.

O segundo comentário diz respeito à sustentabilidade desse início de recuperação. Não está claro se a volta do crescimento deveu-se a compensações de recuos especialmente pronunciados em meses anteriores, refletindo fatores extras como a Copa do Mundo e mudanças de calendário, como o escolar, ou se de fato é sinal de que a economia já se encontra em nova fase. Se há recuperação, não vem por enquanto pelo lado do investimento, pois os empresários, como nunca, estão avaliando muito mal a perspectiva da economia; e também não vem do crédito, que está fraco.

É fato que há sinais de avanço importante no crédito pessoal, devido às mudanças na regulação do crédito consignado. Contudo, os impactos sobre o comércio e a indústria são posteriores a agosto, sendo possível que apareçam nos dados do comércio de outubro e novembro e nas vendas de fim de ano. Onde é possível identificar uma reação capaz de se traduzir em maior demanda é nas famílias, cujo otimismo melhora há dois meses.

De qualquer forma, a pesquisa industrial e o levantamento do varejo para setembro irão dirimir as dúvidas sobre a efetividade ou não deste início de reativação da economia. Se não for confirmada a recuperação, a má notícia para o comércio é que o crescimento do setor será muito baixo em 2014. Para se ter ideia, até agosto a evolução em volume das vendas é de apenas 2,9%, um índice muito baixo e que acena com uma reversão relativamente abruta da trajetória do setor. Este crescia até 2012 a elevadas taxas (8,4% neste ano) e desacelerou para 4,3% em 2013. Para uma atividade que investiu muito ultimamente, ampliou o emprego e assumiu compromissos de financiamentos necessários para viabilizar a expansão, o ideal seria um “pouso” mais suave, repetindo em 2014 aproximadamente o padrão de crescimento do ano anterior.

Puxa para baixo o varejo o fato de que vários de seus ramos vêm tendo crescimento negativo, algo que praticamente há dez anos não ocorria, nem mesmo quando eclodiu a grande crise mundial em 2009. São os casos de Veículos, motos, partes e peças (variação de vendas reais entre janeiro e agosto de -9,8%), Livros, jornais, revistas e papelaria (-6,8%), Equipamentos e materiais para escritório, informática e comunicação (-4,2%) e Tecidos, vestuário e calçados
(-1,3%).
 


Julio Gomes de Almeida é Ex-Secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda