Os efeitos retardados sobre o emprego
 
Julio Gomes de Almeida
– Professor do Instituto de Economia da Unicamp e Ex-Secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda
 
Brasil Econômico – 24/02/2014

O quadro pode ser resumido da seguinte forma: a criação de postos de trabalho no Brasil não evolui bem — na verdade, vem retrocedendo — mas nem assim a taxa de desocupação aumenta, pelo contrário, continua em queda. Segundo o IBGE em seis das maiores regiões metropolitanas, em janeiro relativamente a janeiro de 2013 o número de pessoas ocupadas regrediu 0,1% acumulando quatro meses de retrocesso, mas mesmo nestas condições a taxa de desocupação tem sido menor: baixou para 4,8% tendo sido de 5,4% em janeiro do ano passado.

O que rege a dinâmica do mercado de trabalho é a força com que evolui a demanda por mais contratações, o que, por seu turno, depende das avaliações empresariais sobre o curso dos negócios e o aumento da produção. Isto, se o ritmo com que se move o volume da força de trabalho, ou seja, o número de trabalhadores empregados ou à procura de trabalho, seguir um curso mais ou menos regular, de acordo com fatores demográficos ou sociais. A chamada população economicamente ativa não tem normalmente papel preponderante nas mudanças da taxa de desemprego, a menos que alterações ocorram nas estratégias familiares de obtenção de renda. Por exemplo, se há prolongado período de regressão do emprego é possível que a força de trabalho regrida como decorrência do “desalento” das pessoas em idade de trabalhar, o que pode afetar a taxa global de desemprego. Isso ocorreu recentemente em vários países do bloco das economias desenvolvidas que mais sofreram as consequências da crise de 2008.

O ciclo de crescimento econômico brasileiro de 2005/2010 incentivou muita gente a procurar emprego, o que fez com que a força de trabalho crescesse mais do que vinha ocorrendo. A taxa de desemprego não aumentou por essa causa porque as oportunidades de trabalho se multiplicaram ainda mais. A PEA chegou a evoluir no período a uma taxa superior a 2% em bases anuais, mas a população ocupada teve momentos de crescimento acima de 3%. Apoiado nessa composição de ritmos dos dois termos da equação do emprego teve lugar uma ininterrupta queda da taxa de desocupação somente interrompida provisoriamente no ano mais agudo da crise mundial, ou seja, 2009. Tomando por base a taxa média de 12,4% em2003, a desocupação foi de 5,4% da força de trabalho na média de 2013.

Pois bem, ao longo do ano passado este processo foi mudando. Com a economia perdendo dinamismo a ocupação passou a evoluir pouco, de forma que os índices referentes aos últimos meses já são negativos. A sensação de que o boom do emprego no país continua “a todo vapor” surge do fato de que, devido a efeitos retardados de certos eventos, a queda da ocupação não se traduz em aumento da taxa de desemprego.

Como a distribuição de renda melhorou no Brasil, as famílias puderam planejar com maior autonomia a entrada de seus membros mais jovens no mercado de trabalho. Paralelamente, como, com atraso, governo e entidades privadas criaram grande número de alternativas de ensino técnico e superior, melhoraram as condições para o aperfeiçoamento da formação de profissionais que, por isso, postergaram seu ingresso no mundo do trabalho. Daí o decréscimo da população economicamente ativa, mais do que compensando o menor número de pessoas ocupadas e evitando que a taxa de desemprego viesse a aumentar.


Julio Gomes de Almeida é Professor do Instituto de Economia da Unicamp
e Ex-Secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda