A Economia Após a Crise
Julio Gomes de Almeida
– Ex-Secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda e Professor da Unicamp
Brasil Econômico – 17/09/2012

A crise financeira mundial deflagrada em 15 de setembro de 2008 completou quatro anos. É tempo suficiente para que despontem tendências relevantes em uma economia como a brasileira. Tais tendências, em parte, seguem determinações particulares de nossa economia, mas a crise mundial foi decisiva em definir rumos que, se nada for feito, perdurarão para o bem ou para o mal. A principal delas é a desindustrialização, que está se revelando como declínio absoluto do valor adicionado da indústria de transformação. Anteriormente, o recuo industrial era relativo, com a indústria seguindo em evolução, embora menor do que os demais setores.

A partir de projeções sobre o PIB do terceiro trimestre desse ano, entre o trimestre que antecedeu a crise mundial (o terceiro de 2008) e este mesmo trimestre de 2012, o declínio da manufatura chega a 6%, enquanto o PIB aumentava 10%. Políticas internas tiveram contribuição para tão amplo distanciamento, a começar pela falta de ações no passado voltadas ao desenvolvimento interno de setores mais modernos da indústria. Os custos também se elevaram e o real valorizou-se extraordinariamente. Mas o fato novo que impôs a rápida transição de uma forma de desindustrialização para outra mais aguda tem correspondência com a situação internacional.

Como se sabe, as políticas aplicadas para combater a crise evitaram a ruptura financeira e a depressão com consequente destruição de capacidade produtiva. O crescimento baixo, no entanto, passou a ser a norma entre os países desenvolvidos e a desaceleração na China é evidente, o que significa dizer que ao lado da preservação da capacidade de produção mundial de bens industriais, os mercados para colocação desses bens sofreram grande encolhimento.

Enquanto perdurar essa situação a forma como o Brasil se insere na economia mundial terá mudança profunda. Em outras palavras, como a concorrência entre as economias cresceu enormemente, a posição brasileira que já vinha sofrendo transformações desde o boom das commodities se altera correspondentemente: de polo exportador de manufaturas relativamente relevante, passa a ser mercado de importância crescente para outras economias porque o seu dinamismo interno contrasta com o baixo padrão de crescimento global.

Na ausência de reação imediata da política econômica isto determinou mudanças nos eixos dinâmicos da economia doméstica. As importações de bens e serviços acumularam aumento de nada menos que 37% no período, ao passo que as exportações praticamente não tiveram expansão (+0,9%). É um modelo importador, não industrial, com fraco desempenho das exportações, que, como consequência, induz ao baixo investimento (aumento de 10,8%). O consumo (+18,5%) é quem promove o crescimento e impulsiona o setor de serviços, de forma que o principal polo da economia deixa de ser a indústria, mas não se transfere para a agropecuária (+6,5%). O novo setor líder teve expansão de 12%, com show à parte da atividade financeira (+25%). No último ano o país começou a acordar para as armadilhas engendradas por suas próprias políticas e pelos desdobramentos da crise internacional, mas mudar este quadro leva tempo.


Julio Gomes de Almeida é Ex-Secretário de Política Econômica
do Ministério da Fazenda e professor da Unicamp