Julio Gomes de Almeida – Professor do Instituto de Economia da Unicamp e Ex-Secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda Brasil Econômico – 18/07/2014 Do encontro dos Brics nesta semana no Brasil resultou a criação de um banco de desenvolvimento do grupo e de um fundo de reserva, dando sequência — agora de uma forma muito mais concreta — à transformação de uma mera sigla em uma instituição com poder econômico, financeiro e político As duas iniciativas são, cada uma delas, “espelhos” respectivamente do Banco Mundial e do FMI, duas das mais relevantes e típicas agências multilaterais representativas da hegemonia americana, exatamente para simbolizar esse poder nascente. Cada país,
é claro, tem uma estratégia ao se posicionar conjuntamente
com o grupo. Certamente, a China vê na iniciativa um instrumento
a mais em seus esforços de assegurar fontes estáveis de
recursos básicos, alimentícios e energéticos de
que necessita seu desenvolvimento. Vê aí também
uma alavanca a mais para alçar o yuan à condição
de moeda de reserva e mediadora de trocas internacionais. Como se sabe, a
economia brasileira se nutre, talvez excessivamente, de seu mercado
interno, o qual multiplicou sua envergadura na última década
em função de uma bem sucedida redistribuição
da renda. O horizonte agora mudou. O crescimento do mercado interno
de consumo deverá retornar após a perda de ritmo que se
assiste ultimamente, mas não com as taxas “chinesas”
que prevaleceram até 2012. O Brasil acerta
em buscar a partir dos desdobramentos das ações dos Brics
um maior e mais amplo envolvimento dos países da América
do Sul em suas relações comerciais e industriais. O Mercosul
não pode deixar de participar com o destaque que já teve
no passado nas exportações de manufaturas brasileiras,
mas não com a preponderância dos últimos anos, enquanto
outros países da região vêm aumentando seu porte
econômico e já são mercados relevantes. O segundo envolve a China.Aqui nossa relação comercial revive o padrão de divisão internacional do trabalho e de especialização de comércio exterior de dois séculos atrás: o Brasil (com papel análogo a Portugal no exemplo clássico) só exporta produtos primários; a China (representando a Inglaterra) só vende ao Brasil produtos industriais. Este não é um padrão necessariamente desfavorável, porque o saldo comercial dele resultante vem ajudando a sustentar um baixo, mas positivo superávit total do comércio exterior brasileiro. Mas, a condição disto é que o Brasil tenha alternativas de mercado exterior para produtos industriais, de forma a diversificar sua pauta exportadora. Não é isso o que vem ocorrendo. O país vem perdendo mercados nos países desenvolvidos e, devido à crise de seus principais parceiros locais e à própria concorrência dos produtos chineses, também entre os emergentes. Mudar esse quadro depende de iniciativas que abram mercados para o produto brasileiro, mas o trabalho interno é tão ou mais importante: precisamos elevar — e muito — a capacidade de a nossa produção competir em mercados do exterior. Julio
Gomes de Almeida é Professor do Instituto de Economia
da Unicamp |