A confiança do consumidor e o crescimento do varejo
 
Julio Gomes de Almeida
– Professor do Instituto de Economia da Unicamp e Ex-Secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda
 
Brasil Econômico – 21/10/2013

A elevação nas vendas do varejo em agosto relativamente a julho (0,9%) não reproduziu o excepcional aumento do mês anterior (2,1%), mas é suficiente para acenar com uma possível mudança do cenário que predominou nos seis primeiros meses. Nesse período, o setor migrou de uma etapa na qual ainda crescia a taxas “chinesas”, tal como indicava o índice acumulado em 2012 (8,4%), para uma fase de “crescimento modesto”, como sugeria a taxa com que progrediram as vendas em volume na primeira metade de 2013, ou seja, 3%.

A menor confiança dos consumidores causada pelo agravamento da inflação entre fins do ano passado e o início de 2013, os sinais de que o emprego já não crescia como antes e a contida evolução do crédito pareciam anunciar a chegada de um novo cenário que deveria prevalecer pelo menos até o final do ano. Em geral, as projeções para este ano seguiram esse padrão de referência antecipando um crescimento da ordem de 3,5% a 4%para a atividade do setor. A nosso ver, o status de “crescimento modesto” deve ser mantido como hipótese de trabalho para este e possivelmente os próximos anos,mas os dados mais recentes mostram que é possível considerar um aumento algo superior ao que vem sendo projetado até agora. Isto implicará projeções melhores para o PIB do terceiro trimestre e para o ano.

De fato, houve uma inflexão para cima das vendas reais nos dois primeiros meses do segundo semestre. No comércio varejista “restrito” que exclui os segmentos de automóveis e materiais de construção, o crescimento médio de 6,1% na comparação com os mesmos meses de 2012, foi equivalente ao dobro da taxa média apurada no primeiro semestre.

A mudança refletiu, sobretudo, a reativação das vendas de hipermercados e supermercados que entre janeiro e junho deste ano tiveram elevação de apenas 0,3% sobre igual período de 2012, percentual que passa para 4,1% na média do bimestre julho agosto. Não há como dissociar tal desempenho da redução dos índices de inflação obtida nos últimos meses, o que descomprimiu o orçamento familiar, sobretudo nos itens básicos de consumo, alimentos e bebidas.

Foi reflexo também do redobrado dinamismo em dois outros segmentos: móveis e eletrodomésticos e equipamentos de informática e comunicações. Em ambos os casos, o acréscimo de vendas no primeiro semestre alcançara 3,7%, subindo para 9,4% e 8,3% no período julho-agosto, respectivamente, no primeiro e no segundo caso. Aqui, por se tratar de bens de consumo duráveis de valor unitário mais alto, o consumo pressupõe a contratação de financiamentos. Por isso, o fator decisivo da aceleração foi o retorno da confiança do consumidor. Ao contrário da confiança empresarial, a dos consumidores brasileiros reagiu muito prontamente após uma queda acentuada que se seguiu às manifestações de junho, abrindo caminho para o aumento do consumo de duráveis.

Os últimos resultados o comércio varejista mostram, em suma: 1) que inflação menor é forte indutora de crescimento do varejo, particularmente em se tratando de inflação de alimentos; 2) que o cenário de maior confiança do consumidor — com respeito ao emprego, à inflação, à sua condição financeira e à situação econômica geral do país — é relevante para promover o consumo diferenciado em bens duráveis.


Julio Gomes de Almeida é Professor do Instituto de Economia da Unicamp
e Ex-Secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda