Em breve terá um desfecho uma longa negociação entre grandes empresas e governo sobre a tributação de lucros das corporações brasileiras que operam no exterior. É uma questão decisiva por dois ângulos. Primeiro, porque a Receita Federal aplicou multas bilionárias às empresas que, segundo ela, teriam se aproveitado indevidamente de acordos celebrados no passado pelo Brasil com determinados países. O total desse contencioso entre principal, juros e multas, alcança R$ 70 bilhões. Como tratar esse enorme problema foi e é o maior impasse na discussão do tema e onde residem as maiores dúvidas sobre a eficácia da nova regulação. O governo definiu um prazo de pagamento de 15 anos para a liquidação das dívidas e, para a liquidação à vista, suprimiu integralmente juros e multas. O problema é que mesmo levando-se em conta as deduções, o valor do principal é extremamente elevado, R$ 27bilhões. Uma nova medida deve facilitar o pagamento: a prerrogativa das empresas utilizarem em até 30% de seus débitos os prejuízos de suas controladas no Brasil. Mesmo assim, nosso receio é que os valores astronômicos envolvidos e o estágio em que se encontra a maioria dos casos (alguns deles ainda distantes de um julgamento final) restrinjam de tal forma o poder decisório dos acionistas das empresas envolvidas que acabem por limitar sua adesão. O segundo ponto diz respeito ao incentivo que uma nova lei deve conferir à internacionalização de empresas. Os países emergentes mais ativos durante a chamada globalização apoiaram suas políticas em ações comerciais agressivas e na internacionalização de empresas locais.Não fizemos nada disso e embora várias de nossas empresas tenham tido marcantes experiências no exterior, nosso processo de internacionalização ficou longe da importância do Brasil no cenário econômico global. A eliminação do amplo atraso brasileiro seria um objetivo que justificaria um incentivo adicional na nova regulação. Esta, sem dúvida se propôs a caminhar nesta direção, mas em pontos relevantes adotou outro propósito, qual seja o de preservar a base fiscal diante de potenciais riscos derivados de um “planejamento fiscal” a nível internacional que as empresas poderiam desenvolver. Por isso, limitou a vigência da consolidação vertical (a prerrogativa das empresas compensarem prejuízo em determinado país com o lucro em outro país) a quatro anos. A consolidação permite diluir prejuízos que são usuais nas etapas iniciais de operação de empresas e, por isso, constitui um incentivo à internacionalização. Visando superar a defasagem em nosso processo de internacionalização, nossos estudos sugeriram15 anos para a validade do instrumento. A justificativa do governo para o prazo menor é que se trata de um “experimento” para avaliação da utilização pelas empresas da prerrogativa da consolidação. Nesse período o governo também aguarda indicações de mudanças da legislação sobre o tema a nível internacional. O comentário pertinente é que a consolidação vertical nas bases propostas servirá como estímulo à internacionalização de empresas, mas apenas de forma marginal. Outra fonte de preocupação é a fixação pelo governo da relação dos países e atividades que poderão ser aceitos na consolidação. Dependendo de restrições definidas na regulamentação, na prática a consolidação vertical poderá não se tornar efetiva. Julio
Gomes de Almeida é Professor do Instituto de Economia
da Unicamp |