O Pacote e a Crise
Julio Gomes de Almeida
– Ex-Secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda e Professor da Unicamp
Brasil Econômico – 28/05/2012

As medidas anunciadas na semana passada para o setor de veículos, de longe o maior responsável pelo mau momento que a indústria brasileira vive nessa primeira metade do ano, terão efeitos positivos. O "pacote" permitirá a desova de excessivos estoques de automóveis e, juntamente com as demais ações que vêm sendo executadas em áreas como o salário mínimo, juros e câmbio, custo do crédito e desoneração da folha de salários, reabrirá condições para a reativação da produção industrial. Como os efeitos diretos e indiretos da indústria são poderosos, sua recuperação contribuirá para que a economia brasileira saia da quase estagnação em que se encontra há três trimestres ainda em tempo para crescer em 2012, embora modestamente.

O crescimento será apenas modesto porque as condições da economia internacional se deterioraram gravemente e já atingem o fluxo de capitais para o Brasil, deprimem as exportações e agravam as incertezas dos empresários, consumidores e bancos brasileiros. Todavia, deve-se ter presente que a crise mundial não é o único fator determinante da falta de dinamismo doméstico. O momento de nossa economia é diferente hoje com relação a 2008 quando estourou a crise mundial. Naquela oportunidade, se desenvolviam um ciclo de investimentos amparado na perspectiva de crescimento futuro do mercado interno e, simultaneamente, um ciclo de consumo de duráveis municiado pela evolução do crédito e aumento da renda real da população.

Neste contexto, a política econômica teve pleno êxito em dar continuidade ao "boom" de consumo de duráveis por meio, principalmente, de reduções de impostos na compra de bens duráveis, e à onda de inversões pelo reforço de recursos concedidos ao BNDES. Mas, atualmente o ciclo de investimentos dá sinais de reversão, em grande medida em função da crise vivida pela indústria, e o ciclo de consumo está em descenso, seja porque a população antecipou a aquisição de duráveis e agora modera seu apetite para novas compras, seja porque as instituições financeiras passaram a identificar riscos de inadimplência após forte expansão de seus financiamentos às famílias, de forma que também desejam "digerir" esse processo.

Por isso, perde eficácia a reprodução do modelo de atuação da política econômica com base na maior disponibilidade do crédito e em incentivos fiscais ao consumo. Medidas nessas áreas ainda podem ser úteis, mas os resultados serão superiores se houver um reforço substancial do investimento público por parte da União e dos estados e se a concessão de novos incentivos estiver associada não mais ao consumo, mas ao investimento privado, como a permissão de depreciação acelerada das inversões realizadas, por exemplo, nos próximos 12 meses.

Iniciativas para dar maior folga financeira às empresas, liberando-as das limitações correntes do crédito interno e externo (através da ampliação dos prazos para pagamentos de impostos), e para potencializar sua capacidade de financiamento de novos projetos (mediante o uso do compulsório no crédito de longo prazo dos bancos, como foi permitido pelo "pacote" para o crédito de veículos) poderiam ter grande impacto.


Julio Gomes de Almeida é professor da Unicamp e
ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda