Os entraves da economia em 2014
 
Julio Gomes de Almeida
– Professor do Instituto de Economia da Unicamp e Ex-Secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda
 
Brasil Econômico – 11/04/2014

A julgar pelos resultados industriais, a economia brasileira não começou bem 2014.Houve certa melhora entre os primeiros meses do ano e os meses finais do ano anterior, é verdade, mas se o primeiro bimestre é comparado com o mesmo período de 2013, a indústria cresceu míseros 1,4%, levemente acima do aumento no ano passado como um todo. Para que o Brasil venha a nutrir a esperança de um avanço maior do PIB no corrente ano, seria necessário um ritmo mais forte do seu setor industrial. Este, embora assista a uma queda persistente de sua relevância na economia, ainda aparece como força motora de geração de dinamismo.

Nesta semana, novos dados reforçaram a suspeita de fragilidade do desempenho industrial. Segundo o levantamento regional do IBGE, o crescimento industrial no acumulado de janeiro-fevereiro se deu, sobretudo, em centros mais especializados, ou seja, menos diversificados, a exemplo de Amazonas e das indústrias do Nordeste e da Região Sul. A indústria de Minas Gerais teve também desempenho positivo. Mas, o que deve ser sublinhado é que nos maiores e mais estruturados centros, ou seja, Rio de Janeiro e, principalmente, São Paulo, a indústria ainda amarga retrocesso. No Rio, a queda atinge 2,2% e em São Paulo, 2,4%. A indústria não sustentará sua expansão, ainda que modesta, sem que seus principais núcleos voltem a crescer.

O quadro acima resumido tem correspondência com três tendências presentes na economia e que afetam em grande escala o setor industrial, mas também o de serviços. A primeira é o baixo crescimento do PIB nos últimos anos e a sensação de insucesso da política econômica contribuiu para a piora das expectativas empresariais, o que já deve estar deprimindo o investimento após uma significativa recuperação ocorrida em 2013. Ao que parece, o investimento público, mesmo reforçado com as inversões previstas para este ano do programa de concessões de infraestrutura, não será capaz de neutralizar o efeito negativo das expectativas. A segunda, a despeito de estar em marcha uma reestruturação e aumento de produtividade na indústria, a competitividade do setor ainda é baixa e, por conseguinte, a penetração do produto importado no mercado brasileiro continua alta. E a terceira, mesmo que a perspectiva de crescimento do varejo para 2014 seja bem razoável (em torno de 5%), o fato é que o Brasil já não tem um mercado interno consumidor tão ativo como nos dez anos anteriores, quando a expansão anual das vendas reais do comércio foi superior a 8%.

Cabe ainda levar em consideração a política econômica de linha mais ortodoxa, defensora de grande ajuste fiscal e forte elevação da taxa de juros, que já está em vigor no país. Se ainda não é definitivo, o ajuste nas contas públicas prometido para este ano já retira do governo raios de manobra fiscal e vai ditando a desmontagem dos incentivos ao consumo e ao financiamento de longo prazo, que, mal ou bem, formavam os instrumentos usados para frear a desaceleração econômica. Quanto aos juros, o nível atual de 11% ao ano — em torno de 5% em termos reais — encarece o crédito e deprime as decisões de investir. Ademais, dependendo da gangorra que vem notabilizando os fluxos internacionais de capitais, esse mesmo nível de juros estimula a entrada de recursos e cria expectativas de valorização da moeda.

O valor do dólar, que para muitos analistas subiria neste ano para R$ 2,50, se aproxima de R$ 2,20, tendo acumulado nas últimas semanas uma redução de 10%. Isto é indicativo do retorno de algo que prevaleceu no Brasil nos últimos 15 anos: a facilidade com que uma desvalorização do real se desfaz e, com ela, se perdem os efeitos de incentivo aos investimentos voltados ao mercado externo. Como em outras épocas, o governo opta por colher os frutos do amortecimento trazidos pela valorização da moeda na inflação, a qual, a propósito, encontra-se sob nova aceleração nesse preciso momento no Brasil. Mais um fator adverso para o nível de atividade, desta feita pelo lado das exportações.


Julio Gomes de Almeida é Professor do Instituto de Economia da Unicamp
e Ex-Secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda