28 de maio de 2012

Economia e Política Econômica
O “pacote” e a necessidade de reativação do investimento no contexto de crise


  

 
As medidas de redução de impostos e facilitação de crédito anunciadas pelo governo na semana passada trarão efeitos positivos. Elas se debruçam sobre a indústria de veículos, que reúne tanto a produção de bens de consumo (automóveis de passeio), quanto de bens de capital (ônibus, caminhões e utilitários). O setor, que vem se destacando como determinante do mau momento pelo qual passa a indústria brasileira respondendo por 4/5 da retração de 3% da produção industrial acumulada no primeiro trimestre desse ano, se encontra com níveis excessivos de estoques de produtos finais. A desova desses estoques deverá se dar ao longo do prazo previsto para a duração das medidas (final de agosto), o que reabrirá condições de crescimento do setor.

É possível que nesse período outros segmentos industriais também cheguem ao término de seus ciclos de ajuste de estoques, de forma que a indústria como um todo poderá voltar a ter uma evolução positiva ainda este ano, beneficiando-se ainda das demais iniciativas da política econômica, como o aumento do salário mínimo que vem reforçando o consumo de base da população, a redução da taxa Selic, o barateamento do crédito, o reposicionamento da taxa de câmbio, a ampliação das linhas do BNDES para o financiamento de projetos de inversão e as desonerações do investimento, das exportações e da folha de salários promovidas pelo Plano Brasil Maior.

Como, por seus efeitos diretos e indiretos, a indústria vem se constituindo o epicentro da retração econômica, sua recuperação contribuirá para que a economia brasileira saia da quase estagnação em que se encontra há três trimestres ainda em tempo para crescer em 2012, embora modestamente. Nos últimos três trimestres, a marcha da evolução do PIB registra queda de 0,1% e elevações de 0,3% e de 0,15%, segundo estimativa do Banco Central.

Mesmo assim, o crescimento em neste ano será apenas modesto, em parte porque as condições da economia internacional se deterioraram gravemente e já atingem o fluxo de capitais para o Brasil e concorrem para a contração do crédito externo e para deprimir as exportações, pois mercados relevantes para as exportações brasileiras estão se contraindo e os preços de commodities caem. Além disso, o cenário externo agrava as incertezas nas decisões de investir dos empresários e amedronta os consumidores de bens duráveis e as instituições que os financiam.

Todavia, deve-se ter presente que a crise mundial não é o único fator para a falta de dinamismo econômico doméstico. O momento de nossa economia é muito diferente hoje do que era em 2008 quando estourou a crise mundial. Naquela oportunidade, dois ciclos de grande intensidade se desenvolviam e se sobrepunham internamente: o ciclo de investimento em infraestrutura e em nova capacidade produtiva industrial, impulsionado pelos programas públicos em infraestrutura e exploração de petróleo e pela perspectiva de crescimento econômico; e o ciclo de consumo de duráveis e habitações, municiado pela evolução do crédito e amparado pela formalização e aumento do emprego e do rendimento real da população.

Nesse quadro, como a disposição de investir e consumir foi preservada pelo compromisso assumido pelo governo de manutenção de seus programas de investimento e de renda (a exemplo do PAC e do Bolsa Família) e a solidez bancária foi assegurada por ações Banco Central, como a liberação do compulsório e as facilidades criadas para a compra de carteiras dos bancos de menor porte pelos bancos maiores, a política econômica pôde atuar largamente apoiada em medidas voltadas a dar continuidade: a) à evolução do crédito corrente pela ação, sobretudo, dos bancos públicos (Banco do Brasil e Caixa); b) ao “boom” de consumo de duráveis por meio, principalmente, de reduções de impostos na compra de veículos e outros bens duráveis; e c) à onda de inversões, pelo reforço de recursos concedidos pelo Tesouro ao BNDES, o que mesmo no contexto de ruptura do crédito externo, tornou possível o financiamento dos investimentos em curso no país.

Como se sabe, esta orientação da política econômica se notabilizou por ser muito ativa em irrigar a liquidez bancária e em recuperar o crédito, sendo parcimoniosa relativamente a outras experiências internacionais de combate aos efeitos da crise, em promover o gasto público direto e o estímulo fiscal, salvo no que diz respeito aos incentivos de redução de impostos para bens duráveis.

Atualmente, o ciclo de investimentos dá sinais de reversão, sobretudo na área industrial em função da crise vivida por esse setor e pelas perspectivas nada favoráveis à produção interna da concorrência do produto importado. Quanto ao ciclo de consumo, sua fase é de descenso, seja porque a população antecipou a compra de duráveis aproveitando os benefícios fiscais e a farta disponibilidade de financiamento e agora modera seu apetite de novas compras, seja porque as instituições financeiras neste momento identificam riscos de inadimplência após forte expansão de seus financiamentos às famílias, de forma que também desejam “digerir” esse processo.

Por esses motivos, perde eficácia repetir o modelo de atuação da política econômica com base na maior disponibilidade do crédito e em incentivos fiscais ao consumo que tanto êxito teve anteriormente. Medidas nessas áreas ainda podem e devem ser tomadas, mas, como seu alcance é menor, devem ceder lugar na hierarquia de relevância às ações orientadas ao investimento.

Caminharia nesta direção o reforço substancial do gasto público em investimento e a concessão de incentivos de grande impacto e diretamente associados ao investimento privado, como a instituição da depreciação acelerada para as inversões realizadas, por exemplo, nos próximos 12 meses. No atual estágio da economia doméstica e da crise internacional deveriam ser avaliadas com atenção medidas para dar maior folga financeira e maior capacidade de financiamento dos investimentos às empresas (a exemplo da postergação de recolhimentos de impostos pelas empresas e uso do compulsório dos bancos para o financiamento de longo prazo às empresas) e para reforçar, através das inversões dos Estados, o investimento público da União (via suspensão / redução de pagamentos das dívidas dos estados com a União, em contrapartida a maiores investimentos).
 


 

 

 

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