A Carta IEDI que está
sendo publicada hoje procura mostrar que tanto fatores externos
quanto internos tiveram papel decisivo no ingresso de recursos
do exterior para o Brasil em 2012. Os fatores externos (desaceleração
das principais economias do mundo e ambiente financeiro internacional)
contribuíram para uma mudança na composição
desse ingresso, a favor dos fluxos de IDE vis-à-vis
os fluxos financeiros. Já os internos - controles de capitais
e a gestão macroeconômica -, além de induzirem
o alongamento do prazo da dívida externa, também
afetaram a dimensão dos fluxos financeiros ao desestimularem
as operações especulativas, evidenciando a maior
eficácia dos controles sobre captações externas
no novo ambiente de juros baixos e câmbio estável.
O balanço
de pagamentos brasileiro teve um superávit de US$ 22,9
bilhões no acumulado de janeiro a setembro de 2012, 59,4%
inferior ao do mesmo período de 2011 e o menor desde 2006.
Assim, esta cifra foi pior que a registrada em 2008 (US$ 23,9
bilhões), quando a economia brasileira foi atingida pela
crise financeira global. O principal condicionante desse resultado
foi o desempenho da conta financeira, que registra o fluxo líquido
de capitais entre o país e o exterior (ou seja, o ingresso
líquido de recursos externos menos a saída líquida
de capitais brasileiros). Embora o saldo positivo dessa conta
no corrente ano (US$ 58,5 bilhões) tenha sido mais que
suficiente para financiar o déficit de US$ 34,1 bilhões
nas transações correntes, ele recuou 38% frente
aos US$ 93,8 bilhões acumulados de janeiro a setembro de
2011.
A deterioração
da conta financeira decorreu da queda de 33% do ingresso líquido
de recursos externos e, em menor medida, do aumento de 11% da
saída líquida de capitais brasileiros. Devido ao
amplo grau de abertura financeira e de internacionalização
produtiva e financeira da economia brasileira, os dois resultados
foram condicionados pelo mesmo conjunto de fatores externos e
internos.
No caso do
ingresso líquido de recursos externos, além da sua
redução, sua composição também
se alterou. O investimento direto estrangeiro (IDE) – que
recuou somente 6% na mesma base de comparação –
respondeu por 62% do total desse ingresso, contra um percentual
de 46% entre janeiro e setembro de 2011. Em contrapartida, os
fluxos financeiros (investimentos de portfólio e outros
investimentos) recuaram 52% (reflexo da queda de 23% dos investimentos
de portfólio e de 62% dos outros investimentos), o que
resultou numa participação de apenas 38% no total,
bem inferior à de 2011: 54%.
O principal
fator explicativo do desempenho relativamente positivo do IDE
é a desaceleração “double speed”
da economia mundial – liderada pelas economias avançadas
e caracterizada por um diferencial de crescimento favorável
aos países emergentes – e o dinamismo do mercado
consumidor brasileiro relativamente aos países de origem
das Empresas Transnacionais. Apesar do ritmo modesto de expansão
da economia brasileira em 2012, esse mercado segue dinâmico,
devendo atingir uma taxa de crescimento entre 7% e 8% nesse ano.
Já
os fluxos financeiros foram afetados pelo aprofundamento da crise
da área do Euro desde o segundo semestre de 2011. Permeado
por breves períodos de melhoria, mas ainda sem perspectiva
de uma solução definitiva, essa crise resultou numa
forte volatilidade nos mercados financeiros internacionais –
para a qual também contribuiu as incertezas em relação
ao desempenho da economia americana em 2013, devido à ameaça
do chamado “abismo fiscal”.
Do lado interno,
três fatores se destacam. Em primeiro lugar, a estratégia
mais ampla de gestão dos fluxos de capitais adotada pelo
governo. Em segundo lugar, a mudança na política
macroeconômica, sobretudo em 2012, com a redução
expressiva da taxa de juros básica e a menor volatilidade
da taxa de câmbio. Esses dois primeiros fatores desestimularam
os fluxos especulativos atraídos pelo diferencial de juros
e pela volatilidade cambial. Em terceiro lugar, ações
do governo no setor de petróleo e energia elétrica
diminuíram as perspectivas de valorização
das ações desses setores que, somada à queda
das cotações internacionais do minério-de-ferro
e do petróleo (associada ao cenário internacional
adverso), desencorajaram as aplicações de não-residentes
na Bovespa.
No caso da
saída líquida de capitais brasileiros para o exterior,
a desaceleração “double speed”
e o potencial de crescimento do mercado consumidor brasileiro
vis-à-vis os países avançados explicam,
igualmente, a repatriação de investimentos diretos
brasileiros pelo segundo ano consecutivo. Já as menores
oportunidades de ganhos a partir de operações especulativas
de curto prazo (atraídas pelo diferencial de juros e/ou
pela tendência de apreciação cambial) desencorajaram
a repatriação de investimentos brasileiros de portfólio.
No caso dos outros investimentos brasileiros, a redução
em 60% do saldo negativo decorreu, em grande parte, da queda dos
depósitos dos exportadores em contas no exterior, estimulada
pela desvalorização do real.
Finalmente,
a análise da evolução mensal do ingresso
líquido de recursos externos entre janeiro e setembro sugere
que os fatores externos (desaceleração “double-speed”
e ambiente financeiro internacional) contribuíram para
uma mudança na composição desse ingresso,
a favor dos fluxos de IDE vis-à-vis os fluxos
financeiros. Já os controles de capitais e a gestão
macroeconômica, além de terem moldado sua composição,
induzindo o alongamento do prazo da dívida externa, também
afetaram a dimensão dos fluxos financeiros, ao desestimular
as operações especulativas. As emissões de
curto prazo foram nulas (caso dos títulos) ou quase nulas
(crédito bancário) no terceiro trimestre do corrente
ano, apesar do alívio no cenário externo.