A OCDE (Organização para a Cooperação
e Desenvolvimento Econômico) e a Organização
Mundial do Comércio (OMC) lançaram uma versão
preliminar dos resultados de um estudo inovador no campo das estatísticas
industriais, que detecta o valor adicionado das diferentes etapas
de produção das cadeias globais de valor (CGV).
Os principais resultados deste trabalho compõe um estudo
que o IEDI acaba de finalizar e que será publicado em sua
Carta que circula hoje.
Uma cadeia
de valor representa todas as empresas e pessoas envolvidas na
produção de um bem ou serviço, desde a sua
concepção até o consumo final. O processo
envolve as atividades de formulação, produção,
marketing, distribuição, etc. O termo CGV designa
a dispersão das cadeias de valor pelo mundo, seja através
da distribuição de estágios de produção
de uma firma entre diversos países ou a terceirização
de parte da cadeia de valor desta firma para parceiros externos.
Esse movimento
barateou enormemente os custos e aumentou a eficiência dos
sistemas da produção manufatureira. Vale lembrar
que os acordos de liberalização comercial têm
importante papel nesse processo, bem como as inovações
nas tecnologias da informação e de comunicações
e na logística.
A distribuição
espacial das cadeias manufatureiras nas últimas duas décadas
se deu de forma muito assimétrica. Não somente as
economias centrais perderam posição no valor agregado
manufatureiro; também economias emergentes industrializadas
como o Brasil também diminuíram sua participação
na produção mundial de valor adicionado industrial.
Os ganhadores na disputa da concorrência global para a recepção
de investimentos de firmas transnacionais foram os asiáticos
sob a liderança chinesa.
O Brasil e
a América Latina excluído o México ficaram
praticamente à margem desse processo de reestruturação
das cadeias globais de valor. Além de pouco peso nas cadeias
globais, apresentam também uma integração
produtiva regional pouco significativa, ao contrário da
América do Norte, Europa e Ásia.
De acordo
com o relatório da OCDE e OMC, o Brasil é uma das
economias com menor valor adicionado estrangeiro nas suas exportações,
da ordem de 10%, o que é um indicador para trás
nas cadeias de valor. É um indicador também de que
a economia brasileira é fechada, ou porque é forte
na produção doméstica de matérias
primas e bens intermediários, ou porque produz relativamente
poucos bens que demandam componentes vindos do exterior ou ainda
porque somos uma economia protegida.
Contudo, a
contribuição brasileira enquanto valor adicionado
nas exportações dos outros países, um indicador
para frente da integração nas CGVs, é a segunda
maior entre os países em desenvolvimento, principalmente
por conta das exportações de insumos e matérias-primas.
O comentário
pertinente sobre estas constatações é que
o Brasil não está totalmente fora das CGVs, mas
seu lugar é mais como fornecedor de insumos para empresas
de outras origens adicionarem mais valor na cadeia produtiva,
do que como exportador de produtos com maior valor adicionado.
Além
disso, as empresas multinacionais têm cada vez mais buscado
o mercado brasileiro e o latino, atraídas pelo mercado
interno ou a exploração de recursos naturais. De
fato, o Brasil mantém posição entre os BRIICS
(Brasil, Rússia, Índia, Indonésia e África
do Sul) enquanto receptor de investimento direto externo. Em outras
palavras, o país não é visto como um local
para agregar valor na cadeia global.
As políticas
econômicas e industriais precisam considerar que a divisão
internacional do trabalho não se dá somente ao nível
das indústrias, mas ao nível de estágios,
atividades e tarefas, conforme as especificidades de cada cadeia
de valor. A mudança de unidade de análise não
é trivial e torna mais complexa a tarefa de formular políticas,
ainda mais se são considerados os incentivos concedidos
por outros países para atrair investimentos das diversas
empresas das CGVs.
É verdade
que existe um forte componente de incerteza relacionado à
geopolítica das grandes corporações internacionais,
o que dificulta a política industrial. Entretanto, é
inequívoca também a importância das políticas
domésticas para participar das CGVs. É relevante
assegurar condições de competitividade industrial
– começando pela melhoria das estruturas de logística
e de tecnologia da informação, fatores cruciais
do sucesso no comércio internacional – e fomentar
através de políticas industriais o desenvolvimento
de segmentos e ramos onde é maior a atividade das CGVs.
Em suma, o
que se pode afirmar com certeza é que as CGVs estão
ganhando mais poder e relevância econômica, de forma
que o Brasil não pode se furtar a desenhar e implementar
políticas econômicas e industriais considerando as
CGV – principalmente o regime macroeconômico e cambial,
as políticas de comércio e acordos internacionais,
políticas de atração de investimento, de
competitividade e inovação.
De forma mais
ampla, a inserção externa de melhor qualidade é
aquela relacionada a uma maior participação das
atividades de alto valor agregado na estrutura produtiva e comercial
e ao aperfeiçoamento dos índices de produtividade
das empresas, com crescimento da participação do
país no produto e nas exportações mundiais.