Estabelecer um adequado marco legal para a tributação
do lucro das companhias no exterior é complexo devido à
dificuldade que de forma geral todos os países têm
em harmonizar dois objetivos centrais:
a) não
permitir a erosão de sua base tributária em função
da expansão no exterior de suas empresas e;
b) incentivar
a internacionalização de suas corporações,
que é desejável porque traz vantagens não
só para as próprias empresas, mas também
para a economia de seus países de origem.
Concorrendo
no exterior, a empresa assimila e desenvolve padrões superiores
de produtividade e inovação que irão melhorar
a qualidade e reduzir o custo de sua produção tanto
fora quanto dentro do país originário. No mundo
todo – e nesse ponto o Brasil não é exceção
- está em curso uma revisão dos diversos regimes
tributários nacionais visando melhor equilibrar os dois
objetivos. Não é tarefa fácil e muito menos
é isenta de polêmicas e pontos de vista divergentes.
Do nosso ponto
de vista possível combinar o estímulo à internacionalização
das empresas e a preservação da base tributária
nacional, de modo a assegurar que um maior aprofundamento da internacionalização
tenha em sua plenitude os efeitos positivos sobre o desempenho
da economia territorial brasileira que dele se espera.
Governo e
setor privado realizaram ao longo do último ano reuniões
tendo em vista uma revisão de nossa legislação.
O governo se pautou por uma ininterrupta disposição
ao diálogo e de fato buscou atender ao objetivo de, sem
abrir mão de controles fundamentais sobre a base tributária,
melhorar a competitividade da empresa brasileira em um momento
em que as dificuldades da economia mundial aprofundam a concorrência
por mercados em todo o mundo. Nesse sentido, atendeu a algumas
ponderações das empresas, dentre as quais duas delas
se destacam.
Primeiramente,
aceitou o pagamento parcelado do imposto sobre resultados no exterior
no prazo de oito anos com taxa de juros seguindo a taxa internacional
(Libor). A medida se fazia necessária para neutralizar
parcialmente a vantagem das empresas de vários outros países
que adotam o “regime de caixa” para o imposto de renda
sobre operações no exterior. Nesses casos, a empresa
deve recolher o imposto somente quando internaliza seus resultados,
o que lhe permite adiar o pagamento do imposto pelo prazo que
desejar, com isso obtendo um financiamento automático para
novas operações sem custo financeiro algum, o que
amplia sua competitividade.
A segunda
diz respeito à compensação do prejuízo
em determinado país com o lucro em outro mercado, muito
comum na maioria dos países. No entanto, o governo brasileiro
identificou nesse expediente uma potencial fonte de erosão
de base fiscal. Aqui a questão concorrencial também
é decisiva: a não possibilidade de abater instantaneamente
no imposto a ser pago os prejuízos que normalmente ocorrem
nos primeiros anos de operação em novos mercados,
constituiria uma séria desvantagem competitiva para as
empresas brasileiras, concorrendo para impedir a redução
de seu atraso no processo de internacionalização.
Sugestões
feitas pelas próprias empresas levaram a uma parcial revisão
da posição do governo neste tema: a medida somente
seria aplicada para as atividades operacionais das empresas fora
de paraísos fiscais que abram integralmente suas contas
no exterior. Como meio adicional de proteção, o
governo delimitou a medida a países e atividades que irá
selecionar e definiu um “prazo experimental” para
sua vigência de 4 anos.
Há
um problema grave na nova legislação: ela não
remove a insegurança jurídica quanto à utilização
dos acordos celebrados pelo Brasil com outros países que
preveem o pagamento do imposto onde o lucro é obtido, via
de regra, com alíquota inferior à brasileira. A
interpretação desses acordos pela Receita Federal
gerou um contencioso entre governo e empresas que soma R$ 70 bilhões.
De uma forma geral, a disputa entre as partes está distante
do desfecho final pela justiça, de modo que o governo achou
por bem instituir um programa em que abate multas e juros para
as empresas que aceitem abrir mão de contestações
administrativas e judiciais e paguem à vista o valor do
principal, que em termos agregados corresponde a R$ 27 bilhões.
O governo admite também o financiar em 180 meses com abatimento
parcial de multas e juros. É difícil antecipar a
adesão das empresas ao programa, mas, seja como for, o
ideal é que venhamos a estabelecer uma regulação
inequívoca do tema, mirando o procedimento futuro a ser
adotado em nossos acordos.
Em suma, para
padrões internacionais da atualidade, a nossa nova legislação
será uma das mais severas em termos de controle das operações
das empresas brasileiras que se internacionalizam, mas não
deixará de atender pelo menos em parte o requisito de competitividade
da empresa brasileira. Como as condições com as
quais nossas corporações concorrem no exterior ainda
são mais vantajosas, esperamos que a modernização
de nossa legislação esteja apenas começando
e que tenha desenvolvimento o esforço para que a nossa
empresa desfrute dessas mesmas condições.
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