A estratégia da política econômica

Julio Gomes de Almeida – Ex-Secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda

Brasil Econômico – 10/10/2014

Vários fatores têm concorrido para o quadro econômico brasileiro, que nos últimos anos gradativamente foi migrando de uma situação de alto crescimento (2010 e início de 2011) para uma desaceleração significativa (parte de 2011, 2012 e 2013) até chegar a 2014 com variação negativa ou muito próxima a zero. O congestionamento do crédito às famílias é um deles e a crise da indústria também foi determinante, mas o fator que se impõe na atualidade é a expectativa muito desfavorável com que os agentes estão vendo a economia. Os órgãos de pesquisa, a exemplo de FGV e CNI, realizam levantamentos para o otimismo/pessimismo dos empresários (dos vários setores: indústria, comércio e serviços) e das famílias e todas eles mostram um quadro de aguda queda da confiança, com apenas uma recente melhora das expectativas dos consumidores.

O governo não encontrou instrumentos para compensar tamanho revés das avaliações e teve de usar e abusar de mecanismos sabidamente ineficazes, ou pelo menos de baixo resultado nessas condições. São os casos dos incentivos à compra de bens duráveis e subsídios do crédito através dos financiamentos dos bancos oficiais. Também não surtiram os efeitos desejados as medidas de redução de custos tributários dos investimentos e da folha de salários.

É sempre bom observar que ações como essas pressupõe divisão de opiniões sobre o futuro por parte de empresários e consumidores, servindo os incentivos para deslocar para o campo positivo decisões que de outra forma não seriam realizadas. Mas, se há uma acentuada polarização das expectativas no campo negativo, tal como parece ter ocorrido com as antecipações empresariais e das famílias nesse ano eleitoral de 2014, nem mesmo as mais generosas subvenções são capazes de tirar os agentes de sua posição defensiva.

Investindo menos e com menores gastos em bens de consumo, a despeito dos incentivos, a economia, que parecia sofrer tão somente de uma “crise de oferta” — a crise de competitividade que a prolongada valorização da moeda foi formando na indústria —, passa agora a acusar uma insuficiente demanda, sem que a crise de oferta tenha se resolvido. Isto levou à recessão no primeiro semestre deste ano. Teríamos condições melhores de lidar com essa situação se aos instrumentos de indução às decisões privadas tivéssemos desenvolvido processos de ampliação do investimento autônomo — vale dizer, realizado diretamente ou induzido pelo setor público. Nesse ponto fizemos apenas parte do que era necessário, em especial porque o programa de concessões de obras públicas demorou muito para ser estruturado.

As considerações acima servem para guiar a estratégia a ser seguida pela política econômica do próximo governo para recuperar o crescimento. Em primeiro lugar, a crise industrial deve ser combatida de frente com muitos cuidados com o câmbio e uma reforma tributária pra valer. Do contrário, ficaremos prisioneiros do baixo crescimento, já que a indústria é o setor de maior interdependência com outros segmentos da economia, o que significa dizer que sua adversidade arrasta o desempenho dos demais setores.

Em segundo lugar, as expectativas de empresários, consumidores e das instituições financiadoras, ou seja, dos bancos, precisarão de uma injeção de ânimo. Isto pressupõe, de um lado, uma melhora fiscal obtida com cortes de desonerações e subsídios tributários e financeiros e, de outro, a construção de um horizonte para a volta do crescimento, o que, além de favorecer as expectativas, reforçará o orçamento fiscal.

Em terceiro lugar, a pavimentação de avenidas de expansão do investimento a cargo do setor público, suas empresas e das empresas privadas sob o regime de concessão no setor de infraestrutura será muito importante para aumentar a taxa de investimento público e guiar as decisões privadas de investir. Aqui, será necessário avaliar detidamente os aperfeiçoamentos de que eventualmente ainda carece o programa de concessões e a necessidade de financiamento das empresas do setor de energia para seus programas de inversão, o que poderá requerer ajustes de preços e tarifas. 


Julio Gomes de Almeida é Ex-Secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda