Voltou à tona o tema do afastamento do Brasil das cadeias
globais de valor. Mas, no debate pouco se tem dado ênfase
ao fato de que isso ocorre há décadas. Dada a larga
experiência por nós acumulada, outro ponto também
deveria ser pacífico: as políticas que se baseiam
simplesmente na abertura às importações não
podem ser consideradas bem-sucedidas para a integração
da economia brasileira. Tampouco serão exitosas as políticas
baseadas na proteção pura e simples.
Políticas
de competitividade, industriais e de desenvolvimento tecnológico
e ações para atração de empresas transnacionais
serão decisivas. O Brasil pode e deve também ampliar
seus acordos de comércio. Como o fazem os emergentes bem-sucedidos,
nas negociações comerciais é fundamental
valorizar seu potencial importador como forma de impulsionar sua
capacidade exportadora. Não será tarefa fácil.
As três
últimas décadas presenciaram alterações
de grande envergadura na distribuição espacial das
cadeias manufatureiras. A globalização das cadeias
de valor ocorreu de forma muito assimétrica. As economias
centrais perderam posição no valor agregado manufatureiro,
enquanto economias emergentes com maior grau de industrialização
também sofreram, ainda que perdas menores, como é
o caso do Brasil. Os ganhadores foram os asiáticos sob
a liderança chinesa.
A mudança
na configuração espacial da indústria foi
marcada por um intenso processo de centralização
manufatureira à escala mundial e acompanhada de um grande
esforço das corporações transnacionais para
concentrar suas estratégias na “atividade principal”.
As consequências dessas transformações não
são triviais. A centralização do controle
na grande corporação deu lugar à “exteriorização”
dos segmentos produtores de peças, componentes e bens finais
sob o comando “inteligente” da chamada “empresa
integradora”, responsável pelas concepções
estratégicas.
Esse movimento
barateou enormemente os custos e aumentou a eficiência dos
sistemas da produção manufatureira. Nada disso seria
possível sem os acordos de liberalização
comercial sob a supervisão da OMC. Tampouco esse processo
teria avançado sem as inovações nas tecnologias
da informação e de comunicações, e
sem as importantes transformações na logística,
sobretudo na generalização dos contêineres.
O Brasil e
a América Latina ficaram praticamente à margem desse
processo. Antes do Plano Real, a crise aguda de balanço
de pagamentos e a ameaça hiperinflacionária afastaram
o País das estratégias de reorganização
da grande empresa transnacional. Depois, a valorização
do real, além de reanimar a vulnerabilidade externa, desfavoreceu
a participação brasileira nas cadeias produtivas
globais, sobretudo onde ocorriam com mais intensidade as transformações
estruturais e tecnológicas, dentre eles os setores de tecnologia
de informação e comunicações e na
eletrônica.
Isso não
significa que as empresas transnacionais tenham deixado de buscar
o mercado brasileiro e o Mercosul. Mas a motivação
do investimento é claramente a atração exercida
pelo mercado interno regional. Na maioria dos casos, o Brasil
participa das cadeias globais na ponta final do processo produtivo.
É bom esclarecer que a participação nas cadeias
envolve uma dinâmica peculiar entre exportações
e importações: se produz para exportar tanto quanto
se importa para produzir.
Portanto,
há muito tempo o Brasil está afastado do movimento
de reestruturação produtiva e empresarial que atende
pelo nome de globalização. Esse afastamento tem
início na segunda metade dos anos 70 do século passado,
quando o Brasil escolheu os setores básicos e tradicionais
para mover seu processo de avanço industrial. Nos últimos
40 anos, fizemos adições marginais à estrutura
manufatureira com baixa capacidade de inovação e
de integração às cadeias.
Um atraso
tão prolongado é de difícil recuperação,
mas devemos tentar nas linhas já indicadas: precisam ter
continuidade as políticas de competitividade, industriais
e de desenvolvimento tecnológico, assim como devem ser
intensificadas as ações para atração
de empresas transnacionais e as iniciativas para a ampliação
dos acordos de comércio.
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